Trem da meia-noite
A porta está entreaberta, empurro a mesma que range ao me dar passagem para o ambiente mal iluminado. As janelas estão à mostra, as cortinas não estão fechadas, mas o claro da lua cheia que prevalece do lado de fora não é suficiente para iluminar a sala de banho. Meus sapatos fazem barulho no chão de madeira conforme caminho até a banheira no centro do ambiente. Todo o alvoroço e burburinho das pessoas no exterior do ambiente são como um volume mudo de TV para mim agora.
Acho que encheram a banheira demais. O pensamento inocente me assombra. Escuto um "plock" de instante em instante a cada vez que uma gota escorrega na borda branca e cai de encontro ao piso onde já se formou uma pequena poça d'água. Meu coração está na garganta, pulsando rápido. Meu corpo está quente, muito quente, mas não estou com febre. Paro ao lado da banheira e olho para seu interior. Minha expressão deve ser de horror no momento. O "plock" das gotas ainda é constante. Talvez eu nunca mais consiga ouvir esse som sem me lembrar do que estou vendo agora.
Azul dissolve na água esbranquiçada de cor leitosa, e um pouco de vermelho também se espalha por ela. Não sei se foi bom ou ruim, mas funcionários interceptaram Jooheon no corredor para dar informações sobre Minhyuk, e eu acabei por entrar sozinha no ambiente. Fico de joelhos, como se um peso estivesse sobre os meus ombros me impulsionando para o chão. Sinto meu peito arder. Ainda me lembro do abraço apertado e de afeto exacerbado que ele me deu a última vez que nos vimos. Seguro no tecido da blusa e puxo seu corpo para cima, emergindo-o. O barulho da água é torturante.
Seus lábios estão arroxeados. Tiro o cabelo molhado de sua testa com carinho. Minha mão busca seu pulso, procurando pelo bombear familiar da veia, mas nada vem. Ele não respira, é como um boneco que antes falava e agora está quebrado, jogado em um canto. Eu quero chorar, mas não consigo, ainda estou assustada com a velocidade do acontecido. Olho para o corpo morto a minha frente, com o tronco e pernas submersos na água colorida pela tinta que usava no cabelo. Uma bela e trágica Arlequina.
— Mady, temos... — Chang perde a voz. Pareço uma mãe na borda da banheira cuidando para que o filho pequeno não se afogue, porém Minhyuk não é meu filho e eu cheguei tarde demais para impedir. — Novidades... — Ele para mais uma vez.
— Ligue para o departamento e mande viaturas para cá. Chame Carter também. Peça para alguém avisar que ninguém sai da Danger sem que eu descubra o que aconteceu. — Minha voz é fria enquanto eu continuo a limpar seu rosto, agora tirando a tinta que escorre por ele.
Meu peito arde mais quando me lembro de seu abraço. Ele queria me ver mais vezes, foi o que ele disse. Nunca mais vou vê-lo falante e sorridente, mesmo que a maioria dos seus sorrisos fossem direcionados a Jooheon e causassem constrangimento as pessoas ao redor. Se minha mãe estivesse viva ela iria olhar para mim e dizer que ele estava se despedindo com aquele afeto. Mas eu só acredito nisso quando a morte é espontânea. Será que quando escolhemos tirar nossa própria vida isso também acontece?
...
Jooheon entrou rápido, e na mesma velocidade, saiu. Poucos minutos depois uma porta bateu e o som de coisas quebrando embalou o meu lamentar silencioso, com lágrimas vagarosas, ao lado de Minhyuk. Os gritos de Jooheon fizeram Wonho abaixar no canto da sala e tampar os ouvidos enquanto chorava. Eu vi a versão de vinte anos atrás de cada um. Eu vi um Hyunwoo com medo, um Wonho que chora encolhido, um Jooheon quebrado, um Hyungwon que não teve coragem de entrar e apenas chorou do lado de fora, e eu vi um Kihyun que pareceu derramar aquilo que não chorou no enterro do irmão, como se tudo o que aconteceu arrebentasse a represa que ele guardava. Eles choraram. Os líderes também sentem e isso me surpreende. Não me assusto, afinal o raio de sol que se tornou pálido como a lua era querido por todos.
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Butterfly - Monsta X
FanficSinuoso, ele é como uma nuvem negra. Uma fumaça que se dizima antes mesmo que eu o toque. Arredio e cheio de mistérios somente ele é capaz de trazer tantos desencontros a minha vida. Desde pequena um único medo me assola. Não do escuro, ou do bicho...