05| Camadas

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Logo após o jantar, os dois começaram a arrumar as malas, já que viajariam na manhã seguinte. Enquanto o investigador continuou calado, atormentado novamente pela culpa, para sua surpresa, a esposa não demonstrava nenhum sinal de chateação. Pelo contrário, ela se movia com serenidade, seu rosto possuía uma expressão diferente do que ele costumava ver... Aparentava estar em paz. Quando foram se deitar, o ponteiro do relógio passava da meia-noite.

No outro dia, eles partiram cedo para a estação de trem, embarcando no primeiro horário disponível. No momento em que a locomotiva começou a se afastar de Belmonte, Dulce espiou por cima do seu livro, observando o marido.

― Algum problema, senhor Uckermann? ― Ele mexia as pernas impacientes.

― Eu estou preocupado com a senhorita. ― O homem fixou os olhos na esposa sentada em sua frente.

― Pois não é necessário. ― Ela folheou uma página.

― Eu não tenho tanta certeza ― o rapaz sussurrou. ― Temo que minhas ações prejudiquem você. ― Desviou o olhar, seu tom de voz continha uma pontada de tristeza.

― Não diga isso, Christopher. ― A moça fechou o livro, levantando-se para se acomodar ao lado dele. ― Minha mãe dizia que há males que vêm para o bem ― pronunciou carinhosamente.

Ela segurou na mão do marido à medida que encostava a cabeça em seu ombro. Tocado pelas palavras dela, o investigador notou uma mudança sutil na postura da mulher, como se algo tivesse se transformado em seu interior.

― Além do mais, sei que ficarei protegida nos seus braços. ― Ele sorriu acariciando os cabelos da esposa.

Aos poucos o caminho avançava, a cada segundo a distância se encurtava. Os dois engataram em uma conversa animada sobre o livro que ela estava lendo: Helena, de Machado de Assis. O homem comentou que a protagonista e ela possuíam algumas coisas em comum. Eram determinadas e buscavam pela própria felicidade. Uma pena que a jovem nunca conseguiu viver o amor que tanto desejou, a moça refletiu. Por isso, mais do que qualquer coisa, seu objetivo seria desbloquear o que a impedia de se entregar por completo para o marido.

― Sabe, senhor Uckermann, eu tomei uma decisão ― ela mencionou após um tempo em silêncio. ― Resolvi seguir seu conselho, eu quero ser professora.

― É mesmo? ― Os olhos dele brilharam cheio de admiração. ― O que a fez tomar essa decisão agora?

― Bem, reler essa história despertou em mim uma vontade ainda maior de superar minhas próprias limitações. Então, porque não transformar a vida das crianças que passam por momentos difíceis através da educação, também? ― O rapaz a fitou surpreendido. ― Assim que retornarmos pretendo construir uma escola tanto para meninos quanto para meninas.

Christopher ficou sem palavras, a esposa a cada instante o fascinava, revelando um novo lado. Não esperava que essa viagem fosse trazer essas mudanças no comportamento dela, aliás sua mente acreditava que ela se fecharia outra vez.

― Eu achei maravilhoso, você tem todo o meu apoio. ― Ele segurou o queixo da mulher, unindo os lábios dos dois.

― Ótimo! ― ela disse entre um selinho. ― Porque agora precisamos conversar sério. ― Dulce agarrou a gola do sobretudo dele. ― O senhor está me devendo uma lua de mel.

― Se esse é o problema, prometo que assim que concluir o caso, a senhorita será muito bem recompensada. ― O investigador sorriu divertido ao mesmo tempo que a moça o puxou, beijando-o para esconder seu constrangimento já que sua imaginação a levou para à noite do seu casamento.


Logo que se separaram do beijo apaixonado, uma curiosidade cruzou a mente dela. A mulher percebeu que era o momento perfeito para perguntar algo para ele que sempre esteve em sua mente, mas nunca encontrou coragem suficiente para fazer antes.

A Dama de Vermelho - Parte 2Onde histórias criam vida. Descubra agora