Capítulo 14 - Um sorriso em uma noite sem luar

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Não sei o que Clara fez depois que deixei sua pergunta sem resposta. Nem sei se ela fez alguma coisa. Minhas lembranças cessam exatamente nesse ponto. Eliza também não me contou nada que tenha ocorrido desse dia até o do meu acidente. Ateve-se a dizer que, alguns dias depois, eu saí do hospital e que os outros que se seguiram foram normais, apesar de tensos e angustiantes, em razão da morte de papai.

A visita à fazenda, onde me acidentei, foi uma forma que um velho amigo de papai viu de nos ajudar a esquecer da tragédia. Mal sabia ele que lá acabaria acontecendo outra. Mas a intenção foi boa.

Agora, não sei... Esse período vazio de lembranças me atormenta! O que terá acontecido? E mais... Por que Clara simplesmente desapareceu depois de eu não ter respondido àquela pergunta tão enigmática? Ilusão ou realidade? O que ela quis dizer com isso? Será que ela quis sugerir que eu estava vivendo num mundo ilusório? Criado por mim mesmo para escapar de uma realidade pouco aceitável?

Mas poderia um menino de 10 anos fugir da realidade? Ou será que eu não era um menino de 10 anos? Será que era realmente eu quem estava lá? Será que essas lembranças são realmente minhas? Ou serão de Quem? Mas, e Maria Eliza? Por que ela inventaria essas histórias? Ou melhor, como ela saberia do passado de Quem? E por que motivo ela procuraria me fazer acreditar que vivi coisas que não vivi?

Assim está minha mente agora. Cheia de pontos de interrogação. Ainda mais porque sinto aumentar em mim um sentimento de perda incontrolável. Meu coração grita de dor, por não ter mais Clara a meu lado. Mas, se a tive em alguma ocasião, foi apenas naquele lapso de tempo de minha infância. Mesmo assim, parece-me que foi muito mais do que isso. Então, eu me pergunto: esses sentimentos são meus ou de Quem? E o pior de tudo, não consigo mais responder.

No começo, eu conseguia distinguir as coisas, porém, agora tudo está ficando confuso demais. Principalmente em relação à Clara. Antes eu a imaginava apenas como uma lembrança de Quem. No entanto, acabei por descobrir que ela fez parte de minha própria vida, se realmente as lembranças que me convencem disso forem verdadeiras.

O cheiro do mar, que invadiu meus pulmões naquele dia de minha infância, que de tão forte dava-me a impressão de ser líquido e frio, é, aparentemente, um elo entre o que me parece ser o meu passado e o de Quem. Quando ele dominou minha mente e me aprisionou dentro de mim mesmo, assumindo o controle de tudo, ele escreveu sobre isso. Sim... Eu li tudo que ele escreveu, porém, mesmo sem ler eu já sabia. Ele escreveu no papel, mas deixou uma cópia na minha mente.

Enfim, Quem comentou sobre esse cheiro, após o encontro com Clara. No dia em que foram ao cinema. Isso deixou claro que ele vivia ou vive, ou quem sabe ainda viverá, numa cidade litorânea. E a minha cidade fica muito distante do litoral. Logo, ele não vive aqui. Então, por que esse camarada veio de tão longe para me atormentar? Que azar o meu!

Voltando à questão do cheiro do mar, tudo indica que Clara tem ou teve uma forte relação com o litoral. Lembro-me agora de uma cena que parece provar essa teoria. Vejo Clara sorrindo, não como quem deságua a alegria por mero acaso, mas como quem verdadeiramente sente uma resplandecente felicidade! E Quem recebia esse sorriso com os olhos entorpecidos, totalmente hipnotizado diante de uma mulher tão encantadora!

Os olhos de Clara brilhavam ainda mais do que em outras ocasiões, refletindo a luz de estrelas dominantes. A lua, minguante, morria em um canto da noite, desprovida do domínio que lhe é peculiar quando está cheia. O mar cantarolava sua eterna ópera, ora mais arredio, ora mais eloquente. E o resto das pessoas que estavam ali, também sentia o mesmo odor desvairado que a água, a areia e as pedras temperavam e sopravam no ar. Mas nenhuma delas estava desorientada, perdida ou aprisionada nas profundezas dos olhos de Clara.

E a lua continuava lá, como um mero aparato, na noite em que o brilho mais esplendoroso que se viu foi o que um lindo sorriso produziu, numa praia onde o mar chorava de saudade.

Você conseguiria ajudar o nosso narrador a responder as inúmeras perguntas que o atormentam? Mesmo se você não conseguir, deixe o seu comentário sobre elas! A história continua na semana que vem

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Você conseguiria ajudar o nosso narrador a responder as inúmeras perguntas que o atormentam? Mesmo se você não conseguir, deixe o seu comentário sobre elas! A história continua na semana que vem. Enquanto você aguarda, dê uma olhada no meu outro livro aqui no Wattpad: Kurz - Poemas de dor e angústia.

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