*HELENA*
- Acorda filha, hora de levantar. A escola te espera. - Minha mãe entra no meu quarto já falando e puxa a coberta de cima de mim.
- Não mamãe, ainda deve faltar alguns minutos.
- Ao contrário, já está atrasada.Levantei e fui tomar um banho rápido. Eu já sabia me arrumar sozinha, mas ainda assim, minha mãe gostava de colocar a roupa em mim e pentear meus cabelos loiros.
- A senhora está feliz. - Digo, quando ela me virou de frente para ela, para ver como eu estava.
- É que a mamãe vai começar a trabalhar de novo.
- Que legal. - Não sabia se isso era realmente legal.
- Só que agora eu não vou poder mais te buscar na escola, só levar.
- Quem vai me buscar então? O Papai?
- Não, ele trabalha longe, você sabe, não daria tempo dele sair do escritório e te pegar no seu horário de saída.
- Então? - Pergunto confusa.
- O seu tio Fernando, ele vai pegar você e a Fernanda agora. Vai te deixar todos os dias aqui em casa.
- Mas e depois?
- Vão ser apenas algumas horinhas sozinha, e eu chego a tardezinha, antes das 16hs. Tudo bem? - Minha mãe abre um largo sorriso na intenção de me convencer.
- Tudo bem.Não gostei muito da ideia de ficar algumas horas sozinha, mas eu sempre concordava com tudo que a minha mãe dizia. Toda vez que ela falava: "tudo bem?" Eu me sentia pressionada a repetir a frase.
- Prontinha, está linda! Vamos? - Ela diz ao me analizar de cima a baixo.
- Que dia?
- Que dia o que?
- Você vai começar a trabalhar.
- Amanhã.
- Mas já?
- Sim. A mamãe já conversou na escola, para permitirem que você saia com o seu tio e já deixei a geladeira cheia de guloseimas que você ama. - Ela me faz cócegas na barriga e eu começo a rir.Minha mãe se levanta e eu vou atrás dela pela cozinha e espero meu café ficar pronto, para depois irmos para o colégio.
***
No dia seguinte, no horário da saída do colégio às 12:10hs, eu fui ficar com a Fernanda, para facilitar. Ela era mais velha do que eu, tinha 15 anos, então não batíamos muito papo. Eu tentava conversar, mas Fernanda sempre respondia só o básico, como se eu fosse infantil demais para ela manter qualquer assunto comigo.
Corro em direção ao meu tio, quando o vejo saindo do carro. Ele é irmão do meu pai e era muito legal comigo. Posso dizer que era um dos meus tios preferidos.
- Olha só que abraço gostoso. - Ele diz, me abraçando de volta. - Por que você não me recebe todos os dias assim também, Fernanda?
- Ela é criança, pai. - Todos nós rimos - E não te ver todos os dias.
- Mas agora vamos nos ver e ficar ainda mais próximos, né gatinha? - Ele me cutuca.
- Sim. - Respondo rindo.Entramos no carro, Fernanda colocou os fones de ouvido e ficou calada, olhando pela janela, enquanto eu estava sentada no banco de trás e conversando sem parar com o tio Fernando. A casa deles era mais próxima do colégio e por isso ele deixava a Fernanda primeiro e depois seguia para a minha casa.
O primeiro mês foi tudo normal, tirando a parte de ficar sozinha, mas eu estava sabendo me virar.
Só que em um dia qualquer, minha vida deu uma reviravolta que eu não esperava, que eu não estava preparada. Na verdade, não tinha como se preparar para uma coisa daquela.
VOCÊ ESTÁ LENDO
DEGUSTAÇÃO | Eu morri naquele dia
NonfiksiO mundo está tão cheio de maldades, que às vezes dá medo até pisar os pés na rua. Mas o que fazer quando a maldade está dentro da sua própria casa? Era pra ser um dia comum, como qualquer outro. Helena não imaginava que teria sua inocência brutalm...