Capitulo 3 - O mundo é cinza

1 0 0
                                    


Ainda incrédulo, Roberto tentou se aproximar da figura peculiar, que estava a mais ou menos 5 metros de distância, este momento pareceu ser tirado de um filme de comédia, onde senhoras, crianças e casais atravessavam o seu caminho, entre empurrões e tropeços, quando se deu conta, já havia passado do ponto em que afigura se encontrava e ele já não avistava mais o velho amigo. Ele ainda tentou vasculhar com os olhos, a multidão que agora se acalmara, já que estava perto da hora de todos os trabalhadores, voltarem aos seus postos de trabalho. Ele sentiu um misto de medo, angústia e curiosidade mórbida, para descobrir o que ele realmente tinha visto. De volta ao escritório, o tempo passava com grilhões que pesavam toneladas, e faziam com que os ponteiros se arrastassem. Perto da hora de sair, uma tempestade de verão se anunciava no horizonte, mesclando tons de cinza e verde, ele lembrou que não havia pego nem um guarda-chuva e nem uma capa. Correu para o ponto de ônibus, já com pingos grossos que encharcavam sua roupa, de seu escritório até o ponto eram três quadras, ao chegar no ponto reparou na imensa fila e no automóvel amarelo que estava completamente lotado. Neste momento ele amaldiçoou o fato de não ter vindo de carro. Respirou fundo e foi para o final da fila, que pouco a pouco, se tornava um caos, com pessoas que chegavam, empurrando as pessoas que já lá se encontravam, na simples ansia de querer entrar. Quando o terceiro ônibus chegou, finalmente conseguiu entrar, sendo empurrado pela massa, apesar de sua estrutura física, nada podia fazer com os braços abaixados, sem conseguir se segurar nos ferros ele foi no embalo da multidão, sentindo corpo por corpo e a mistura de fragrâncias de estofado molhado, suor e sovacos fedidos quase o fez vomitar e desmaiar diversas vezes. Quando finalmente chegou em sua parada, se deparou com a sua rua completamente alagada, com uma água suja que batia na altura da virilha. Por um momento, ele podia ter certeza que viu um rato nadando de costas, o que fez com que ele sorrisse levemente. Na porta do seu apartamento, foi obrigado a se despir por completo, visto que suas roupas estavam prontas a irem pro lixo, segundo ele, devido a mistura de lama e água suja. Depois de um banho quente, ele ligou o rádio e  jazeu exausto no sofá, apenas de cueca boxer preta. De repente, seu corpo começou a formigar, partindo das pontas de seus dedos, subindo por suas pernas e braços, sentiu o formigamento tomar conta de seus lábios, enquanto a luz do teto começou a piscar cada vez mais fraca, o rádio mudara a sintonia para uma música de Edith Piaff, sua cabeça pesou, fazendo com que ela tombasse para o lado direito, onde se encontrava a parte vertical do sofá, com o torso nu direcionado para cima, ele se encontrava com os braços duros, ao longo do corpo e as palmas das mãos direcionadas as pernas, que por sua vez, estavam coladas. 
De repente a escuridão, de repente o silêncio e um túnel obscuro com diversas camadas, se abre no sofá na altura e largura se sua cabeça, mas para Roberto, era como se ele estive usando um óculos de realidade virtual e que este túnel, tivesse uns três metros de diâmetro. Uma voz reverbera da penumbra, aos poucos toma forma, uma mulher de pele extremamente pálido e lábios carnudos, cabelos preto e cacheados, usando um vestido vermelho de renda, que deixava a mostra, as curvas voluptuosas de seu corpo. Ela vinha em direção a ele de braços estendidos, como se ela quisesse alcança-lo com as pontas dos dedos. Com a voz reverberante ela dizia:
- Vem, eu te quero, vem pra mim, vem pra cá, vem aqui pro escuro.
Um gelado percorreu a espinha de Roberto que não conseguia se mexer, por mais que ele tentasse se debater, via que a mulher se aproximava flutuando, cada vez mais perto, ele tentava gritar, mas sua voz não saia, como se os seus lábios estivessem colados, com olhos já marejados de desespero, e olha pra cima na esperança de encontrar um céu, naquela imensidão obscura sem um resquício de luz, ele, que nunca fora religioso, naquele momento gritou mentalmente com toda a sua força:
-Deus me ajuda!
A mulher misteriosa estacou cara a cara com ele, e com um sorriso maléfico disse olhando diretamente em seus olhos:
-Tu me paga, eu ainda vou te pegar!
E ela foi retornando de costas olhando pra ele, gritando injúrias e mexendo os braços e os dedos como se estivesse soltando um sortilégio de magia negra, mas nada saía de suas mãos.
Uma pequena luz que aparecera repentinamente a cima de sua cabeça, rapidamente clareou todo aquele espaço obscuro e o trouxe de volta a dita realidade, mecanicamente girou sua cabeça em direção ao teto, percebeu que a luz não piscava mais e o rádio estava na estação onde deixara originalmente. Sentiu que seu corpo já não formigava mais e se levantou lentamente para ficar sentado, atônito e com os olhos ainda cheios de lágrimas olhou para o celular com uma mensagem de sua cônjuge:
- Vim pro bar com os amigos do trabalho e ficamos ilhados aqui, mas ja estou indo pra casa. Beijos.
O relógio marcava três da manhã...

Entre a luz e a sombra - part.1Onde histórias criam vida. Descubra agora