Capítulo 6

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— Eu já consigo imaginar o que seja — disse Luci. Eu acenei com a cabeça, confirmando suas suspeitas.

Estávamos todos reunidos no auditório da escola, esperando pelo anúncio que o diretor queria nos dar há alguns minutos.

Joguei a cabeça para trás na cadeira, suspirando. Dean estava atrás de mim, me encarando com a mesma expressão séria do dia do jantar. Aliás, nossa única interação nos últimos dias se resumia a ele me encarando daquela forma e eu sorrindo amarelo. Voltei ao meu lugar imediatamente. Quase engasguei com a força com que virei meu rosto pra frente.

Luci não tinha percebido a pequena cena que se desenrolara ao seu lado. E eu também não a tinha contado sobre o passado de Dean. Em parte porque achei que era algo muito pessoal dele, e outra parte porque queria que eu fosse a única a saber seu segredo.

— Que tema você acha que a comissão escolherá? — ela indagou. Tema para o baile de formatura, queria dizer. Como terceiranistas, em breve terminaríamos nossa jornada no ensino médio e este final era sempre marcado por uma festa.

Eu estava fazendo um esforço terrível para não captar pensamento algum, mas naquele lugar, ficava difícil. Era um burburinho sem fim de vozes e mais vozes num auditório lotado. Inclinei a minha cabeça para baixo e passei a mão no rosto, respirando fundo. Detestava aquele tipo de reunião, pois sempre acaba com dor de cabeça.

— Você está bem? — Ouvi. Foi tão perto de mim que não tinha como ser um pensamento. Mas no meio de tanto barulho, não reconheci a voz. Me virei para Luci, mas ela estava vidrada no palco. Girei o rosto para o outro lado. Dean havia se inclinado em sua cadeira até estar perto do meu rosto. Me demorei um pouco em seus olhos. O que ele estava pensando?

— Estou, obrigada — respondi, me virando para frente, sentindo meu rosto esquentar um pouco.

— Samantha, você está bem? — ouvi mais uma vez.

Mas como era possível uma coisa daquelas? Virei para o lado. — Sim, eu já disse que...

Opa.

Carl vinha na nossa direção. Provavelmente tinha estado ocupado com as coisas do jornal até agora. Baile de formatura, com o tema casais da história, muita notícia, realmente. Regozijei-me em saber do tema. Só que não.

Ele se sentou ao meu lado. Forcei um sorriso e acenei com a cabeça.

— Não liga não, Carl — adicionou Luci — É só dor de cabeça. Você sabe como ela fica com essas reuniões. Audição sensível e tudo mais. — É, todos sabiam, poucos entendiam.

Cobri o rosto com a mão. De algum modo, não foi a dor ou o burburinho que me incomodaram. Foi o olhar de Dean atrás de mim. Me levantei do lugar, eu já sabia o que o diretor ia dizer, não precisava ficar ali esperando. — Vou até a enfermaria.

— Quer que eu vá com você? — Carl se adiantou, já se erguendo de sua cadeira.

— Não precisa, obrigada. — Saí pelo grande portão da sala, antes que ele sequer tivesse tempo de tentar me convencer, o que não ia funcionar.

Na tarde daquele mesmo dia, chegou aos meus ouvidos uma outra notícia desanimadora. As mudanças com o casamento. Como eu havia suspeitado, todos nós nos mudaríamos para uma casa diferente. Porém, maior.

— Ela é meio velha, mas é bonita e vai ter um quarto para cada um de vocês. — Disse a minha mãe. A minha reação continuou a mesma de antes: quase nenhuma. Não que eu não estivesse minimamente animada com a notícia, eu só não tive forças para reagir. — Eu adoraria que você viesse comigo ver a casa.

— Claro — afirmei, meio sem vida. — Agora?

Ela assentiu. Por que não, né? Não é como se eu estivesse fazendo nada melhor, além de me lamentar da minha terrível dor de cabeça.

A casa não ficava longe, era num bairro melhor do que o nosso, mas um pouco inferior do que o de Harry. Minha mãe afirmava que gostaria de poder ajudar com as despesas da casa — principalmente ela sendo a que tinha a maior prole —, e ela não conseguiria fazer isso em um local muito ostensivo.

A fachada já estava pintada. Não era de todo mal e parecia realmente grande. O interior, no entanto, estava completamente vazio.

— É bem grande, mesmo. Vocês já decidiram os quartos? — perguntei olhando ao redor.

— Já! — Apontou com a mão para uma escada e seguiu naquela direção, esperando que eu fosse atrás.

Aparentemente eu teria um quarto grande e com banheiro só pra mim. Pela bagunça no lugar era possível ver que já tinha gente trabalhando na acústica ali dentro. Era ao lado do quarto de Dean, uma informação um tanto incômoda, mas do jeito que a nossa relação — se é que pode-se chamar assim — estava abalada, não vi muita diferença.

O tour pela casa levou a tarde inteira, pois contou com explicações de minha mãe sobre as cores das paredes, cortinas, móveis e onde ficaria cada coisa.

— Eu também queria te falar... — ela começou. Eu já imaginava o que era e não porque eu tivesse ouvido seus pensamentos. Estávamos a meio metro da porta de saída. — Nós marcamos a data do casamento para daqui a três meses.

Acenei com a cabeça, tentando me mostrar animada. — Que maravilha. — Respirei fundo. Isso significava apenas uma coisa para mim: o meu inferno pessoal estava cada vez mais próximo. — Vai ser perto da minha formatura, então.

— Duas festas em um só mês, quem diria? — Ela me deu uma cotovelada, rindo. É, quem diria. Para quem nunca sai de casa como eu, estou até no lucro. Não pude deixar de rir.

— Já compramos os dois vestidos de uma vez. — Parecia contemplativa. Estava planejando algo. Dei uma checada rápida em seus pensamentos.

— Não, mãe. Melhor deixar pra depois. O baile é temático e... — Bem, eu nem sabia se ia ter um par, quanto mais uma fantasia para usar. — Vamos focar no seu casamento. É mais importante. O que vocês estão planejando? Simples ou super festa?

Ela sorriu animada, como uma criança travessa. Eu já sabia a resposta.

— Você sabe que eu e seu pai nunca nos casamos oficialmente, nunca tive uma festa de casamento.

É, eu sabia. Dei de ombros, rindo.

— A sua festa vai ser a maior da cidade. Maior até que o meu baile. — Ao menos, se dependesse de mim, ela ia ter o melhor dia da vida dela. Passei o braço pelo seu ombro e a guiei para fora da casa. — Na medida do possível, já que só temos três meses.

Nossa vida ia mudar drasticamente em três meses, eu só não sabia se era realmente para melhor.

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Demorou, mas chegou uhul

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