Capítulo 10

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Dois dias depois, Camila observava da janela da cozinha Lauren e David brincarem no quintal. Tratava-se de um jogo complicado que envolvia um disco de plástico, dois cachorros agitados e um velho boné de beisebol, resultando num bocado de correria, riso e rolar na grama. Se havia regras, ela ainda não conseguira discerni-las.

Aliás, ultimamente encontrava dificuldade em entender regras. Tanto as suas quanto as de Lauren. Não se apaixone por mim, ela lhe dissera há dois dias, com a naturalidade de quem a advertia a não molhar os pés. Como se fosse uma questão de escolha. Afinal, ninguém planejava se apaixonar por esta ou aquela pessoa. Lauren deixara claro desde o começo que qualquer relacionamento com ela seria desprovido de envolvimento emocional, ao que ela respondera que relações desse tipo não a interessavam. No entanto, ali estava, já apaixonada, sendo evitada por Lauren como uma doença contagiosa.

Camila suspirou. Formavam um par curioso desde aquele passeio de barco, cada qual procurando ficar fora do caminho da outra e ao mesmo tempo fingindo que tudo estava normal quando não estava. Camila nunca se vira em tamanho redemoinho de emoções na vida. Parecia obcecada pela mulher, pensando nela a todo instante, ansiando por sua companhia quando separados e se retraindo de embaraço quando em sua presença. Mal conseguia encará-la quando se encontravam. Toda vez que seus olhares se cruzavam, aqueles momentos íntimos voltavam-lhe à mente, as lembranças tão vividas em seu erotismo explícito que lhe traziam rubor às faces. Gaguejando alguma desculpa, ela saía do recinto, consciente dos olhos verdes seguindo cada passo seu.

No quintal, David soltou uma risada estridente. O menino corria com o disco de plástico numa mão e o boné de beisebol na outra, a tia em seu encalço simulando uma perseguição. Lauren vestia calça jeans e camiseta desbotadas, não lembrando em nada a executiva de Wall Street. Camila balançou a cabeça em divertimento. Atração física ou amor — fosse qualquer coisa —, aquela mulher mexia como ninguém com suas emoções.

Um ruído chamou a atenção de Camila. Ao se virar para trás, deu de cara com Erik fitando Lauren com frieza.

— Oi. Não percebi quando entrou.

— Notei. — Os olhos azuis de Erik brilharam momentaneamente, divertido. — Desculpe se demoramos tanto na cidade. Nunca imaginei que organizar um casamento fosse tão complicado.

— Devíamos ter fugido para casar, como sugeri. — Taylor irrompeu na cozinha, as faces afogueadas e os olhos faiscantes. Equilibrava dois sacos de supermercado, tomando cuidado para não pisar na gata em seus calcanhares. — Tabitha, quer sair do caminho?

Erik a livrou das compras, dando-lhe um beijo estalado.

— Nada de fuga, madame. Quero que a ilha inteira saiba do nosso casamento.

— Só espero que não se arrependa por sua impetuosidade, sr. Christensen. — Taylor se livrou também da bolsa e tirou os cabelos do rosto. — Puxa, que fome. Já comeu, Camz?

— Ainda não. Estava em dúvida se chamava David ou os deixava terminar de brincar.

Taylor olhou para a irmã e o filho, sorrindo afetuosamente,

— Aquela criança está no sétimo céu com Lauren, Erik e você para brincar. Não sei como se arranjará quando as coisas voltarem ao normal por aqui. — Ela se virou da janela para pôr o avental. — Espero que ela não pegue no seu pé hoje. Sei que está tentando terminar aquele folheto turístico sobre o Keltic Lodge.

— Tentando — Camila repetiu. — Acho que está na hora de parar de vadiar e voltar para a estrada. Não sei se é Seahaven, o ar salgado ou o casamento, mas não consigo me concentrar em nada ultimamente.

— Ou talvez nenhuma dessas alternativas — Taylor sugeriu, lançando um olhar significativo para fora.

Camila se afastou da janela. Recorrer ao trabalho para esquecer Lauren era uma boa ideia em teoria; na prática, revelara-se um fracasso. Não desenhara nada que prestasse em uma semana, e acabara desistindo em desespero.

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