CAPÍTULO 01

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        Marília abriu os olhos assustada e olhou em volta. Por um instante pensou que nada havia acontecido e seu marido estivesse dormindo ao seu lado. Mas não havia ninguém. Sentia a cabeça pesada e o aperto no peito continuava. Havia pegado no sono quando o dia já estava amanhecendo. Olhou no relógio: sete horas.
        Altair já deveria estar se vestindo para ir à escola. Levantou-se, lavou-se, vestiu um robe e foi ao quarto do filho. O menino não queria levantar e Dorita tentava fazê-lo vestir com dificuldade.
        Marília aproximou-se:
         - Deixe comigo. Vá aprontar o café.
        Dorita saiu aliviada e Marília, alisando a cabeça do menino, disse:
        - Vamos filho. Está na hora. Não era hoje que você ia jogar no time da escola?
        Essas palavras soaram como uma mágica. Altair abriu os olhos e pulou da cama.
       - Que horas são? Estou atrasado?
        - Ainda não. Mas está em cima da hora. Vamos ao  banheiro. Eu o ajudarei.
        Em poucos minutos Altair estava pronto para tomar café. Eles desceram e foram à copa.
        O cheiro de café gostoso fez Marília recordar-se que desde que recebera a carta não havia comido nada. Sentia o estômago vazio e certa fraqueza.
        Sentou-se ao lado do filho, serviu-o, e enquanto ele comia, ela serviu-se de café com leite, apanhou um pão, passou manteiga e começou a comer. Agora mais do que nunca precisava sentir-se forte para enfrentar o que viria logo mais .
        Dorita foi levar Altair à escola, que ficava a alguns quarteirões dali, e ela  voltou ao quarto para se vestir. Ao abrir o guarda-roupa viu os termos de Otávio, alinhados com cuidado e teve um sobressalto. Sabia que ele nunca mais voltaria para casa.
        Lágrimas voltaram a seus olhos , mas ela enxugou-as com raiva. Não podia fraquejar. Quando a polícia aparecesse, precisava fingir que não sabia de nada. Não podia contar que estivera na cena do crime e não quiseram dar queixa.
        Caprichou na maquiagem, tentando dissimular seu abatimento. Talvez não tenha conseguido completamente, pois quando Dorita voltou da escola disse logo:
        - A senhora está abatida. Não dormiu bem à noite?
        - É. Perdi o sono, fiquei esperando Otávio chegar e como ele não chegou ainda fiquei preocupada.
        - Não deveria. Ele já fez isso várias vezes. Daqui a pouco ele chega.
        - É verdade. Bobagem minha.
        Dorita suspirou, ia dizer  alguma coisa, mas desistiu. De que adiantaria? Por essas e outras é que ela não ia na conversa de homens. Nunca aceitaria um marido como aquele.
        Certamente, deveria estar com outra.
       Ele foi cuidar do serviço e Marília foi arrumar as gavetas de Altair, que sempre remexia tudo e deixava bagunçado.
       As horas foram passando e nenhuma notícia. Na hora do almoço, Dorita havia ido buscar Altair e de volta com o menino perguntou:
        - Dona Marília,o seu Otávio ainda não chegou?
        - Não, Dorita. Estou muito preocupada.
        - Vai ver que ele teve algum negócio urgente e precisou viajar. Já fez isso uma vez sem avisar.
        - É, pode ser.
        O tempo foi passando, já estava escurecendo quando a campainha tocou. Marília estremeceu. Dorita foi atender e pouco depois voltou, olhando com ar assustado.
        - Dona Marília, é a polícia.
        Marília empalideceu e levantou-se imediatamente. Foi até a sala onde dois policiais a esperavam.
        - Dona Marília Marques de Oliveira?
        - Sim.
        - Precisamos conversar com a senhora em particular.
        Altair estava ao lado da mãe, olhando-os com curiosidade.
        - Dorita, leve Altair para o quarto, veja se ele já acabou a tarefa da escola.
        O menino não queria ir, mas um olhar imperioso da mãe o fez obedecer. Quando ficaram a sós, ele continuou:
        - Podem falar.
        - Seu marido se chama Otávio de Oliveira?
        - Sim.    
        - Ele está em casa?
        - Não senhor. Ele saiu ontem à noite e não voltou.
        - E a senhora não ficou preocupada?
        - Um pouco, mas ele costuma fazer isso e às vezes até viaja sem avisar.
        Os dois policiais trocaram um olhar de cumplicidade, e depois um deles disse:
        - Infelizmente, as notícias que trazemos não são boas. Seu marido está morto.
        Marília sentiu uma tontura forte e teria caído se um deles não a houvesse amparado. Apesar de saber a verdade, de ter visto a cena terrível, ao ouvir a notícia dita cruamente pelo policial tornou-se mais consciente da verdade.
        Um deles correu à cozinha, apanhou um copo de água e deu-o a ela:
        - Acalme-se. Beba.
        Ela apanhou o copo com as mãos trêmulas e bebeu alguns goles. Depois perguntou com a voz fraca:
        - Como foi?
        - Ele foi assassinado.
        As lágrimas corriam pelas faces de Marília e ela não estava fingindo. Eram verdadeiras.
        A lembrança da cena que presenciaram não lhe saía do pensamento.
        - A senhora sabe se seu marido tinha brigado com alguém ou tinha inimigos?
        - Não. Meu marido não trazia seus amigos em casa e nunca me contava o que fazia quando saía.
        - A senhora não perguntava?
        - Sempre, porém ele ficava irritado e não respondia.
        - Ele foi encontrado na cama com outra mulher, ambos mortos. A senhora conhecia essa mulher?
        - Não. Quando ele passava as noites fora, eu desconfiava. Perguntava a ele brigava.
       Dizia que ficava bebendo com os amigos e cuidando de negócios. Com o passar do tempo não perguntei mais.
        - A senhora vai precisar vir conosco para o reconhecer o corpo.
        - Agora?
        - Sim.
        - Preciso avisar os pais dele.
        - Pode nos dar o nome e endereço, nós faremos isso.
        Marília tremia e eles a observavam calados. Ela foi até a mesinha do telefone, apanhou um bloco e escreveu o nome, o endereço e o número do telefone dos pais do Otávio, destacou a folha e entregou aos policiais.
        - Vou subir para me trocar, não vou demorar.
        Eles concordaram e Marília subiu a escada, sentindo as pernas trêmulas, as mãos frias, o coração apertado. Assim que entrou no quarto, Altair correu para ela indagando:
        - É verdade que o papai está morto?
        Antes que Marília respondesse, Dorita entrou aflita:
        - Não consegui segurá-lo. Infelizmente os policias falavam alto e ouvimos  o que disseram. Eu disse ao Altair que não era verdade.
        Marília abraçou o menino, dizendo com voz que procurou tornar firme:
       - É verdade, sim. Seu pai morreu. Mas eu estou aqui, com você.
        Altair tremia e perguntou:
        - Você não vai morrer, vai?
        - Não. Vamos continuar juntos: eu, você e Dorita. Não tenha medo.
        - Com você eu não tenho medo de nada.
        - Isso meu filho.
        - Agora eu preciso sair com os policias. Mas assim que puder estarei de volta.
        - Posso ir com você? Tenho medo de ficar sozinho.
        - É melhor ficar com a Dorita. Não há perigo de nada. Saia um pouco, meu filho, preciso me trocar.
     Dorita puxou-o pela mão e eles saíram. Marília arrumou-se o mais rápido que pôde, apanhou a bolsa, mas quando abriu a porta do quarto, Altair a estava  esperando. Seus olhos aflitos procuraram os dela:
        - Eu quero ir com você, tenho medo de ficar aqui.
        Eles desceram e Marília disse aos policiais:
        - Meu filho está muito assustado. Não quer ficar sozinho com Dorita.
        - Pode levá-lo com a moça.
        Dorita rapidamente fechou as janelas e saíram. Alguns vizinhos estavam olhando curiosos e Marília entrou rapidamente no carro da polícia, puxando Altair pela mão.
        Dorita acomodou-se em seguida e os policias ligaram o veículo e saíram.
        Uma vez no carro, um deles esclareceu:
        - Passaremos antes no local onde está o corpo para fazer o reconhecimento  e depois teremos de ir à delegacia.
        Marília arrepiou-se ao lembrar-se da cena que presenciará na noite anterior, mas sentiu-se aliviada ao perceber que não estava sendo levada para lá.
        Passava das nove da noite quando entraram em um prédio onde algumas pessoas entravam e saíam. Os policiais acomodaram os três em uma sala e se foram. Pouco depois voltaram e um deles disse:
        - A senhora vem conosco, os dois esperam aqui.
        Marília sentiu as pernas tremeram. Altair segurou o braço da mãe e ela, procurando aparentar calma, disse:
        - Não tenha medo. Vou à sala ao lado e volto logo. Fique calmo. Não vai acontecer nada.
        Os policiais a levaram por um corredor mal iluminado até uma porta onde um homem vestindo jaleco cinzento, fé-los entrar. Havia algumas mesas vazias e duas  onde estavam corpos cobertos com lençol.
        O homem encaminhou-os para uma delas, pediu a Marília que se aproximasse, depois levantou a ponta do lençol. Ela olhou o corpo procurando controlar a emoção.
        - É ele! - afirmou sem conter as lágrimas. - É meu marido Otávio.
        - Tem certeza? - indagou um policiais.
        - Sim. É ele.
       O homem cobriu o rosto do morto imediatamente, e levou-a até a outra mesa, pedindo que se aproximasse.
        Ela percebeu que o outro corpo que estava ali era da mulher e sentiu uma tontura forte, suas pernas bambearam.
        Um dos policiais segurou seu braço com força dizendo:
        - Coragem. É preciso que olhe para ela e veja se a identifica. Não sabemos quem é. Seu marido estava com documentos, mas não achamos nada dela. A senhora precisa nos ajudar.
        Marília respirou fundo e depois respondeu:
        - Está bem.
        O homem levantou a ponta do lençol e ela olhou. A mulher era mais velha do que notara naquela noite. Em seu pescoço havia uma enorme gaze que cobria um ferimento.
        - Pode nos dizer quem e ela?
        - Não. Não a conheço.
        - Está certa disso?
        -  Estou.
        - Está bem. Vamos embora.
        Os policiais conduziram Marília para fora da sala. Ela soluçava e um deles entregou-lhe um lenço de papel que ela pegou, enxugou o  rosto, assinou o nariz. Ao chegarem à porta da sala onde Altair estava ela parou.
        - Preciso-me controlar - disse. - Meu filho está muito assustado. Não quero que fique pior.
        - Ele não se envolvia muito com o trabalho da casa. Era D. Marília que me dizia o que fazer.
        - Sei. Que dizer que ele não conversava com você?
        - Só às vezes, para perguntar pela D. Marília, quando não a via por perto. Ele  quase não parava em casa.
        Monteiro fez uma ligeira pausa, depois continuou:
        - Ele tinha muito amigos?
        - Só se tivesse na rua, porque em casa nunca apareceu com nenhum.
        - Pelo jeito ele não era apegado à  família.
        - Não mesmo. Ele mal olhava para o filho e brigava quando o menino falava mais alto ou corria pela casa.
        - Pelo seu tom percebo que não gostava muito dele.
        - Não é porque ele está morto que eu não vou dizer a verdade. Eu não gostava mesmo dele.
        - Por quê? Alguma vez ele a maltratou?
        - Não. Ele mal me dirigia a palavra. É que eu via como ele tratava D. Marília. Ela sim, é uma mulher bondosa, boa esposa e boa mãe.
        - Ele tinha motivos para não tratá-la bem?
        - De forma alguma. Como eu disse, ela sempre foi uma mulher muito correta e vivia para a família, enquanto ele...
        - O que tem ele?
        - Saía quase toda as noites, muitas vezes nem voltava para casa.
        - Por esse motivo ela brigava com ele?
        - Pelo contrário. Se ela lhe perguntasse aonde ia ou aonde tinha estado, ele brigava. Virava o bicho. Tanto que com o tempo ela não perguntou mais.
        - Seu patrão trabalhava em quê?
        - Não sei. Ele nunca falava sobre o seu trabalho.
        - Há alguma coisa diferente ou estranha que você tenha notado nos últimos dias?
        - Não.
        - Nem na noite do crime?
        - Não senhor. Seu Otávio costumava passar algumas noites fora e até voltava no fim da tarde do outro dia . Teve uma ocasião em que ele foi viajar e não avisou nada. Ficou quase três dias sem aparecer.
        - O que você pensava disso?
        - Bom senhor delegado, para mim quando um homem casado dorme fora, tem mulher no pedaço. Pelo que sei, ele não estava sozinho quando foi morto.
        - Você nunca desconfiou de nada?
        - Não senhor.
        - Está bem. Pode ir. Se lembrar de mais alguma coisa, ainda que lhe pareça insignificante, entre em contato comigo. Tudo pode nos ajudar a descobrir quem cometeu este crime.
        Dorita deixou a sala mais tranquila. O delegado mostrara-se cordial e ela sentira valorizada por poder desabafar e contar que sabia.
        - Então, como foi? - indagou Marília quando a viu.
        - Bem. Eu estava com medo, mas o delegado soube conversar. Eu contei o que sabia. Disse a verdade.
        - Fez bem.
        - O que vai acontecer agora? É tarde e Altair está morto de sono.
        - Perguntei quando eles vão liberar o  corpo se Otávio, estou esperando uma resposta.
        Neste momento, um casal entrou na sala, ela em lágrimas, ele com o olhar assustado. Vendo-os, Marília levantou-se:
        - Dona Emilia, viu que tragédia?
        A mulher procurou conter-se dizendo com voz abafada:
        - Eu ainda não estou acreditando! Isso não aconteceu com meu Otavinho!
        - Infelizmente é verdade. Eu queria que não houvesse acontecido - respondeu Marília, tentando abraça-lá.
        Ela fingiu que não viu, voltou-se para o marido, abraçando e soluçando. Marília deixou caídos braços desanimados. Ela sabia que a sogra nunca aceitará seu casamento com Otávio. Sempre que podia procurava deixar claro o que sentia com relação a ela, comentando com amigos e parentes que Marília não era boa o suficiente para seu filho, um rapaz bonito, cheio de qualidades e com futuro brilhante.
        Marília não sabia como ela chegara a essa conclusão, uma vez que Otávio não era como ela dizia. Era alto, forte, mas intolerante, fechado e maldoso. Embora ficasse revoltada com o comportamento da sogra, que chegava a dizer ao filho o que pensava dela, tentando separa-los, ela procurava não levá-la a sério.
        Nos primeiros dias de casada, Marília perguntava ao marido porque a sogra a tratava daquela forma. Mas ele será de ombros e lhe dissera que não se importava com o que a mãe dizia e que ela deveria fazer o mesmo. Proibiu-a de voltar ao assunto. Já Herculano, seu sogro , era menos implicante e ficava em volta da esposa fazendo-lhes todas as vontades elogiando-a o tempo todo, indiferente ao mau humor contumaz. Ele sempre conservava um sorriso nos lábios fosse qual fosse à situação. Mas Marília não confiava muito nessa postura do sogro.
        Emilia era desagradável, esnobe, exigia do marido coisas difíceis de suportar. Certamente, ele fingia aceitar para acalmá-la. Contudo, esse procedimento contribuía muito para que ela ficasse mais insatisfeita a cada dia e se colocasse na postura de vítima da ignorância dos outros.
        Emilia continuava chorando abraçada ao marido, que abatido, tentava acalmá-la.
        Um policial apareceu e Herculano identificou-se e pediu informações sobre a morte do filho, solicitando autorização para ver o corpo.
        - O delegado vai conversar com os senhores.
        - Eu quero ver o corpo! - pediu Emilia com voz chorosa. - Ainda não acredito que ele esteja morto. Pode ser um engano.
        - Infelizmente, não há nenhum engano. O corpo foi reconhecido pela esposa.
        Emilia lançou um olhar duvidoso sobre Marília que havia se sentado novamente:
        - Ela pode ter se enganado. Eu quero ver esse corpo.
        - A senhora diga isso ao delegado. Agora, sentem-se vou avisá-lo que estão aqui.
        O policial afastou-se. Emilia lançou um olhar de repulsa para as pessoas que esperavam ali. Ela não desejava sentar-se ao lado delas.
        Mas Herculano viu que havia dois lugares em um banco logo depois do lugar onde Marília se sentaram e conduziu a esposa para lá. Contrariada, ela sentou-se empertigada. Vinte minutos depois, o policial voltou e convidou-os a falar com o delegado, que os recebeu atencioso, convidando os a sentarem-se a sua frente.
        - Meu nome é Monteiro - disse. - Lamento o que aconteceu ao filho de vocês.
        - Não acredito que esteja morto . Quero ver o corpo.
        - O corpo já foi identificado pela esposa, além do que, no local do crime, havia uma carteira com os documentos dele.
        Emilia teve uma crise de choro:
        - Não pode ser! Meu filho não!
        - Como foi isso? - indagou Herculano triste.
        - Em uma casa que não era a dele, foram encontrados dois cadáveres, o de seu filho e o de uma mulher que ainda não foi identificada.
        - Uma mulher? Quem poderia ser? - indagou Emilia admirada.
        - Ainda não sabemos. Na sala da casa os móveis estavam revirados e no quarto, os corpos do casal morto na cama. Estamos fazendo as primeiras investigações e quero fazer-lhes algumas perguntas. Saber mais sobre a vida de Otávio para tentar descobrir alguma pista do assassino.
        - Estamos dispostas a colaborar. - tornou Herculano-, mas penso que não podemos fazer muito.
        - Neste momento todas as informações são importantes. Quero que falem tudo o que se lembrar a respeito dele. Seus hábitos , seus amigos etc.
        - Fale você - pediu Emilia.
        - Otávio sempre foi uma pessoa discreta. Não tinha o hábito de falar sobre sua vida.
        - Qual seu grau de escolaridade?
        - Otávio não gostava de estudar. Com muito custo conseguimos que chegasse ao ensino médio.
        - Ele tinha irmãos?
        Desta vez foi Emilia que respondeu:
        - Era filho único. O que será de mim agora sem ele?
        - Otávio era muito apegado à senhora?
        - Ele não era apegado a ninguém - interveio Herculano. - Ela é que era muito apegada a ele, era Deus no Céu e Otavinho na terra.
        - Otavinho sempre foi um bom filho. Era calado, mas de vez em quando ia nos ver e dava-nos dinheiro.
        - Ele trabalhava em quê?
        - Era representante comercial. Tinha um escritório e até um funcionário.
        - Quero o endereço desse escritório.
        Os dois entreolharam-se e não responderam logo. Depois Herculano disse:
       - Não sei onde fica. Ele nunca me deu o endereço.
        - O senhor nunca foi lá?
        - Não. Como eu disse, meu filho era discreto, não gostava de falar muito e quando eu perguntava, ele se irritava, ficava nervoso. Então Emilia ficava zangada comigo.
        O delegado olhou-os sério, depois decidiu:
        - Está bem. Esta foi uma conversa informal. Vamos tomar algumas providências e voltaremos a conversar oportunamente.
        - Eu quero ver meu filho!  - Pediu Emilia.
        - Vou pedir que os levem até ele.
        - Quando vamos poder fazer o enterro? - indagou Herculano.
        - Não posso ser preciso. Depois da autópsia e de algumas investigações o corpo será liberado.
        - Meu Deus! - gemeu Emilia nervosa. - Eles vão cortar o corpo de Otavinho!
        - Acalme-se, Emilia - pediu Herculano - É de praxe.
        Os dois deixaram a sala e Herculano olhou em volta, procurando a nora e o neto. Não os viu e comentou:
        - Eu queria falar com Marília e consolar Altair.
        - Eu quero ver Otavinho logo e ir embora desde lugar horrível o quanto antes.
        Um atendente os chamou para levá-los ver os corpos com a intenção de saber se conheciam a mulher. Os policiais não tinham descoberto a identidade por ela fora ferida nas mãos e não puderam colher as impressões digitais, o que impediram sua identificação.
        A hipótese de que eles teriam sido mortos por um marido traído era viável, mas havia um complicador: a desordem da sala sugeria que estivessem procurando alguma coisa e que teria sido mais de um. O casal foi morto na cama, o que afastava a probabilidade de luta.
        - O senhor viu onde minha nora foi? - indagou Herculano ao atendente.
        - Ela estava esperando para saber quando o corpo seria liberado. Mas como ainda não sabemos, ela foi embora.
        Levados ao necrotério,l diante do corpo do filho, os dois choraram muito e Emilia começou a passar mal.
        - É ele mesmo! Até agora eu achava que podia não ser nosso filho!
        Herculano abraçou-a, tentando acalmá-la, sentia o coração oprimido e decidiu:
        - Agora vamos sair daqui. Precisamos  tomar um pouco de ar.
        Ele a puxou pelo braço e, apesar de ela querer ficar, acabou cedendo.
        - Antes de ir precisam ver mulher que estava com ele e dizer se a conheciam.
        Emilia não queria, mas Herculano forçou-a a olhar o rosto dela . Eles disseram que nunca tinham visto.
        Uma vez fora da sala o atendente disse:
        - Podem ir embora. Quando o corpo estiver liberado nós os avisaremos .
        Eles saíram cabisbaixos, pernas trêmulas, peito oprimido. O rosto do filho e daquela mulher não lhes saía do pensamento.
       

       
       
   

  
      
        
  
      
   
 
  
         

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