22ㅡ Fracasso

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Fico neste quarto o máximo que consigo. Jace raramente aparece, e é o único que insiste em não me deixar sozinha.

Alec não quis continuar a me treinar mais por causa de meu estado mental, e isso apenas piorou. Eu preciso de uma distração.

Um dia, eu gritei muito alto dentro do quarto. Eu não sabia ao certo porquê. Talvez por muitas coisas terem sidos jogadas nas minhas costas para eu carregá-las sozinhas. O grito saiu do fundo da minha garganta, libertando apenas 1 por cento do que estou sentindo.

Sem lágrimas. Minha torneira se fechou, aparentemente. Apenas fico encarando o nada, a espera de que um buraco me engolisse e me enterrase, para eu nunca mais me levantar, precisar enfrentar esse fardo que aperta meu peito.

Minha barriga, ela... Está minimamente maior. Eu reparei. E isso me deixou com um nó tão grande na garganta que tive de me levantar e engolir em seco algumas vezes, mas continuou. Suspirei, exasperada.

Eu só preciso do Nathan.

Desci as escadas, pela primeira vez em três dias. Eu tinha outra vida para alimentar.

Nathalie veio correndo e me abraçou. Seus braços me apertaram, e não esperei por isso. Sua surpresa me alegrou um pouco, então retribui o abraço, a abraçando o mais forte possível que consigo.

Quando se afastou, limpou uma lágrima discretamente.

ㅡIrei no velório de sua amiga, algum problema?ㅡSua voz havia apenas pena. Eu sabia que não foi propositalmente. Então por que eu estava tão triste por isso?

Balancei a cabeça em negativa, sentindo o nó em minha garganta se aumentar.

ㅡ Ótimo...é... Vou falar com o Alec.ㅡAntes que pudesse responder, ela se virou e correu até um corredor no qual nunca entrei.

Fui em direção à cozinha e pego um jarro d'água dentro da geladeira. Despejo em um copo e tomo em pequenos goles.

Jace havia me dito que há uma piscina nos fundos, mas nunca cheguei a ver.

Viro-me para trás e encontro Alec me observando. Ele está sem os óculos.
Seus olhos são de um violeta impressionante, e abaixo do olho esquerdo parece ter uma pequena pedrinha, da mesma cor dos olhos.

Eles brilham. Como estrelas.

ㅡO velório é daqui a algumas horas. Por que não está pronta, raposinha?ㅡ Seu olhar crítico me machuca, e percebo que suas vestes são pretas. Ele recoloca os óculos e continua me encarando.

ㅡNinguém me disse nada...ㅡViro-me e ando apressadamente para o quarto onde estou, trancando a porta assim que entro.

Vou até meu guarda-roupa e retiro o vestido preto que eu trouxe para esta ocasião.

Tomo banho em um banheiro acoplado ao quarto, escovo bem os dentes, lavo meu cabelo várias vezes.

ㅡEstou pronta.ㅡSussurro para mim mesma, olhando-me no espelho.

Estou com um coque no alto do cabelo, com um chapéu preto com um pequeno véu cobrindo metade de cima do meu rosto.

Salto alto preto, meia-calça preta, sombra preta, esmalte preto. Tudo preto.

Suspiro ao perceber que a única cor que tem em minha vestimenta é o batom vermelho e meus cabelos laranjas.

Pego minha bolsaㅡtambém pretaㅡ e desço discretamente as escadas.

Nathalie, Jace e Alec estão ali, conversando baixo.

Jace é o primeiro a me notar, e sorri solidariedade. Isso me dá um dejá-vu do meu aniversário, que parece tão distante agora.

Jace me estende o braço e agradeço, colocando minha mão em seu antebraço.

Alec e Nathalie vão na frente e abrem a porta de casa, depois do Jeep verde que nos espera.

ㅡNão precisa fazer nada que não quiser, eu entendo. Sei que tem muitas coisas acontecendo na sua vida neste momento, e mesmo nos conhecendo a apenas alguns dias, pode contar comigo.ㅡAs palavras de Jace me tranquilizou um pouco, é apenas assenti. Ele tem sido um bom amigo. Tomara que não pense em algo a mais, já que estou toda entregue para Nathaniel.

Olho para minha barriga. Ainda tão pequena, mas já crescendo um pouco...

Nem percebi quando chegamos no cemitério. Nem ao menos percebi que entrei no carro. Não soltei o braço de Jace, e ele pareceu feliz ao continuar assim.

Saímos do Jeep e andamos lentamente até o cemitério. Entramos em uma pequena capela, onde havia um número considerável de pessoas. Olhei ao redor, com esperanças de encontrar Francielle e Anthony, mas eles não estavam alí.

Então reparei no caixão.

Tentei não olhar, não perceber os gemidos e choros abafados, mas não consegui.

Me aproximei do caixão lentamente e então vi.

A expressão serena de Luna. Seus cabelos cacheados, sua pele escura, flores ao seu redor...

Minha visão embasou e lágrimas transbordaram.

Suas mãos estavam em cima do coração, e eu os pressionei com minha duas mãos. Ela estava tão gelada, tão rígida, tão pálida...mas tão em paz.

Me afastei sem lhe direcionar um olhar e abracei Jace sem pensar duas vezes. Ele suspirou no meu cabelo e solucei, balançando meus ombros vergonhosamente.

Uma outra mão pousa em meu ombro, e me afasto um pouco de Jace.

Alec segura meu ombro firmemente, e aponta a porta da capela com a cabeça.

Assinto e me afasto de Jace, que bufa, aborrecido, e vai conversar com Nathalie.

Alec me direciona até um banco do lado de fora de senta-se no chão.

Sento-me no banco e o observo.

ㅡVocê está progredindo, ruivinha. Dando os passos certos, certamente.

ㅡComo isso pode ser certo!? O Nathan desaparecido, a Luna morta... O que está certo nisso tudo?

ㅡTudo tem seu tempo. E como está Peter?

ㅡEle não se chamará assim!ㅡMe desespero.

ㅡSeu futuro é incerto, mas o nome dele é Peter. Não estou aqui para falar dele, certamente. Sobre algo mais importante. Seus amigos.

Meu corpo gela ao mecionar de Tony e Fran.

ㅡO que tem eles?

ㅡHum... Por onde começar?

"Anthony tem um poder, e ele usou errado, acabando ficando obsessivo à Francielle. Ele a sequestrou, mas não fez nada de errado, ao contrário, a tratou como uma deusa. Policiais foram informados e, bem, Anthony está preso."

Meu coração se parte mais uma vez.
Somos um desastre. Aliás, somos não.

Eu sou o desastre, e todos ao meu redor estão fadados ao fracasso.

O EstranhoOnde histórias criam vida. Descubra agora