A queda

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10 de abril de 2002

As coisas fugiram do controle. O demônio era persistente, perpetuou até estar fora do corpo de Jenny, mas antes certificou-se de que ela já não respirava mais.

Os pais de Jenny chegaram nos últimos instantes do exorcismo. Os gritos de Tereza me implorando para parar de fazer aquilo com sua filha, quebraram-me a alma, mas eu fiz o que era necessário.

Emanuel não poude terminar, ele se deu conta de que Jenny não sairia daquele quarto escuro e cheirando a enxofre viva.

Jenny morreu, não me culpo por isso. Fiz o que foi necessário para mante-lá viva, mas nem sempre as coisas são como queremos. O ritual de exorcismo durou dois dias, e depois eu fui encaminhada para a delegacia.

Fui acusada de homicídio culposo junto a Emanuel, mas não tardou muito e fomos soltos. Jenny morreu de causas naturais.

Estou prestes a deixar a cidade. Acabo de passar em uma floricultura, deixarei uma rosa na porta da casa da família de Jenny.

É o meu jeito de pedir perdão por ter falho com Jenny.

Queria negar, mas já comprei mais flores do que posso contar, falhei mais vezes do que posso suportar.

Carter vira a página, e se assustou levemente quando uma foto desprendeu-se dela. Na foto Margareth sorria, não havia ninguém ao seu lado, mas um colar chamava a atenção de Carter.

O pingente era uma simples pedra preta que se prendia a Margareth por um cordão de couro

Carter virou a foto para ler o que estava escrito no verso.

- Para a mulher que irá morrer antes de cumprir o prometido. - Leu Carter em um sussurro. - Assinado Leonard. - Finalizou.

Carter passou as mãos pelo rosto, tentando espantar o sono. Agora estava acomodado em sua cama e envolvido por cobertores macios que o esquentavam.

O quarto estava a meia luz, iluminado apenas por um abajur, mas ele podia ver a lua cheia iluminar a noite pela janela enquanto uma leve garoa caia molhando as janelas.

O diário de Margareth estava em suas mãos. Aqueles papéis preenchidos com as palavras da mulher carregavam tanta negatividade, mas ainda com cinco páginas lidas, não havia nenhuma pista sobre sua morte.

- Mas é claro que não teria. - Ele resmugou.

Margareth havia sido morta a alguns dias atrás, e os relatos no diário começavam desde dois mil e dois, cedo demais para conter algo relacionado ao seu assassinato.

Carter olhou as horas refletidas no visor de seu celular, que acabará de ser ligado por ele. Suspirou ao se dar conta de que já passava-se de duas da madrugada.

Ao amanhecer iria sair da cidade. Iria até Nova Jersey falar com o padre Emanuel. O mesmo que Margareth citou nas linhas de seu diário.

Carter fechou o diário e o repousou no criado-mudo, junto de seu celular, logo em seguida apagou o abajur e ajeitou-se em meio aos cobertores.

Quando fechou os olhos, o rosto de Margareth invadiu-lhe a mente. O sorriso leve curvado nos lábios não escondiam os mistérios que os olhos azuis da ruiva tentavam esconder.

- Quem você realmente é Margareth. - Questionou em um sussurro para o vazio escuro antes de adormecer.

***

Carter adentrou na paróquia. Seus olhos percorreram o ambiente em busca de Emanuel. O lugar estava escuro mais ele pode avistar padre.

Se aproximou a passos largos, o padre se quer o viu. Estava com os olhos fixos na bíblia em uma leitura atenta.

- Emanuel? - Chamou Carter atraindo a atenção do padre que levantou os olhos para olha-lo.

- Sim. Posso ajudar em algo filho?

Carter apresentou seu distintivo para o padre que arregalou levemente os olhos e logo em seguida raspou a garganta.

- Conheceu Margareth Oorth não é? - Questionou em um tom ameno para não preocupar mais ainda o homem de idade já avançada.

- Sim. — Respondeu baixo demais.

- Posso fazer algumas perguntas?

- Claro. Fique a vontade. - O padre sorriu. - Me acompanhe. — Pediu gentilmente com um sorriso trêmulo curvado nos lábios.

Carter seguiu o homem até uma sala, onde sentaram-se frente a frente numa confortável poltrona de couro com uma mesa de madeira maciça a separa-los.

- Como conheceu Margareth? - Carter questiona de início.

- Eu a conheço desde que ela nasceu. Margareth nasceu nessa cidade, frequentava a paróquia com os pais. - O padre respondeu, mas parecia incomodado com algo.

- Ela tem algum parente ainda vivo? - Carter questionou.

- Sim. Uma tia, mora em uma fazenda na divisa da cidade. - Emanuel conta. - Seus olhos banhados em desconfiança param em Carter e ele não resiste em questionar:- Desculpe questionar policial, mas aconteceu algo com Margareth?

Emanuel questionou olhando firmemente para Carter, que por um breve segundo calou-se e oscilou os olhos para os papéis sobre a mesa pensando em um bom jeito de noticiar o homem do acontecimento.

- Margareth foi assassinada. - respondeu da forma mais simples que encontrou. — Foi encontrada algumas semanas, estou responsável pelo caso.

Emanuel suspirou frustado, abaixou a cabeça para ocultar as lágrimas trazidas pela tristeza que aquela notícia lhe trouxe.

- Estou com o diário dela. - Carter anunciou rompendo o silêncio.

O padre levantou a cabeça até novamente estar com os olhos fixos nos de Carter, as lágrimas cessaram e ele agora tinha um semblante sério.

- Fique longe. - Ele diz com a voz grave e séria.

Carter franze o cenho sem compreender as palavras de Emanuel.

- Não estou entendendo. - Anunciou. - Porque devo ficar longe? - Questionou astuto.

- Já leu alguma das páginas? - Carter maneiou a cabeça em concordância. - Então deve ter notado as coisas que aconteciam com Margareth, com o que ela lidava. - Emanuel diz ríspido. - Se afaste para não ter o mesmo fim que ela teve.

Possessão (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora