Capítulo 4 - Parte 1

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(27 anos antes)

Uma espessa nuvem de alegria cobria toda a extensão da nova construção na mansão dos Deeps. Uma parte inutilizada da ​ casa fora dada ao filho único de Jones para que construísse algo do seu interesse. Jack havia pedido uma biblioteca tão grande que os olhos de quem a visse ficassem queimados pela sabedoria. Vários andares, o segundo piso estava sendo construído ainda. A obra não estava completamente pronta. Havia alguns poucos livros em pilhas espalhados pela enorme biblioteca. Uma tapeçaria de cores vibrantes enrolada num canto, encostada na parede, logo seria posta para cobrir o piso de madeira maciça. As paredes eram em tons frios, entrando em contraste com o avermelhado da madeira que formava as inúmeras prateleiras. Uma mesa no centro do salão, ainda não estava completamente montada. Era preciso pôr o tapete primeiro. Num lado da biblioteca estavam grandes quadros em branco, uma bancada repleta de pincéis e tintas. Tripés para os quadros também estavam ali. Do outro lado da biblioteca tinham vários pedaços de mármore brutos. Uma estátua inacabada coberta por um lençol.

No meio de toda aquela bagunça estava Jack. Ainda garoto. Sentado no chão, lia um livro velho. Livros e mais livros ao seu redor. Um dicionário sobre suas pernas. Parecia concentrado. Usava uma blusa branca, com mangas longas e soltas. Um colete muito bem alinhado, calça social, cinto de couro, sapatos pretos brilhosos. Deveria ter oito anos. Era um garoto prodígio. E parecia dar orgulho.

Apesar de parecer tão calmo, o que acontecia de verdade é que Jack não conseguia sentir empatia por ninguém. Nem por seu pai, muito menos por sua madrasta. Então ele preferia ficar sozinho, ilhado, solitário. Se ele não se comunicasse, seu problema aumentaria ainda mais.

A porta se abriu. Era uma grande folha de madeira clara que não possuía ainda nenhum adorno. As maçanetas eram de ferro e faziam barulho. Seu pai entrou. Jones estava elegante, porém tão triste que nem mesmo um raio de sol ousava aparecer em sua presença. Usava um terno preto, sem gravata. Um relógio de ouro no bolso da calça. Uma bengala na mão esquerda.

— Jack! Lady Martha está aqui com sua filha, venha conhecê-las. — Jones falava friamente.

— Estou lendo agora, pai. — O menino respondeu secamente.

— Eu não perguntei o que estava fazendo, eu mandei vir comigo. Agora! — Jones abriu a porta atrás de si, mandando o menino sair.

— Mas... — Jack ia tentar argumentar.

Jones bateu com a bengala no chão, causando um barulho estrondoso. Jack se levantou, deixando o livro para trás e seguiu para fora da biblioteca com o pai. Juntos, caminharam pelo corredor, em completo silêncio, era possível ouvir o passo dos ratos dentro das paredes ou embaixo do piso, até mesmo sobre o telhado da mansão. Desceram juntos pela escada principal, que dava direto para a sala de visitas. Jack não conseguiu terminar de descer, pois viu uma garota sentada no sofá, que se levantou junto com a mãe para cumprimentá-lo.

— Sejam bem vindas, Lady Martha e Senhorita Lillian. — Disse Jones, abrindo um insosso sorriso. Beijou a mão das duas e as convidou para se sentarem junto com eles.

Jack ficou parado por um tempo, até que pareceu descongelar, foi na direção das duas que estavam ali e beijou suas mãos também, em sinal de respeito. Sentou-se ao lado do pai e ficou olhando Lillian, que parecia estar distante, pois cantarolava bem baixinho.

— Jack... — Jones se impôs ao rapaz — Leve Lillian para olhar o jardim, mostre as montarias e os animais a ela, tenho certeza de que irá gostar.

A garota olhava Jack, que se levantou e a convidou para seguirem para o jardim. Lillian ia calada, porém serelepe, até chegarem num corredor onde havia um belo piano. Era negro, de madeira, lustrado e com um vaso minúsculo onde jazia uma flor branca em contraste com o tom preto. Ela foi à direção daquele lugar e Jack foi atrás.

— Hey, meu pai não gosta quando eu entro aqui, saia. — O menino segurou a mão da menina.

— Você já está aqui, Jack. — Lillian se soltou, sorrindo — Toca?

Ele ficou vermelho e sem graça pela resposta, vendo Lillian se sentar numa cadeira próxima, esperando que ele tocasse para ela. A sala era um pequeno compartimento oval, rodeado de janelas. Um lustre de brilhantes pendia do teto. As paredes eram em tom pastel. Um enorme banco ia de uma extremidade a outra da sala. Ficava logo abaixo da janela e era estofado. Uma mesinha de ferro pintada de branco e adornada ficava próxima do piano. Um pequeno vaso baixo e quadrado enfeitava a mesa com petúnias. As cadeiras eram de ferro adornado, pintadas também de branco e estofadas no assento. Era a sala mais alegre da enorme mansão.

Jack criou coragem e se sentou ao piano. Começou a tocar algo pesado, com uma mistura de notas graves e tons agudos. Lillian ficava olhando. Até se levantar, ir até ele e se sentar ao seu lado. Começou a tocar junto com ele, nas notas mais baixas. Aquela melodia estava enchendo a casa inteira com um ar que não havia mais desde a morte de Margareth.

Jones estranhou aquela música. Margareth costumava tocá-la para ele, que a seguia nas notas altas. Sentiu um aperto no peito e se levantou, sendo seguido por Lady Martha, que estava impressionada pela boa música.

— Quem está tocando? — Perguntou Martha.

— Meu filho... ele... — Jones fez uma pausa breve, lembrando-se de Margareth — sempre gostou de arte, como a mãe dele.

Martha e Jones seguiram para a saleta oval onde ficava o piano. Martha pôde ver a filha tocando. E sorrindo, impediu que Jones os interrompesse. O puxou para fora e ficaram observando.

— Essa música, eu levei anos para aprender. Seu filho tem oito anos e a toca como um verdadeiro pianista. E minha filha está tão linda tocando também! — Martha encostou a cabeça no ombro de Jones. Eram dois viúvos e eram amigos há muito tempo — Eles vão ser amigos. Tenho certeza disso.

 Tenho certeza disso

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JACK - Livro Um [COMPLETA]Onde histórias criam vida. Descubra agora