Capítulo 9

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Jonathan


  Eu sempre fui ignorante, isso é fato. Sempre olhei pro meu próprio umbigo. Mas estar ali, sentado, encarando um rosto, idêntico ao meu, todo queimado... era a coisa mais insuportável que eu fazia a anos.

  As feições antes bonitas, estavam destruídas. Eu tentava entender tudo e não enlouquecer com as coisas que já aconteceram e ainda iam acontecer. Em dado momento me peguei dormindo, mas meu sono era perturbado.

  Porém, eu decidia sempre por continuar de olhos fechados. Porque olhar aquele rosto, antes fino e cheio de boa genética, todo queimado e cheio de marcas que ficariam para sempre... não era meu melhor hobbie.

  Pensei estar sonhando ao ouvir uma voz rouca e carregada, mas eu não estava. Permaneci quieto, sem mover um único músculo, mantendo minha respiração e concentrando todos os meus 4 sentidos restantes.

  Passos ecoaram pelo corredor e logo a cortina que separava a maca de Piper das outras, foi arrastada pro lado. Um vento frio entrou junto da pessoa e eu permaneci quieto, tentando sentir toda a presença do homem, que eu identificara como homem por causa da voz.

  Pensei que era só uma inspeção para ver se estava tudo bem, mas era mero engano meu. Ele fechou novamente a cortina, e ouvi o barulho da maca rangendo. O que significava que a pessoa acabava de se sentar.

  Um cântico começou a sair da boca de quem quer que fosse. Uma música suave com a melodia intensa, saía da garganta dele, eu quis abrir os olhos. Eu quis olhar para ele, ver o que estava fazendo, se estava de olhos fechados, em qual posição se encontrava e se não aconteceria nada de mal à Piper. Mas simplesmente não conseguia, era como se meus olhos agora estivessem forçados a permanecerem fechados, como que por precaução.

E de repente eu já não estava mais realmente consciente. Meus sentidos diminuíam e o sono vinha. Lutei contra ele e o que ganhei foi um rugido dentro da minha cabeça.

A escuridão veio mais rápido do que eu desejava e logo eu não lembrava nem meu nome.

**

Piper


Eu não sabia onde eu estava, ou porque estava. Lembro-me de apagar e depois, mais nada. Algo me mantinha desacordada, e eu conseguia sentir e ouvir.

Ouvi a voz de Jonathan falando comigo, pedindo que eu acordasse. E eu queria, queria muito, mover minha mão, abrir meus olhos e consola-lo. Mas eu não era dona de meus movimentos, nem de meus sentidos.

Em dado momento, quando senti alguém se sentando onde eu estava deitada, pensei que fosse Jonathan. Mas a presença era diferente, algo que eu já havia sentido mas não sabia identificar. Minha audição foi roubada e eu já não ouvia nada.

Minha pele começou a se dilacerar. Era como se alguém arrancasse a carne de meu rosto com as unhas. Eu quis gritar, mas nada saia de minha garganta.

O interior vazio da minha mente começou a mudar. Imagens aleatórias passavam pelos meus olhos. Um sorriso estonteante, um som de gargalhada, gemidos de prazer... de repente tudo mudou para imagens de guerra, sangue, sofrimento, dor.

  Eu via corpos mutilados caindo, fumaça por todo lado, gritos de socorro, o olhar de desespero nos olhos das pessoas desconhecidas que passavam em volta.

  O cenário mudou e eu vi mulheres chorando abraçadas aos caixões, gritando de luto, com expressões raivosas no rosto.

  Consegui vislumbrar olhos claros dentre tudo isso, uma mão tocando o ombro de uma pessoa e ela surpreendendo o dono desta mão.

  Quis gritar quando senti uma pontada na barriga. Eu estava sendo esfaqueada. Eu sentia. Depois minha cabeça latejou com força e quase explodiu meus neurônios. Imagens de alguém jogando uma pessoa no chão me invadiram.

  Então tudo ficou preto. Preto, sem vida, sem sons , sem nada que indicasse tudo que eu havia acabado de ver. Um peso se acumulou dentro de mim, e eu soube que todo aquele pesar, aquela dor, aquele luto, aquela malícia, a falta de confiança nas pessoas, a dor de ser traído, havia sido transferido para mim. Eu soube que quando eu acordasse e abrisse meus olhos, olharia tudo diferente.

  Comecei a me sentir sufocada como se ar me fosse tirado. E então eu perdi todos os meus sentidos de vez.

**

Jonathan

Eu sabia que tinha sido dopado por meio do que quer que fosse os poderes daqueles loucos. Eu lutei contra todo o sono. Eu precisava salvar minha outra metade, os meus olhos, um pedaço da minha alma.

  Eu lutei e lutei. Doía mas o sofrimento valia a pena. E quando finalmente consegui abrir os olhos e me levantar eu rosnei.

  Um rosnado alto, feroz, que saiu do fundo do meu âmago. Um rosnado de proteção, de raiva e de humilhação.

  Nesse momento Héctor que estava a minha frente fez um movimento alto com a mão e o peito de Piper subiu com força. Sua garganta ficou apertada e a boca aberta.

-Se você se mover um passo, eu tiro todo o oxigênio dela.

  O aviso foi claro, mas algo mais forte. Primitivo e parte do que eu era agora, se moveu e eu avancei.

  No momento em que eu avancei, Piper  voltou à posição normal e Héctor sorriu. Eu o olhei desesperado.

-Eu avisei.

  Minha raiva borbulhou, eu vi vermelho e tudo que eu queria era a cabeça dele rolando ensanguentada no chão. Não podia ser verdade, ele não faria isso.

  Dessa vez avancei para matar, mas ele sumiu. Como ar ele simplesmente
desapareceu. Me deixando com a Piper de mal jeito e o rosto...

  O rosto não estava queimado! Não mais.

  O que Héctor havia feito?

  Cheguei perto dela e acariciei seus cabelos. Mas o desespero me invadiu quando chequei seus batimentos e não senti nada.

  Nenhuma movimentação, nenhuma palpitação. Nenhuma vida.

  O pânico me invadiu. Não não não. Impossível, não fariam isso! Todos viram que ela é diferente, que seria a mais especial daqui. Todos viram sua beleza, todos... eram traiçoeiros.

  E quando me levantei de onde eu havia sentado e empurrei a cortina pro lado marchando a procura de Frederico, meus pensamentos eram anuviados.

Haviam machucado Piper, e agora eu machucaria todos eles.


**

Sei que o capítulo está deveras curto, mas não pude resistir a deixar vocês um pouco curiosos.

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⏰ Última atualização: Oct 21, 2018 ⏰

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