Capítulo 3

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— Não admitirei que venha aqui me perturbar!

Uma voz feminina, estridente de raiva, deteve Camila já com a mão esquerda na maçaneta da porta da cozinha. Do outro lado, ouviu-se um murmúrio em resposta.

— Bem, não me importa o que pensa! Se é só para isso que veio, é melhor pegar as malas e ir embora! — Era Taylor, embora Camila jamais tivesse ouvido sua voz alegre tão indignada.

Camila recuou silenciosamente. Não encontrara, Lauren ao acordar, sendo duas malas e o resquício da fragrância agressiva de um perfume feminino no ar os únicos sinais de sua estada ali. Pela janela, ela vira a camionete velha de Erik estacionada diante do hotel, ao lado de uma Ferrari preta que só podia ser da visitante inesperada. Consciente de que sua presença era inoportuna, havia saído para desenhar, esperando que, quando voltasse, os fogos de artifício já tivessem estourado.

Um erro de cálculo, a julgar pela troca de palavras ríspidas que ouvia furtivamente. Não querendo se envolver na discussão, já se virava quando a porta da cozinha se abriu com violência e Lauren assomou a sua frente, os olhos verdes faiscando de raiva. Lauren esbarrou nela ao passar como um furacão, croquis e lápis se espalhando pelo chão, e continuou pelo corredor, sem sequer olhar para trás, batendo a porta da frente ao sair.

— Oh, meu Deus! — Taylor estacou à porta da cozinha diante do material esparramado pelo chão. — Sinto muito, Camila. Francamente, essa minha irmã é impossível!

— É bem-feito para mim por ouvir conversa alheia. — Camila ria.

— Era inevitável. Aliás, acho que nos ouviram até o porto lá embaixo! — Taylor se ajoelhava para ajudar a juntar o material. As faces continuavam afogueadas pela exaltação, as narinas dilatadas. A semelhança com a irmã era assombrosa.

— Quanto tempo faz que não se veem? — Camila perguntou. — Uns dois anos?

— Mais ou menos. Ela voltou para Nova York há umas duas semanas e não perdeu tempo em vir ao meu encalce para salvar de mim mesma.

— Ela já se encontrou com Erik?

— Não. Quando chegamos de manhã e vi a Ferrari estacionada lá fora, dei um jeito para Erik ir até a cidade. Sabia como Lauren reagiria e esperava acalmá-la um pouco, antes de conhecer Erik, mas... Droga, parece que tenho ainda dez anos, pelo jeito como ela me trata!

Camila não conteve o riso. Deixando de lado a pasta contendo os croquis, olhou afetuosamente para a mulher irada e tensa à frente, sua melhor amiga há tantos anos.

— Bem, deve admitir que isto foge um pouco ao estilo da Taylor Jauregui de Madison Avenue que todos pensavam conhecer.

— Você compreendeu.

— Sim, mas não sua irmã mais velha.

— É verdade, embora sempre pense em você como mais velha que eu, em vez de um ano mais nova. — Um sorriso triste se esboçou nos lábios de Taylor. — Vivo sofrendo uma crise atrás da outra, a um passo de uma catástrofe, e você nunca falha com sua calma e lógica, mesmo quando o céu parece prestes a desabar.

— Falando em catástrofe, sinto cheiro de queimado...

— Oh, meu Deus! — Taylor se pôs de pé num pulo e correu para a cozinha. Escancarando o forno, espiou para dentro com ar preocupado, o rosto contorcido contra o calor.

Camila atravessou a ampla cozinha decorada com plantas exuberantes e sentou-se junto a uma mesa grande diante do solário. Ali o filho de Taylor, David, brincava rodeado por uma variedade de brinquedos de madeira criados por Erik. Dois cachorros cochilavam tranquilamente ao lado do menino, juntamente com uma gata de pelo cinzento que lambia a pata branca. Camila sorriu para si mesma diante do reconfortante quadro doméstico. Taylor merecia um pouco de felicidade. A vida não havia sido fácil para ela desde a infância despreocupada em Newport. Durante seu primeiro ano em Radcliffe, ainda de luto pela perda dos pais, apaixonara-se por um estudante de medicina de Harvard e abandonara os próprios estudos para sustentar os do jovem marido. Três semanas depois de conseguir admissão no renomado Boston General, Roy Kellner pedia a separação por causa de outra mulher, deixando Taylor com uma montanha de dívidas, um bebê e um coração cheio de sonhos destruídos.

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