O Sangue - Os Bruxos de São Cipriano Livro 3

Capítulo 2

Alguns meses antes do Natal

Um dia você está aqui e no outro já não está. Os pensamentos atormentavam Natasha. Não importava o quanto ela tentasse não pensar em Lónan, diariamente a lembrança da morte do irmão surgia em sua mente. A ideia de que poderiam ter passado toda eternidade juntos parecia tempo demais, pois nem ela entendia direito qual era o propósito de prolongar a vida. Por vezes, viver era muito doloroso. Ser uma vampira de energia era um fardo. Natasha sabia que a partir do momento em que se recusasse a drenar os outros, sua pele ficaria enrugada, os dentes e os cabelos cairiam e seria questão de dias para que os seus órgãos parassem de funcionar. Ainda não estava preparada para partir deste plano.

Natasha segurou uma velha pintura de Lónan. Seus sentimentos sempre eram muito intensos em relação ao irmão. Ela sabia que ele nunca seria uma boa pessoa, mas também não gostou de que alguém tomasse a decisão de pôr um fim à vida dele. As mãos de Natasha tremiam e uma corrente passou pelo seu corpo. Nos últimos dias, seu humor estava oscilando tanto, que se não fosse pelo chá de ervas mágicas, ela podia jurar que iria enlouquecer. Só havia uma coisa que a distraia da dor, uma fome incontrolável por vingança. Era mais fácil ter alguém para odiar, mesmo que ela não soubesse quem tinha matado Lónan, sabia por onde começar. Seu instinto quase nunca falhava e era como se um lugar gritasse em sua mente. O assassino está em São Cipriano.

Ela pegou o velho diário e começou a rabiscar. Natasha não se lembrava de quando tinha sido a última vez que precisava colocar os sentimentos para fora para não precisar explodir. Ter o coração quebrado era uma dor sutil perto da desconexão provocada pela perda do irmão. Começou a se questionar qual era o seu lugar no mundo e quanto tempo conseguiria viver sozinha. Precisava de algo que desse sentido à sua existência.

Sangue derramado nunca é coisa boa. Entre a raiva e a desolação, a morte é capaz de mudar tudo. Vingança. Justiça. O poder nos cega. Julgamos os outros pelas coisas que nós secretamente faríamos ou desejávamos ter feito. Quem pode nos ajudar quando o sangue do outro está em nossas mãos? Ao cruzar uma linha que não deveríamos, o universo sempre dá um jeito de cobrar o seu preço. Que nenhum sacrifício seja em vão. Lónan era poderoso demais para ser enganado por qualquer pessoa. Quando vi seu corpo, apesar de os detalhes ficarem confusos na minha cabeça, eu sabia que sua morte tinha relação com vingança e magia. Alguém havia ofertado seu corpo como um sacrifício. Seja lá quem tivesse feito aquilo, só podia ter muito conhecimento sobre rituais. Meu irmão não era nenhum santo, mas acredito que nem ele havia sido corrompido pelas trevas àquele ponto.

Natasha olhou para a própria pele. Estava tão pálida que era possível ver as veias azuladas nos braços. Não sabia dizer quantos dias ficou dentro do apartamento que alugou em Londres. Ela amava andar pelas ruas da cidade, mas desde que o irmão morreu, parte dela havia se congelado. Pressionou a caneta com força contra o papel, gostava de sentir como a tinta preenchia a folha até ela quase rasgá-la. Natasha riu de si mesma. Não era uma risada de alegria, estava mais próxima do desespero. Quando foi que havia se deixado afundar tanto, perder todo o controle de sua vida? Diziam que o luto tinha várias fases, mas tudo o que ela sentia era como se as emoções se juntassem e formavam um buraco negro que estava aumentando cada vez mais dentro do seu peito.

Preciso me alimentar. É como se quanto mais eu me privasse das energias dos outros, mais o meu corpo energético se consumisse. Se Lónan estivesse aqui, ele me diria que estou perdendo o tempo me comportando como uma garotinha mimada e estúpida. Posso até ouvir sua voz na minha mente: "Por que está fazendo greve de fome? Você sabe muito bem que os alimentos não dão a metade da energia que precisamos para sobreviver. Você é uma vampira. Honre sua essência, maninha".