O Segredo do Bosque

Capítulo XI

Me vi na entrada da caverna, porém, a dez anos atrás. Eu sabia disso, pois a entrada continuava intacta, e a clareira totalmente limpa.

Percebi que não estava no controle da situação, estava como um expectador, do mesmo modo de quando pude ver a morte de Noemi há dez anos.

Entrei na caverna, a passos lentos, para que ninguém notasse a minha presença. Podia ouvir pessoas falando, e risadas nada amigáveis.

Eu conseguia definir de quem era algumas das vozes: a do Demônio, e de Hannah.

Quando estava quase dentro da caverna, consegui ver alguém contra a parede, uma figura conhecida.

Apertei minha visão a fim de poder ver quem era.

ERA EU!

No primeiro momento não entendi a situação, mas logo consegui interpretar a cena.

Eu estava vendo na perspectiva do padre Miguel, de como ele entrou na caverna e me salvou na noite em que Hannah e o Demônio.

Agora eu podia ouvir as palavras que padre Miguel dizia enquanto eu estava atordoado, com muita clareza.

Eram palavras em latim que, assim que o padre começou a declamar, lembrei das palavras escritas no fim do livro de capa preta.

Com um pouco de dificuldade, fui repetindo em minha mente as palavras que ele ia dizendo. Percebi que quando ele terminava de declamar, começava tudo novamente, cada vez mais forte.

E assim que o Demônio foi para o canto da caverna junto de Hannah e desapareceram, foi quando ficou tudo branco e voltei a realidade.

Cara a cara com Lúcifer.

Pelo visto essa minha visão, embora tenha sido demorada, na realidade não tinha passado tempo algum.

Lúcifer e o Demônio continuavam no mesmo lugar.

Assim que me "recuperei" daquela visão, comecei a declamar aquelas palavras em latim, no início bem baixinho, mas logo depois levantei a voz e continuei com a mesma precisão em cada palavra.

Em Lúcifer aquelas palavras não surtiam efeito, mas o Demônio, que estava logo atrás dele, começou a se contorcer, caindo de joelhos no chão.

Hannah, quando percebeu que o Demônio estava indefeso, o empurrou contra a parede, onde logo depois se dissolveu numa nuvem negra e sumiu daquela sala.

Ela tentou correr em minha direção, mas logo foi impedida por Lúcifer, que acertou um soco, jogando-a do outro lado da sala.

Hannah caiu já sem consciência.

Lúcifer veio bufando em minha direção, com uma cara nada amigável. Eu, ainda com as mãos algemadas atrás das costas, fui me levantando com dificuldade, mas ainda sem parar de declamar aquelas palavras em latim.

Eu podia ouvir os gritos dos outros demônios que também estavam naquela casa.

E tudo isso parecia irritar ainda mais Lúcifer, que neste momento já estava com seu rosto bem próximo ao meu, fazendo com que eu sentisse sua respiração pesada e quente.

Apertou, com uma de suas mãos, o meu rosto, e falou em um tom bem ameaçador:

- Criança insolente! Como ousas atrapalhar meus planos! Posso não te matar, mas vai demorar muito mais que dez anos para você conseguir se recompor!

E com isso me acertou um soco no estômago. Por um instante achei que tinha perfurado minha barriga, o que não aconteceu, mas se ele continuasse daquela forma, ele acabaria desencadeando uma grande hemorragia interna, e quebraria todos os meus ossos.

Lúcifer me pegou pelo pescoço, e me jogou contra a parede, do lado contrário da sala. Caí com o rosto no chão, e imediatamente pude sentir o gosto de sangue em minha boca.

Ele correu em minha direção, e me acertou um chute nas costelas, me fazendo levantar pelo menos trinta centímetros do chão, e caindo no chão deitado sem forças. Ele se abaixou do meu lado, me pegou pelos cabelos, e levantou meu rosto do chão e, praticamente, berrou ao meu ouvido:

- E agora criança? Acabou toda aquela sua coragem? Por que não levantas e acaba comigo?

Ele deu uma risada, daquelas bem exageradas, me apanhou pelo braço, e me colocou de pé, escorado pela parede, mas eu quase não tinha forças para me manter naquela posição.

Lúcifer, começou a prensar, com a sua mão, minha cabeça contra a parede, sentia como se o meu crânio logo iria quebrar, tive a impressão de ouvir pequenos estalos, como ossos trincando.

Mas naquela hora, alguma coisa aconteceu.

Senti como se a parede que eu estava apoiado começara a levemente tremer, e em seguida o chão da sala também.

O tremor, que antes era leve, começou a piorar, parecia um verdadeiro terremoto, mas onde estávamos, não havia encontro de placas tectônicas, então aquilo não poderia ser normal.

Lúcifer também não esperava aquilo, pois seu rosto, que antes era de puro ódio, agora tinha sido substituído por uma expressão de espanto.

As tábuas que antes prendiam as janelas caíram por terra, e as vidraças se transformaram em farelos.

O chão e as paredes daquela sala começaram a rachar, a casa iria desabar.

A parede do lado de Hannah se desfez, e uma grande fumaça se levantou, e daquela fumaça irradiava uma forte luz branca.

Forcei minha visão, para ver se havia alguma criatura por trás de tudo aquilo, mas o que consegui ver foi o que parecia ser uma silhueta.

Sim!

Era a silhueta de um homem!

Mas a questão agora seria: um Herói? Ou apenas mais um Vilão?