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Tu choravas.

Eu chorava.

Os sons de Urano eram abafados por soluços e respirações descontroladas.

Beijavas cada pequeno sinal no meu rosto, tocando as cicatrizes e pintas com os lábios, dizendo-me que me amavas tanto.

Doía.

Doía ver te quebrado por minha culpa.

Doía sentir-me quebrado por tua culpa.

Queria te afastar, exigir espaço para respirar, mas meus dedos teimosamente te puxavam para mais perto.

As verdades pairavam pelo ar e cada palavra dita abria feridas.

Eu te amava, amava tanto a te colocar acima de qualquer outro desejo meu. Amava-te de modo a me perder por entre os fios macios dos teus cabelos. Amava-te de forma a perder minha identidade, a diminuir minha própria galáxia.

Tu me amavas, me amavas ao ponto de não se achar merecedor de me ter.

Nos amávamos em demasia, nos machucávamos na mesma medida.

Na órbita torta de Urano, estavámos na parte mais escura.

Nas estações de Urano, estávamos em um inverno que poderia durar anos.

Quando podíamos enfim ser livres, com tu indo morar longe da família problemática e eu construindo minha vida, agora percebíamos as grandes rachaduras na nossa construção. Contudo passamos tanto tempo ignorando-as, que não havia mais possibilidade de tentar remendá-las

Não era saudável.

Minha insegurança exacerbada, acreditando que qualquer um seria melhor para ti do que eu. Tua incerteza, constantemente indagando-te se me fazias bem de verdade.

Pois, uma hora, todas as questões vieram à tona e não sabíamos lidar com tudo aquilo.

Amor de mais era veneno e falta de amor próprio era letal.

E tinha também ele, o outro, teu novo amigo que vivia a te cercar. Fazendo eu me sentir pequeno. Então as brigas aumentaram, a tristeza tomou lugar e preparou tão amargo chá.

Ele te olhava com desejo, mas tu eras tão inocente na época.

E quando eu o vi te roubar um beijo, desmontei-me em pequenas partículas. E pela primeira vez eu não quis ter certeza de algo.

Éramos confiança quebrada.

Tu a pedir desculpas, mesmo não sendo inteiramente tua falta. Eu estava lá, vi quando tu o empurraste e teus olhos buscaram por mim, desesperado.

Nossas lágrimas se misturavam agora, nossos pedaços a se embaralhar um no outro.

Pensamentos na velocidade da luz.

Éramos amor mas jamais os mesmos.

Te ver, por um breve instante com outro, me fez ter a certeza de que eu nada era, que não seria tão belo quanto ele ou agradável, que nunca seria o suficiente pra ti.

Eu era apaixonado por ti e tu por mim, mas paixão não é tudo. Nunca fora. Naquela época éramos imaturos demais, jovens demais. Cometendo erros.

E o negrume de Urano não nos deixou desde então.

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escapismOnde histórias criam vida. Descubra agora