Capítulo 20

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"Se formos honestos"

Lia tem superstições em dizer que chinelos com o solo para cima fazem mal. Será que meu salto virado, jogado no canto do quarto, seria motivo de repreensão da parte dela? Olho pela janela com os braços envoltos ao meu corpo contando as estrelas como forma de distração, entretanto não tem como fugir. Sua indagação vem cortante como um punhal em meu peito abrindo o corte quase cicatrizado por terapias.

— O que houve? — Nego de costas para ele. — Quer conversar? — Nego mais uma vez. — Então eu vou... Eu vou deixar você sozinha...

— Você quer dizer que vai embora? — Viro o cortando. A voz embargada.

— Sim. Não quero atrapalhar. Você parece precisar de um momento a sós. — Tudo o que eu não preciso é ficar só.

— Não... — Falo baixinho. Aproximo-me dele e seguro em seus dedos. Não consigo olhar para o seu rosto. Começo a brincar com sua longa mão ainda com manchas da luta. — Não me deixe só. — Olho para ele. — Você não pode ficar aqui... Sem... Sem perguntas? Só ficar do meu lado?

— Ficar do seu lado é tudo o que eu mais desejo Madeleine. — Ele me puxa de encontro ao seu corpo. Abraço seu tronco sentindo seu cheiro agora familiar.

Afasto-me suavemente e vou em direção a minha cama. Empurro os grampos de cabelo do coque que acabei de desfazer, para trás sentando-me. Junto minhas mãos e começo a mexer nos dedos em busca de algo para me concentrar.

— Mas se você continuar assim... Ninguém vai poder te ajudar. Por que você não me conta o que houve? Foi a Alice não foi? Você saiu e voltou estranha...

— Não foi ela. — Corto-o.

— Então o que foi Mady?

— Foi... — Reluto comigo mesma se vou falar ou não. Estou fria, anestesiada pela dor, e aproveito esse momento para colocar para fora. — Foi um cara.

— Por que você não me mostrou quem era? Eu o arrebentava lá mesmo! O que ele fez? — Nem tudo se resume a lutas querido Hyunwoo.

— E estragar a festa de Jooheon?

— E você acha que eu me importo com a festa? — Ele se abaixou a minha frente. — Eu me importo com você.

— Vai além desse cara... — Suspiro.

— E por que você não me conta?

— Você disse que eu era sua namorada para a Alice. —Desconverso.

— Eu adoraria que fosse. — Ele sorri.

— Se eu for honesta com você... Com toda certeza eu não serei a sua escolhida.

— O que você quer dizer?

— Eu sei que vai embora. — Ri em desespero.

— Eu nunca vou embora Mady! Só... Só se você quiser.

Engulo em seco olhando para as minhas mãos. Pondero em contar ou não. Ele se levanta e puxa a cadeira da minha escrivaninha para perto de onde estou se sentando a minha frente. Tira o paletó e coloca no encosto da cadeira, desata a gravata borboleta a deixando sobre o ombro, abre um botão da blusa para refrescar e arregaçada as mangas. Tira o relógio, a carteira, o celular e a chave da motocicleta jogando em cima da cama ao meu lado.

— Viu? Eu não vou a lugar algum. — Ele cruza os braços me analisando, recostado à cadeira esperando que eu fale.

Kimmy sempre me disse que quanto mais eu contasse isso para as pessoas, quanto mais eu perdesse o medo em desabafar e dizer a verdade, mais rápido eu saberia lidar com o problema. Porém, reviver as memórias toda vez que conto isso é doloroso demais. Prefiro afogar-me em minhas mágoas e traumas sozinha do que dividir. Eu não posso mais mentir para ele, se ele quer ficar comigo como diz, uma hora ele vai ter que saber a minha história, saber o porquê eu fugi dele por tanto tempo, o porquê tenho medo dele. Mesmo a revelação sendo feita para o homem que é como a sombra do meu carrasco, eu não posso esconder a verdade. Eu sei que ele vai embora, então é melhor começar a falar de uma vez. Assim não tenho tempo de me apegar e viver a minha primeira frustração amorosa.

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⏰ Última atualização: Mar 17, 2018 ⏰

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