Cinco e quinze da manhã de uma quarta-feira qualquer.
Bem, talvez não tão qualquer para Eriberto. Ele acordou mais cedo do que de costume após sentir o travesseiro ensopado de suor. Seus cabelos estavam molhados ao despertar. Ele presenciara mais um episódio de terror noturno. Os pesadelos com a morte e o diário de sua amada Rosângela eram bem mais numerosos do que os sonhos que lhe traziam boas lembranças daquele passado. Por vezes, as lembranças eram mescladas por nuvens de algodão-doce e expectativas da vida que poderia ter tido ao lado da médica e de sua enteada Joana.
Mas não na noite anterior. De doce, seus sonhos nada tiveram.
Na madrugada daquela quarta-feira não qualquer, Eriberto vivenciou em duas horas a lembrança do exato dia em que deixou Rosângela e Joana. Ele mencionou palavras das quais se arrependeu depois. Chamou Rosângela de louca. Até mesmo de paranóica. Tudo porque ela insistia que uma organização secreta de sigla ASMEC estava atrás dela e de sua filha.
Eriberto até tentou acreditar na história de sua amada. Mas o tom de fábula aliado à falta de informações sobre a ASMEC até mesmo na base de dados do exército o deixou desconfiado sobre o estado mental de quem carinhosamente chamava de Rô.
Ao bater a porta para deixar a vida das duas de uma vez por todas, Eriberto mal sabia que de paranóica Rosângela não tinha nada. Em alguns meses porém, ele receberia a notícia da morte da médica após um terrível acidente de carro. Exatas quarenta e oito horas adentro de seu luto culposo, ele receberia um diário em sua porta. Um diário de capa vermelha com toda a história jamais revelada sobre o passado de Rosângela.
— Posso me juntar à você?
A pergunta rouca de Jasmine pairou no ar sem resposta por pelo menos um minuto naquela fria manhã. Eriberto tinha seus olhos perdidos no horizonte, ainda consumido pelas lembranças de seu terrível pesadelo. Ele não a viu se aproximar de forma sorrateira. Mas também não se importava com a presença dela naquele momento. Pelo contrário. Talvez a sua presença acalentasse as mágoas que nutria em seus pensamentos.
Todos os demais soldados dormiam no acampamento. Em algumas horas, eles estariam de pé para o início do plano mais ambicioso encabeçado por Eriberto para combater o apocalipse.
— Já se passou uma semana — ela disse. — Oito dias para ser mais precisa. — Pigarreou em seguida. — Eles não são mais crianças, você sabe disso, não sabe?
Os olhos de Eriberto deixaram o horizonte e pousaram sobre o rosto de Jasmine. Seu penteado estava impecável, mas a marca do travesseiro na bochecha, esta ela não conseguiu esconder.
— Você me pegou agora — Eriberto respondeu.
Ele jamais revelaria a ela a verdade que o afligia. Preferia deixá-la pensar que estava preocupado com a fuga de Cris e Leafarneo há exatos oito dias. Fuga esta da qual ele sabia de tudo desde a concepção do mirabolante plano de troca de informações privilegiadas pela vida de Charles.
— Não deixe todo esse sentimento pesado te consumir, Eriberto. Eu posso não ser a melhor conselheira deste mundo, mas alguns anos vividos me ensinaram que a preocupação não nos traz nada de bom. Só mais preocupações. E adianta alguns anos nessas queridas aqui. — Jasmine apontou para as rugas perto de seus olhos.
Eriberto sorriu enquanto Jasmine tomou um gole de café. Por sorte, a cerâmica da xícara esquentava as suas mãos descobertas. O frio parecia atingir o seu recorde nas proximidades de Brasília.
— O seu plano é mais do que qualquer avanço que nós tivemos durante todo esse mês após a eclosão do apocalipse. Tudo vai dar certo, não se preocupe — completou Jasmine.
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LIVRO III - A Ordem do Caos
HororEste é o terceiro e último livro da trilogia que já conta com O Início do Fim e O Soneto do Apocalipse. Espero que se divirtam e se emocionem com o final desta incrível jornada pelo apocalipse que se iniciou na cidade de Palmas. Não se esqueçam...