Cairon,
Era a terceira vez que eu caia em meio a mata. Mas precisava continuar. Voltei a ficar de pé e encostei-me em uma arvore.
Uma luz ao longe só comprovava minhas suspeitas. Estavam atrás de mim. Tentei caminhar um pouco mais, mas sem chances. Só agora me dava conta de que ao menos duas de minhas costelas haviam sido quebradas, devido a luta que travei com um dos criminosos, e isso agora me impedia de respirar.
Com muita dificuldade cheguei até a beira da rodovia, mas da forma a qual eu estava, ninguém me levaria de volta a cidade, olhei a altura que me separava do asfalto, e quando olhei para trás, a luz parecia bem mais perto. Em um ato de desespero deixei que meu corpo rolasse pela na descida, que levava ao asfalto, com muita sorte, quem estivesse vindo atrás de mim não seria tão louco.
Eu senti que entre um tronco e o outros contra os quais meu corpo colidia, um galho havia me ferido. Mas o que importava, se eu fosse apanhado com certeza também sairia ferido, se não morto.
Ou eu estava morto ou meu plano havia dado certo. Nesse momento sentia um cheiro delicioso de café e biscoito frito. O rosto de minha mãe veio imediatamente em minha memória, e uma lágrima rolou em meu rosto. Abri os olhos e me vi em um lugar totalmente desconhecido, assim como foi quando me levaram.
- "Vovô, o moço acordou!" – A criança não devia ter mais de uns cinco anos. Tentei me levantar e recebia ajuda.
- Acho melhor o senhor não se levantar. Ainda está muito fraco, teve uma infecção, e a gente não tinha condições de leva-lo até um médico, o senhor me desculpe a falta de acomodação. – Olhei em volta e vi um colchão estendido ao chão. Como não via outro cômodo no lugar, deduzi que o pobre velho havia me dado sua cama, ou a cama da criança. Ou estaria ali como vigia dos bandidos?
- Tudo bem! – Gemi. Como ainda tremia, me agarrei ao cobertor que estava na cama.
- Vê. Ainda tem febre. Está assim há três dias, pensei que fosse morrer.
- Tres dias?
- Sim. Eu o encontrei caído à beira da estrada. Vinha com minha carroça de reciclados, e achei melhor não deixa-lo por lá quando vi que ainda respirava.
Eu tentava me lembrar de detalhes, de como fui parar ali. Me lembrar de como eu havia me soltado das cordas e da cadeira onde haviam me prendido.
- Patricia.
- Havia um moça com o senhor? Não vi mais ninguém. Se quiser posso dar uma ida até a mata e ver se encontro alguém, mas depois de três dias...
Ela não estava comigo.
- Não será necessário. O Senhor tem um telefone? – Como suspeitei, o velho não tinha.
Eu precisava de informações e pelo visto nem tv a casa tinha.
- Estamos longe da cidade?
- Depende de qual ponto da cidade o senhor se refere.
Tentei ficar de pé, mas era quase impossível. Estava fraco demais. E com muita fome. Sem nenhum constrangimento, aceitei o café e o biscoito frito que o senhor me oferecia, e me lembrei de meu pai. Devia estar louco. E a Li? Desesperada.
Meus bolsos estavam vazios. Não havia telefone, nem dinheiro, nem mesmo documentos. Se esse lugar fosse isolado e próximo ao lugar onde estava, eles poderiam me encontrar novamente, e acabar com o que começaram.
Sai de meus desvaneios, quando percebi que nem o senhor, nem a criança comiam o biscoito.
- Não vão comer?