Capitulo 1

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  • Dedicado a Anny Kadosh
                                    

"Porém uma coisa eu faço: esqueço aquilo que fica para trás e avanço para o que está na minha frente." Filipenses 3:13


15 de fevereiro de 2016


Morávamos no Conjunto Habitacional Vila Verde, nosso apartamento era pequeno, mas foi o suficiente durante esse tempo para mim, minha mãe e Gabrielle. No entanto estava chegando a hora de voltarmos para casa. Enquanto arrumava as malas pensei nos momentos complicados que passei aqui, levei uma vida completamente nova, desafios diários. Não consegui me adaptar como deveria. No Colégio fui péssima, acabei perdendo de ano. Sei que as responsabilidades aumentaram e preciso ter noção de que já não sou eu apenas. Tudo que faço atinge as pessoas ao meu redor. 

- Filha, vamos tomar café. Precisamos dormir cedo para viajar de manhã. 

Minha mãe falou da porta do meu quarto. Normalmente ela gritaria, mas com a Gabi dormindo não podíamos vacilar. 

- Claro, deixa eu só dobrar essas peças que lavei hoje.

 Quando minha mãe saiu eu desfiz o sorriso. Ela precisava voltar por causa do trabalho. Depois de muito conversar com a supervisão ela conseguiu ser transferida para outra cidade, só com o intuito de me acompanhar, e agora precisavam dela novamente. Dona Eva sempre foi uma médica muito dedicada, uma profissional exemplar. E só eu sei as barras que minha mãe precisou enfrentar para chegar onde chegou. A decisão de viajar tinha sido minha, mas recebi seu total apoio. E agora eu precisava voltar e encarar os fantasmas do passado.

*** 

De repente abri os olhos, e com a respiração ofegante percebi que era só um pesadelo. Fazia meses que não tinha noites tão agitadas, tentei esquecer a péssima experiencia. A cortina que balançava revelava raios do sol por uma maldita fresta esquecida da janela, e de uma forma nada poética ele me cegou um pouco. Não sabia se agradecia ou se reclamava. Pra melhorar, constatei que estava um pouco atrasada. Em alguns minutos precisava estar na escola. Não queria pensar muito em como seria o dia, só ir e pronto. O reflexo no espelho do banheiro era de uma Marina que usurpou meu lugar. A verdadeira Marina se perdeu na estrada, e eu fui ocupando seu lugar aos poucos. Minha mãe dizia que podia contar nos dedos - de uma só mão - quantos sorrisos eu dava em um dia.

 Notei como estava com a cara gorda, meu rosto ainda estava inchado pela noite de sono e meu cabelo parecia ter vida própria e apontava para todas as posições possíveis. Apesar do banho rápido, a água parecia levar todas as lembranças, escolhi uma roupa leve, uma básica calça jeans e uma bata com costas nadador. Me olhei no espelho mais uma vez, meu cabelo que um dia foi castanho claro, estava mais escuro quase preto. Presa no espelho havia uma foto de 2 anos atrás. Definitivamente eu havia ficado mais bonita, mais mulher. Meu corpo já se encaixava melhor nas minhas roupas. A unica coisa que sinto falta é a inocência e felicidade que aquele tempo me trazia, mas isso não quer dizer que gostaria de viver tudo outra vez, Deus que me livre disso. Balancei a cabeça tentando esquecer tudo aquilo. Hoje o dia seria maravilhoso, disse a mim mesma com uma falsa esperança. Passei um delineador preto como de costume e desci as escadas. Gabi já havia acordado e estava no colo da minha mãe, Eva. Larguei minha mochila e fui pega-la, enchendo-a de beijinhos, dei um beijo estalado em minha mãe, minha eterna amiga.

 - Bom dia, mãe. 

Eva respondeu me olhando pensativa. Já entendi o que rondava aquela cabecinha preocupada.
- Eu estou bem mãe. O dia não vai ser tão fácil, mas é só o primeiro do ano - Como se isso me desse uma boa perspectiva-. Tudo vai ficar bem, confia em mim.
Falei tentando acalma-la, enquanto sentava para tomar café com a Gabrielle no colo. O que era um desafio porque ela não ficava quieta.

***

Minha mãe havia me dado uma carona até a escola. Durante o caminho revivi boas e más lembranças. Antes de sair ela ainda questionou se eu não desejava mudar de ideia. 

- Filha, é isso mesmo que voce quer? Temos algumas economias, você pode se matricular em outra escola. Recomeçar do zero. Eu sei que deve estar sendo difícil pra você. As mesmas pessoas, tudo igual.

- Mãe, por favor. Eu sou diferente e isso basta. Preciso estudar e prefiro que seja aqui. Tenho saudades da minha turma, meus professores. Ja disse que vai ficar tudo bem. Agora vai pra casa e prepara um bom almoço pra gente.

 Sorri, dei um beijo nela e na minha princesa que estava no banco de trás, entretida com uma boneca de pano que passou de geração em geração . Esperei o carro sair e me virei pra ver a entrada do colégio com mais atenção. A placa continuava a mesma. Colégio Batista Renascimento. Aquele seria meu ultimo ano naquele lugar e o nome nunca me pareceu tão sugestivo quanto agora. Respirei fundo, estufando o peito. Coragem, Marina. Busquei ao menos um rosto conhecido, mas havia chegado cedo demais, preferia ver as pessoas chegarem do que me observarem chegando. Passei pela porta principal e tratei de ir logo identificar qual seria minha sala. Foi fácil, no mural principal havia a lista com os nomes e as respectivas salas. Me preparei para entrar e senti uma mão no meu ombro.

 - Mari? 

Me virei, mesmo não sendo necessário fazer isso para reconhecer, a voz era igual a uns meses atras, da ultima vez que nos falamos por telefone. Sorri ao ver a Camila. Estava com um corte de cabelo diferente, uma mecha rosa se destacando no cabelo preto, mas com o mesmo estilo divertido que ela sempre teve. Resumindo, minha melhor amiga. Não pensamos duas vezes e nos abraçamos. Como senti falta dela. Enfim eu comecei a me sentir em casa novamente.

- Nossa Mari, como você esta... morena! Percebi você chegando, mas não acreditei. Precisava conferir de perto. Senti tanto sua falta, sua estranha.
Doce como sempre
 - Também senti saudade de você.
 Assumi, me sentindo aliviada por Camila continuar a mesma. Um ano fora me pareceu uma eternidade. Fomos para a sala, que graças a Deus era a mesma. Ela tentou entender porque eu ainda estava estudando. Expliquei tudo que podia naquele momento, não me adaptei ao 3º ano do colégio novo e por isso acabei perdendo. Por sorte em algumas aulas eu teria sua companhia, ja que sua dificuldade em cálculos não havia mudado, o que acarretou dependência de matemática e física. Naquele dia não sei como, Mila falou sobre tudo que tinha acontecido nesse tempo que passei fora.

Você ainda vai me amar? [Em revisão]Onde histórias criam vida. Descubra agora