Sentia o corpo levemente gelado, apesar de sentir o peso das cobertas sobre si. Sabia que tinha que acordar, levantar, sair da inércia, mas não desejava realmente. Havia tido um longo sonho, um sonho doce e molhado, chovia bastante e seu corpo ficou um pouco frio, mas algo a aquecia e era reconfortante, por isso não queria acordar. Forçou as pálpebras com lentidão, tudo escuro. Lembrou-se que cerrara as cortinas ao deitar. O silêncio era absoluto e isso só poderia indicar duas coisas, ou era muito cedo e suas colegas ainda dormiam, ou era muito tarde e ela ficara esquecida no dormitório. Pediu mentalmente que fosse a primeira opção, mas desconfiava no seu íntimo que não era.
Quis chorar quando constatou que estava muito atrasada, pior, sentia uma fome absurda, como se não comesse há dias, mas tentaria esquecer seu estômago e focar na velocidade e força de suas pernas. Vestiu-se sem esmero algum, embolou o cabelo rebelde num coque torto, foi ao banheiro e saiu em disparada descendo loucamente escadas e mais escadas abaixo. Nunca, em 6 anos de Hogwarts, atrasara para uma aula, aquilo era um absurdo.
Deu leves batidas na porta, esbaforida e um pouco vermelha, pronta para ser humilhada por Severo Snape.
- Ora senhorita Granger, pensei que tivesse nos deixado para trás, julgando ser muito inteligente para cursar essa aula, já, quem sabe, estaria cursando o sétimo ano? - O veneno era sútil e a crítica velada, mas ela quis apenas morrer, pois daquela vez merecia a chamada de atenção.
- Perdão professor.
- É tudo que tem a me dizer?
- Sim.... - ele queria que ela falasse o que? Que dormira demais no primeiro dia de aula?! Logo ela?!
- Sem justificativas plausíveis são menos 5 pontos para Grifinoria. Uma vergonha para a monitora. Agora pare de atrapalhar minha aula e sente-se.Sem poder contestar nada, Hermione apenas abaixou a cabeça envergonhada, ouvindo as risadas abafadas dos sonserinos a esquerda da sala. Sentou-se ao lado de Neville, lembrando-se de repente que Harry e Ron optaram por não fazer a aula de poções.
Cumprimentou o colega com um aceno mínimo de cabeça que foi retribuído com um sorriso sincero, e isso a fez sentir menos mal. Calada, ouvia a voz sebosa de Snape explicando sobre a poção do vivo morto. Depois de alguns longos minutos naquele monólogo, o professor pediu que os alunos redigissem com suas palavras o preparo da poção e sua aplicação.
- Posso entrar professor? - Uma voz conhecida de Hermione invadiu o silêncio da sala, e assim como todos, voltou-se para trás, em direção da porta para ter certeza de quem se tratava.
- Senhor Malfoy, alegro em saber que não desistiu das aulas. Como não é monitor, sua vergonha é menor. Dois pontos as menos para Sonserina.
O lado direito da classe, que era ocupado por grifinorios quase por completo soltou um muxoxo de reprovação pela incoerência do professor que tirou menos pontos de um aluno de sua própria casa por um mesmo delito do que de um grifinório. Porém a reclamação não durou muito depois que Snape os encarou desgostoso o suficiente para deixar a sala no mais mórbido silêncio onde tudo que se ouvia eram apenas as pontas das penas riscando pergaminhos.
Contudo Hermione perdeu um quinto de sua atenção na atividade, apesar de continuar a fazendo quase no automático. Desde o momento que viu Malfoy entrar na sala algo, que ela não estava conseguindo definir o que era, lhe chamou atenção. Não sabia se era o fato de nunca ter visto antes o garoto com os cabelos molhados por um recente banho, o que ela, por mais que odiasse admitir, achou atraente, ou aquele perfume que sentiu quando ele passou por ela para se sentar ao lado do tal Zabine, duas carteiras a esquerda e à frente dela, ou se era aquela sensação estranha de familiaridade com o sonserino. Estava tudo tão intenso que ela mesma se pegou várias vezes olhando para o perfil branco de Malfoy, se recriminando todas as vezes por isso, mas achando ruim cada cutucada do colega moreno no loiro, que o fazia olhar para ele para conversar e assim tudo que ela conseguia ver era a nuca esguia do garoto.