Capítulo 10 - Parte 1

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(37 anos antes - Caravela de Santa Maria)

— Capitão Raphael, seja bem-vindo à Santa Maria. — Falava um dos subordinados do navio. Ele segurava um esfregão, um balde e tinha um sorriso estranho, desdentado — Vai ficar conosco essa noite? — O marujo coçou a cabeça e começou a se apoiar no esfregão, aguardando resposta.

— Não Enry, não ficarei com os demais essa noite. — Raphael usava calças mais largas, marrons e botas de couro, tinha uma espada curvilínea clássica e muito bem polida e naquele momento também estava usando o paletó com as ombreiras de capitão pendurado em seus ombros. Ele comandaria a caravela durante a viagem que fariam.

Os demais olhavam o capitão com cara de desprezo e desgosto, aparentemente estavam enojados. Não gostavam de Ruphus, não gostavam da forma que ele comandava os navios que assumia, apesar de ser reconhecido pelo bom trabalho, pois possuía um pulso muito firme com seus marujos e subordinados da coroa que seguiam viagem junto com os demais integrantes da navegação. Não permitia festas e nem que os mesmos se relacionassem com prostitutas durante as viagens, evitando bêbados e doentes em sua tripulação. Os superiores gostavam da forma que ele comandava e isso era o suficiente, pois os marujos não podiam fazer motim, caso contrário seriam expulsos da marinha e perderiam todos os benefícios.

Ao lado de Ruphus estava seu fiel companheiro em todas as viagens, Luís. Era um homem mal encarado, careca, com uma cicatriz que cortava todo o seu rosto desde o olho direito até o queixo e que sempre estava com o uniforme impecável, além do avental de cozinheiro que sempre estava pendurado em seu cinto, pronto para ser utilizado. Luís era mais alto que Raphael e tinha o condicionamento físico melhor. Possuía barba grande e era careca desde que se conheceram. Os marujos achavam que Luís era muito mais do que amigo de Ruphus, porém nada nunca fora encontrado como prova concreta desse tal romance entre os dois ou qualquer coisa que induzisse um comportamento mais afetivo do que uma simples amizade de longa data.

— Está ciente das coisas, irmão. — Afirmava com certeza, o homem barbudo. Ambos estavam na ponte do porto, próximos à caravela — Sabes bem que mulher que é de outro homem não pertence a ti. — Ele dizia com convicção, alertando ao amigo — Resolva isto antes de partirmos, vá de cabeça limpa para nossa jornada.

— Ela está grávida, Luís. — Ruphus finalmente desabafou — Aguarda uma criança que não sabemos de quem é. — Raphael passava a mão pelos cabelos — Eu... eu estou receoso em voltar lá. — O capitão estava bastante abalado com a situação, porém ainda mantinha a seriedade perto dos demais.

— Ora, seja homem! — Luís bateu no ombro de Ruphus, dando uma risada confiante — Partiremos na próxima alvorada, irmão. — Luís se afastou um pouco, pondo as mãos nos bolsos — Trate de se acertar com a tal mulher. Não carregues isto em ti, vais explodir se continuar e eu não quero estar por perto quando isso acontecer.

Luís se afastou de Raphael, o deixando consigo mesmo, sozinho naquela ponte, ou melhor, acompanhado de seus pensamentos e lembranças pesarosas. O colega e amigo foi para o navio sem mais delongas ou retornos de cabeça, provavelmente fora começar a descascar as batatas e outros alimentos para as primeiras semanas de viagem, diminuindo seu tempo de serviço em alto mar.

Já o capitão da caravela, com as mãos na cintura, vistoriava as cargas que entravam no navio, observando atentamente cada um dos detalhes e até mesmo os uniformes que seus subordinados trajavam, queria tudo de acordo em sua maior expedição. Balançava a cabeça negativamente a cada dois minutos e parecia extremamente preocupado, entretanto sua preocupação não estava focada em seus homens, sim em suas condições atuais. No fundo, em seu âmago, Raphael sabia que tudo o que estava acontecendo com Margareth, Jones e a família Deep e o que ainda estava por vir, seria sua culpa e caso não fosse por completo, teria grande parte dela recaindo sobre seus ombros até o fim de sua existência. Ele tinha muito mais consciência do que sua mãe.

Raphael olhava o mar, que naquele momento, estava subindo e cobrindo as pedras da praia. A ventania era forte naquele lado do porto. O lado mais próximo dos Campos de Vérnia era onde Ruphus estava com Santa Maria. Quando finalmente o último barril foi levado para dentro do navio e todos os homens que trabalhavam ali se recolheram para levantarem cedo no dia seguinte, Ruphus se ausentou, roubando um cavalo de uma estalagem, claro que o devolveria quando retornasse, mas não sabia exatamente se retornaria vivo dessa última visita aos Campos, pois era a visita em que contaria tudo que causava pesar em sua mente.

 Quando finalmente o último barril foi levado para dentro do navio e todos os homens que trabalhavam ali se recolheram para levantarem cedo no dia seguinte, Ruphus se ausentou, roubando um cavalo de uma estalagem, claro que o devolveria quando ret...

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