Florence puxa bruscamente uma de minhas mãos, surpreendendo-me. Com a outra ela pega o papel que eu a trouxe e o observa atentamente. Ela balança os pés descalços, impacientemente. Veste uma calça de tecido largo e um lençol amarrado na parte superior de seu corpo, parece cansada, quase sem nenhuma expressão, seus olhos piscam devagar enquanto ela desliza as mãos sobre os fios ruivos desarrumados. Ela olha para mim e em seguida aponta para o papel:
– "Me diga que precisa de mim. Pois eu preciso de você igualmente" – ela lê – Intenso esse verso, não?
– Se quiser pode mudar – viro-me de costas – Eu tenho que ir...
– Não precisa! – ela se apoia sobre a porta.
Estranho que ela esteja agindo assim, Florence é sempre tão calada e distante que nunca deve ter contrariado ninguém, pelo menos era o que eu pensava até agora, mas talvez eu não a conheça o bastante para fazer tal julgamento. Seu jeito evasivo me irrita, parece não prestar atenção e nem dar a mínima para nada. Pergunto e ela não responde, gesticulo e ela sorri aproximando-se de mim, ela toca em meus ombros, desliza os dedos sobre as minhas costas, passando pelos meus braços até chegar em minhas mãos. Viro-me. Ela acaricia os meus cabelos colocando-os para trás da orelha e em seguida retira os meus óculos escuros. Assusto-me com as suas investidas, Florence nunca me tocou assim quando estávamos em minha casa em Malibu, muito pelo contrário, ela sempre fora tão retraída que tudo isso me parece inusitado, mas eu disfarço, fecho o olhos e abaixo a cabeça a fim de fugir de seus olhares.
– Eu gosto da cor dos seus olhos – ela diz.
– O que você está fazendo? – pergunto surpresa.
– Você sempre faz perguntas difíceis!
– É que eu não consigo te entender – olho para ela.
– Você deveria parar de tentar, eu já desisti.
– Olha Florence, desculpa se eu te magoei, eu não...
– Shhhhh – ela encosta o indicador em minha boca – Não quero mais falar sobre isso.
– Você está bêbada. Não está? – questiono-a
Florence não responde, apenas aproxima seu corpo do meu, vagarosamente. Ela toca em meus ombros e eu me afasto. Seus olhos acompanham cada movimento meu, estão sérios, atentos e me devoram. Desvio-me abaixando a cabeça, ela toca em meus cabelos novamente, mas agora sem tanta delicadeza, em seguida segura meu pescoço de forma brusca, suas mãos estão geladas, seus dedos ríspidos descem para o meu queixo, pressionando-o fortemente para cima.
– Eu gosto da cor dos seus olhos – ela repete em voz baixa – Me deixa olhar para eles!
Estou em silêncio, acuada e sem saber como agir, encosto-me sobre a porta, levo minhas mãos para trás, busco apoio na maçaneta e ameaço abri-la, mas Florence percebe. Ela segura as minhas mãos impedindo-me, em seguida acaricia seu rosto no meu, envolvendo seus braços em meu corpo, arrepiando-me por completa. Seu corpo agora está colado ao meu e sua boca tão próxima da minha que é possível ouvir a sua respiração calma se aproximar, ela suspira, aperta e segura meu rosto levando-o de encontro ao seu; e então me beija, um beijo com vontade e sem parar por longos minutos, talvez os mais demorados da minha vida. Deixo-me levar por ela, é difícil explicar o que estou sentindo agora, um turbilhão de sensações transbordam dentro de mim e é quase impossível manter a compostura. Ela diminui a intensidade, move os lábios devagar e termina com um sorriso tímido, afastando-se. Seu beijo é doce, a não ser pelo leve gosto de álcool de sua saliva, talvez ela tenha bebido demais, talvez isso tudo seja um erro, tanto meu quanto dela e decidir isso por nós duas não estava nos meus planos. Suas pernas se contorcem, encaixando- se entre as minhas, ela se inclina para beijar-me novamente. Ouço o barulho da fechadura e busco as suas mãos.
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Just Another Way
FanfictionO que acontece quando dois talentos musicais se unem? Uma ligação inesperada é um indicio de que durante um processo criativo tudo pode acontecer.