15° capítulo-Parte 1

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Por Lana

     De repente, minha mente volta num dos dias mais conflituosos da minha vida.

-Pai, mãe, preciso contar uma coisa para vocês. -Chego na sala e sento em uma cadeira mais afastada. Eles me olham com medo do que iria falar e eu os olho com certa compaixão, esperando que entendam.

-Esses dias eu me descobri... Conheci um pouco mais de mim mesma e descobri que gosto de mulheres. -Falo baixo, ainda olhando para eles.

-Você é lésbica?! -Meu pai exclama aborrecido e minha mãe faz carinho em suas costas, numa espécie de gesto para consola-lo.

-Lana, você tem certeza... -Mamãe começa e eu completo:

-Mãe, se eu vim conversar com vocês sobre isso, é porque eu tenho certeza. Você sabe muito bem que, qualquer coisa nova eu conto. -Ela respira fundo e concorda com a cabeça, sem saber o que falar.

-Tinha alguém assim na sua família, Paula? -Pergunta meu pai com um tom que me faz estremecer.

-Não, não é de família isso, como o DNA. Eu sou assim. É a minha opção sexual. Há algum problema nisso? Estou fazendo algo errado? -Pergunto num tom extremamente preocupado e triste.

-Não, filha, mas... Sabe que não tem como ter filho né? -Papai fala irritado. Ele ficou irritado, aborrecido. O pior foi minha mãe. Vejo nos olhos dela decepção e ela não precisa falar nada para eu saber a opinião dela sobre o assunto.

-Vocês me disseram tanto para ser eu mesma e quando eu mostro o meu eu verdadeiro, essa é a reação.-Falo aborrecida e eles me olham incrédulos, provavelmente pensando no que tinham errado. Bufo e subo para o meu quarto, fechando a porta. Mesmo assim, ouço eles falando lá embaixo:

-Como vai ser que as pessoas vão falar? "A filha sapatão do Roberto e da Paula... "

-Roberto, ela falou certo. Nós sempre falamos para ela não ligar para o que as pessoas falam dela, que ela precisava ser sincera e a gente tem essa reação? Precisamos nos desculpar!-Exclama minha mãe.

-Se você quiser se desculpar, tudo bem, eu não vou.-Meu pai fala seco e eu fecho meus olhos,já cansada de ouvir aquilo, deitando de lado na cama.

    -Filha, acorda-Ouvi minha mãe falar baixo, mesmo assim, consegui acordar e abrir os olhos devagar.

-Que foi? -Pergunto no mesmo tom dela.

-Quero... Conversar com você. -Parece arrependida com algo. Provavelmente com a nossa briga.

-Pode conversar. -Falei me levantando devagar e sentando na cama. Ela respira fundo e me aproxima dela.

-Eu vim te pedir desculpas. Pelo o que acabou de acontecer. Você falou certo.

-Sobre o quê? -Pergunto começando a sorrir.

-Sobre... O seu eu verdadeiro e sobre você... Ser lésbica. -Pronuncia as palavras devagar, como se ainda estivesse aprendendo as palavras, como quando a gente começa a falar. -Estava certa sobre isso. Você não está cometendo nenhum crime, para mim o importante é ser feliz com a pessoa certa. -Ela sorri para mim, mas reparo que usou "pessoa" ,não homem. O que ela sempre usava. Mesmo assim, já é alguma coisa. Tenho certeza que muitos pais não aceitariam a filha de jeito nenhum e até iria expulsar de casa. Sorrio de volta e, antes de dar um abraço, sinto que o que mamãe falou foi sincero.

Dava para sentir em tudo ali: em seus olhos, presos aos meus, o tempo inteiro pedindo desculpas pelo o que fez e pelo clima que ficou. Mesmo assim, tinha um porquê para aquilo que estava fazendo e eu não imaginava qual.

-Mas por quê? Por quê resolveu pedir desculpas para mim? -Questiono com os olhos semi cerrados. Ela respira fundo e começa a falar devagar:

-Eu... Li um livro que um... Homossexual se suicidou pelos pais não aceitarem ele. Oito lugares que me lembra a você. -Acrescenta quando vejo que não acreditei muito.

Ligo os pontos na minha cabeça e pergunto nervosa, com a voz falhada:
-E... Você não quer que isso aconteça comigo?

-Sim. -A simples palavra na boca dela se tornou tenebrosa.

-Mãe, isso nunca me passou pela cabeça, já que você deve estar com curiosidade. -Falo sorrindo fraco e ela sorri, aliviada. -Mas e se você não tivesse lido esse livro? Você pediria desculpa? Seja sincera-Falo com receio do que ela iria falar.

-Lana-Mamãe pega minhas mãos-Claro que sim. Talvez não no mesmo dia... Mas pode ter certeza que um outro dia sim. Poderia demorar, mas te aceitaria assim. Afinal, você continua sendo minha filha. -Ela sorri e me puxa para um abraço.

-Obrigada. Eu... Não sei o que falar. -Falo com a boca quase fechada, emocionada. Nos separamos do abraço e ela fica fazendo carinho em mim, até eu adormecer novamente.

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