Parte II - 3

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Ela ergueu a cabeça num solavanco, assustada. Os olhos azuis bem abertos para Alfonso evidenciavam o arrependimento pela voz exaltada.

- Não acredito que fiz isso! - disse, angustiada - Me desculpe! Não queria acordar seu bebê! Sua esposa... - ela salientou, bastante nervosa - Sua esposa pode ficar irritada. Ela com certeza vai ficar irritada. Até mesmo eu ficaria, e não me irrito com facilidade. Acho melhor eu ir embora.

Alfonso revirou os olhos.

- Não. Ela não vai ficar irritada. Fique exatamente aí onde está.

E deu-lhe as costas, subindo as escadas.

Ela se sentou vagarosamente no sofá outra vez, tentando assimilar. Embora houvesse desejado, sabia que sair dali estava realmente fora de cogitação. Para ser honesta, graças a Deus ele havia pedido que ficasse.

Devaneando sobre a vida daquele homem, Anahi se acomodou melhor. Precisava entender como alguém em sã consciência tivera coragem de casar com ele, um cara tão enjoado e ranzinza. Tentou imaginar como era o convívio naquela casa, se ele seria diferente com sua mulher, com seu filho... Se era capaz de fazer comentários divertidos ou simplesmente sorrir, e também se era capaz de jogar as próprias latas de cerveja no lixo.

Ela riu sozinha, afastando os pensamentos. Nesse instante, ele voltou trazendo um pequeno bebê no colo, envolto em uma manta polpuda. Imediatamente um sorriso se abriu em seu rosto.

- Ah, não brinca – ela murmurou, enternecida - É ele ou ela?

- Ela - Alfonso respondeu.

- Como ela se chama? Oh, aliás, como você se chama?

- Alfonso.

- Eu me chamo Anahi Portilla - disse ela, ansiosa - Agora posso pegar essa doçurinha, sim? - a loira pediu, estendendo as mãos. Alfonso a pôs entre os frágeis braços dela. Os cachos loiros caíram sobre seus ombros e os olhos se iluminaram quando se inclinou para tocar a testa da menina - Ela é tão pequena. E tão linda. Absolutamente linda! Qual é o nome dela?

Alfonso se viu travar, sentindo-se um imbecil por não ter pensado numa coisa tão óbvia. Era evidente que seria questionado sobre o nome daquela criança. Mas Alfonso nunca precisou conversar sobre ela com ninguém, de forma que aquilo sempre lhe pareceu um mero e irrelevante detalhe. Quando precisava se referir a ela, mesmo sendo apenas em seus próprios pensamentos, sempre o fazia da forma mais genérica possível, tratando-a simplesmente como "bebê". Era isso que ela era. Um bebezinho sem personalidade e sem importância. E sem identidade também.

Um nome. Qualquer um. Anahi o escutaria e o esqueceria já na manhã seguinte, quando estivesse bem longe dali. Por que então parecia tão difícil dar um nome estúpido àquela menina?

- Sophie - ele respondeu, subitamente, cortando o silêncio e a expectativa.

Sophie. Sua avó.

- Sophie, que bonito nome você tem! - disse Anahi antes de direcionar o olhar para Alfonso - Ela tem os seus cabelos.

Ele conteve o impulso de rir. Não gostaria de ofender a ingenuidade daquela mulher, tampouco traumatizá-la ao mostrar-lhe que nem todos ali viviam um sonho americano. Muito menos ele. E menos ainda aquela criança.

- Segure-a enquanto eu pego um pouco de café - deu de ombros, por fim, indo até a cozinha.

Ao voltar, percebeu que (a recém-nomeada e por enquanto) Sophie estava quieta, bastante concentrada na cantoria de Anahi. Bem, isso não era de todo mau. Pelo menos aquela loira inconveniente teria alguma utilidade enquanto ele tivesse de mantê-la aquecida e viva dentro de sua casa.

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