Três.

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"Mas olhe que só vamos poder estar juntos oito meses, depois acabou-se, não terei mais tempo"

"O ano da morte de Ricardo Reis", José Saramago


Com uma mão sobre o final das costas de Valentina e a outra com o livro na mão, Francisco à medida que lia o terceiro capítulo da obra de Saramago guia a morena pelas ruas que eram enumeradas no livro. Os dois estavam à aproximadamente meia hora a ler e a caminhar por Lisboa fazendo o exato caminho que Ricardo Reis, segundo o escritor, tivera feito na tarde e noite de dia 31 de dezembro de 1935.

A última paragem é na Rua do Alecrim, mais propriamente em frente ao antigo Hotel Bragança que agora renascia com o nome de Lx Boutique Hotel. Os dois sentaram-se na escadaria de entrada e Francisco enquanto brincava com os dedos da morena com a mão direita acabava de ler o terceiro capítulo.

- "Mas olhe que só vamos poder estar juntos oito meses, depois acabou-se, não terei mais tempo, Vistos do primeiro dia, oito meses são uma vida, Quando puder, aparecerei, Não quer marcar um dia, hora, local, Tudo menos isso, Então até breve, Fernando, gostei de o ver, E eu a si, Ricardo, Não sei se posso desejar-lhe um feliz ano novo, Deseje, deseje não me fará mal nenhum, tudo são palavras, como sabe, Feliz ano novo, Fernando, Feliz ano novo, Ricardo.". – O moreno acaba de ler e pousa o livro nas pernas da morena que sorria.

- Francisco, obrigada. Obrigada por estares-me a ajudar com isto. – A morena sorri, mais uma vez, para o rapaz ao seu lado.

Um silêncio acomoda-se durante alguns segundos entre os dois que mantinham o olhar perdido pela agitação das ruas da capital, mas não era um silêncio constrangedor era um silêncio aconchegante, um silêncio bom. Esse silêncio prolongou-se por uns breves minutos até Francisco virar bruscamente o rosto em direção à jovem e agarrar as suas duas mãos.

- Dás-me o prazer de juntamente com Ricardo Reis e Fernando Pessoa aproveitarmos estes oito meses restantes? - Francisco pergunta sem tirar os olhos de Valentina que após ouvir as palavras do rapaz sorri intensamente.

- Estás a dizer indiretamente que vais ser o Ricardo Reis para o meu Fernando Pessoa, Francisco Geraldes?

- Se assim o desejares. Ou melhor até aos dezanove capítulos e os oito meses nos separarem? – o sportinguista brinca.

- Até aos oito meses nos separarem, Ricardo Reis? – a jovem morena questiona com o mindinho esticado para Francisco.

- Até aos oito meses nos separarem, Fernando Pessoa. – Francisco entrelaça o seu mindinho no da morena e os dois caiem na gargalhada em conjunto

- Quem nos oiça vai pensar que somos malucos.

- Acho que isso não é inteiramente mentira. – O jogador mantém o olhar no dela que o encara com um sorriso.

Tornava-se bastante óbvio para quem passasse pelos dois que estes não eram indiferentes um ao outro, principalmente da parte de Francisco que de um rapaz tímido tinha passado para um rapaz que se oferecera para passar as tardes seguintes a explicar Saramago a uma desconhecida. Mas algo o cativou na rapariga, ele ainda não descobrira o que tinha sido, mas sabia que tinha acontecido e num espaço de tempo tão curto.

Já Saramago dizia que: "Aprendi que o sentimento do amor não é mais nem menos forte conforme as idades, o amor é uma possibilidade de uma vida inteira, e se acontece, há que recebê-lo.".

Saramago || Francisco GeraldesOnde histórias criam vida. Descubra agora