- eu quero saber a verdade.quando entro em casa eu não consigo me segurar e é a primeira coisa que sai da minha boca.
Marilla, que estava lendo, e Matthew, que assistia televisão, dirigem o seu olhar para mim.
- boa tarde para você também, Anne. - Marilla fala com um tom desinteressado e volta a ler o seu livro.
- do que você está falando? - Matthew pergunta pondo sua total atenção em mim.
- sobre os meus pais. - falo e agora sim Marilla olha mesmo para mim. - quero saber de onde eu vim e não detalhes sobre a história que vocês criaram para encobrir o fato de que eu fui abandonada. eu quero toda a verdade, sem nenhuma omissão de fatos.
- por que isso agora? - Marilla parece um pouco brava por minha curiosidade repentina.
- porque estou cansada de saber que alguém me conhece mais do que eu mesma, estou cansada de viver uma mentira sem nem mesmo saber a verdade e eu tô ainda mais cansada por ninguém nunca querer responder as minhas perguntas, então por favor só me contem. - respiro fundo e Matthew pede para eu me sentar ao seu lado.
- é uma história um pouco longa.
- tenho todo o tempo que precisar.
Matthew então se ajeita no sofá e puxa um pouco de ar para começar a falar.
- você já que eu me casei um tempo atrás e nunca tive filhos nesse casamento, mas o que eu nunca te expliquei foi o por quê disso. a minha esposa não podia ter filhos e isso não foi uma coisa que saímos espalhando por aí, poucas pessoas sabiam e por isso rumores e fofocas sobre nunca termos tido filhos sempre pairavam ao nosso redor, não que nos importássemos com isso, para nós a nossa vida estava boa e não precisava de nenhuma mudança.
então ele faz uma pausa como se estivesse reunindo forças para continuar.
- até que descobrimos a sua doença, ela estava com câncer. um câncer silencioso que se instalou sem deixar rastros e por isso demoramos tanto para saber sobre ele e quando descobrimos, estava em um nível tão avançado que ela teve que praticamente morar no hospital. foi assim que eu conheci a sua mãe.
meu estômago embrulha e eu seguro forte a mão do meu pai como um incentivo para que ele continuasse falando.
- nessa época, eu já estava vindo e voltando do hospital a quase dois meses e ela ainda não tinha descoberto que estava grávida e não tinha nenhum amigo lá então começamos a conversar. ela sofria de aids, adquiriu a doença depois de uma transfusão de sangue que ela fez quando era mais nova, ele estava infectado.
então ele olha para Marilla, que apenas observava aquela cena prestando muita atenção, e ela percebe que vai ter que assumir um pouco.
- você tem os cabelos dela. - Marilla começa a falar. - ela tinha apenas 17 anos quando a conhecemos e agora, toda vez que eu olho para você é como se ela estivesse mais presente do que nunca. eu nunca tinha visto cabelos tão vermelhos antes, mas parece que toda a alegria e a energia que estava em cada fio de cabelo dela foi para o seu. ela te amava tanto, Anne.
- quando ela soube de você, - Matthew volta a falar. - ele sentiu um turbilhão de emoções de uma vez só: ela estava aterrorizada com o fato de que poderia passar a doença para você, estava radiante porque ela ia ter uma filha e estava arrasada porque tinha quase certeza de que não ia dar tempo para você se lembrar dela quando crescesse.
ele engole em seco.
- enquanto isso, o quadro de saúde da minha mulher só piorava, ela já não saia da cama e não deixava nenhuma visita entrar a meses. ela morreu 3 dias antes de você nascer e nesse meio de tempo eu só sai do hospital para ir ao seu enterro. temia que se eu deixasse sua mãe sozinha ela iria embora também. mas quando você nasceu ela ficou ainda mais frágil, parecia que os remédios não traziam nenhum resultado e ela acabou morrendo 8 dias depois do seu nascimento. eu sinto muito.
ele começa a olhar diretamente para mim.
- mesmo em um espaço de tempo tão pequeno, ela nunca parou de falar que você foi a melhor coisa que já aconteceu em toda a sua vida, você era o tesouro dela. a família da sua mãe percebeu a proximidade que eu tinha com ela nas poucas vezes em que foram visitá-la e decidiram te deixar sob os meus cuidados. seria um pouco complicado para eles alimentar mais uma boca e você foi exatamente o que eu estava precisando naquele momento, Anne. - ele faz uma pausa. - você me salvou.
então eu não aguento mais me segurar e abraço ele, começando a chorar descontroladamente.
- me desculpe por nunca ter te contado antes, mas essa história é um pouco complicada para uma criança entender.
- muito obrigada por isso. - saio da abraço e tento parar de soluçar. - eu sei que foi muito difícil para você e isso significa muito para mim.
- acho que já podemos parar com tanto sentimentalismo, certo? - Marilla se levanta limpando as poucas lágrimas que deixou cair. - já está ficando tarde e o jantar não vai se preparar sozinho. - ela começa a andar na direção da cozinhas mas para e olha para nós dois que não tínhamos nos mexido. - o que vocês estão esperando? um convite formal? vamos, levantem.
- a sua sensibilidade me comove, Marilla. - meu pai se levanta e oferece ajuda para eu me levantar também, que eu aceito de bom grado.
- nunca vi lágrimas pagarem as contas antes, e você? - então ela sai da sala.
- qual era o nome dela? - pergunto com a voz ainda um pouco manhosa.
- como? - papai pergunta com uma expressão confusa no rosto.
- o nome da minha mãe, você não falou em nenhum momento da história. - seco um pouco mais o meu rosto.
- ah sim, seu nome era Sarah. um nome especial para uma garota única. - ele sorri aparentemente lembrando dela.
- VÃO ME AJUDAR OU O QUÊ? - Marilla grita da cozinha.
- tão sentimental. - eu sorrio um pouco e meu pai abraça o meu ombro me conduzindo até a cozinha.
• • •
eu acho que esse foi o capítulo mais importante da história até agora e eu espero de todo o coração que vocês tenham gostadoeu só consegui arranjar um tempo para escrever agora em meio à essa correria de fim/início de unidade
até o próximo capítulo e eu amo vocês 💕🌌
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iheay - shirbert
Fanfictionsempre houve uma linha tênue entre o amor e o ódio e essa linha pode ser atravessada de um lado para outro em pouco tempo, em poucos instantes, para ser mais exata. de repente, aquela pessoa que não aguentamos ouvir o nome se transforma no alguém qu...