— O que aconteceu? — Luci perguntou, na semana seguinte. Eu não estava sentada em meu lugar usual, ao lado de Carl, e sim do lado dela e desde o dia do nosso fatídico encontro nós quase não nos falávamos direito.
Não respondi. Ela ergueu uma sobrancelha. O que ela tinha de inteligente, às vezes, tinha também de inconveniente.
— Nada — respondeu o Carl, sorrindo amigável. Senti minhas bochechas queimarem. Qualquer desavisado poderia ver, sim, que tinha acontecido algo.
O fato de ser ruiva nunca me ajudou em momentos como esses, pois acaba fazendo minhas bochechas vermelhas se sobressaírem ainda mais. Nunca entendi, aliás, porque sou a única na família ruiva — e não loira ou morena, como mamãe —, e com os olhos dessa cor, uma espécie de mel. Não que eu ache que ser qualquer outra coisa poderia ter me ajudado a sair da situação.
— Na verdade — Carl começou, depois de um tempo de silêncio constrangedor. — Aconteceu algo sim.
Luci deixou o queixo cair, esperando pelo resto, que não veio por alguns minutos, enquanto Carl se mexia de um lado para o outro na cadeira. Me inclinei para ele, tentando incentivá-lo a continuar. Ele ia ter que falar em algum momento. Aquele não era o tipo de coisa que se escondia de um amigo.
— Isso tá ficando meio esquisito. — Tim coçou a nuca, desconfortável.
Carl suspirou e ergueu os braços, em rendição. — Eu vou me mudar antes do baile. E creio que não vou fazer faculdade aqui — soltou de uma vez e daí, parecia ter aberto uma torneirinha, porque o resto saiu como uma torrente de palavras. — Não faz muito tempo que soube. Na verdade faz algum tempo sim, mas eu não queria apressar as coisas nem nada. Aí eu percebi que vai mesmo acontecer e decidi contar para a Sam e ver se ela...
— Pronto. — Ergui as mãos. Carl se calou. Aquela parte ficava só entre nós.
— Cara, você devia ter contado para a gente — murmurou Tim, meneando a cabeça em negativa. Ele suspirou, se ergueu e foi em direção à porta de saída do refeitório, sendo seguido por Luci.
Olhei para o Carl, sorrindo amarelo. Senti uma pontada de culpa, mesmo sabendo que aquilo não dependia de mim.
— Fique à vontade, ainda vou ficar aqui um tempo. — Dei de ombros.
Ele entendeu a deixa. Carl saiu e ali eu fiquei sozinha, terminando o meu almoço, que sinceramente parecia ter perdido todo o sabor depois daquela conversa.
Encontrei Luci minutos mais tarde de volta na nossa sala.
— Você sabia desde quando? — questionou ela, apoiando o quadril na minha mesa.
— Ele me contou no fim de semana. — Ela não falou mais nada, nem eu tive coragem. Os olhos fixos num desenho constrangedor sobre a superfície da carteira, tentando evitar o dela.
Então, ouvi uma voz. Familiar até demais.
— Vocês duas estão caladas hoje. — Eu estava tão envolta em meus próprios pensamentos — o que é raro — que tinha silenciado todos os outros, e não percebido a aproximação de Dean.
— Hoje não — soltei de uma vez.
— Achei que você estaria menos irritada... Principalmente depois daquele passeio novo namorado. — Ele sorriu. Seus pensamentos me incomodaram mais do que suas palavras. Ele estava irritado por uma coisa que nem sequer era real. E por que ele estaria irritado, afinal? Era eu quem devia estar nervosa.
Juntei o máximo de paciência que eu tinha.
— Não estamos namorando, Dean. — Não que fosse da conta dele. — Por favor, me poupe. Nos poupe. — Não voltei a encará-lo e ele aceitou a minha reação como um sinal de que devia manter uma distância de mim pelo resto do dia. E ele assim o fez. Ao menos tinha algum bom senso.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Ouvindo Você
Teen FictionLonglist do Wattys2018! Samantah pode ler pensamentos. E seu dom se torna uma maldição, quando um novo rapaz na cidade resolve usar esse segredo contra ela.