Quanto Custa um Sorriso?

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Ele foi quem cuidou dos pontos. Ela ainda não havia parado de chorar.

Ele via tantos sentimentos no rosto dela. Sentimentos que estavam errados naquele cenário.

Humilhação.

Desamparo.

Tristeza.

Culpa.

Os três primeiros ele entendia. Mas o que inferno aquela culpa estava fazendo ali, ocupando o lugar da raiva?

Ia ser muito indelicado perguntar aquilo, mas sabia que não ia se aguentar. Retirou a grande camiseta que ela ia usar pra dormir, e encontrou três pares de pontos nas costelas. Aquilo fez seu sangue ferver.

-Perfurou os pulmões?

-Não... Foram lesões mais graves nos musculos. Se tivesse quebrado alguma coisa não teria saído do hospital...

-Por favor, para de tentar sorrir pra mim. Eu consigo ver que você está com dor. Isso machuca.

-Por que?

Agora ela havia parado de chorar e se interessado pela revolta do amigo. O Christian brincalhão de sempre parecia ter ido dar uma volta em Nárnia e deixado única e exclusivamente Revolta em seu lugar.

Terminou de cuidar dos pontos no rosto e a pequena mutilação no centro do lábio inferior. Christian queria muito devolver na mesma moeda o que haviam feito com a sua bonequinha.

-Porque parece que seu sorriso não tem valor. Para de sorrir por nada, quando não está feliz.

Foi jogar os algodões e cotonetes no lixo e lavar as mãos de novo. Antes de ir lá em baixo buscar o almoço e uma bela jarra com água e muito gelo. A raiva do baterista era tão palpável que ninguém teve coragem de perguntar qual era o problema.

Voltou para o quarto e arrumou a mesinha no canto. Quando virou para a cama, viu que ela continuava com aquele sorriso calmo, que estava lhe dando nos nervos.

Ficou sem saber o que fazer quando ela lhe estendeu os braços, como se pedisse colo.

Atendeu seja lá porque ela queria colo e aproveitou a deixa para acomodá-la à mesa. Foi buscar um copo d'água bem cheio para a loirinha. E o sorriso dela continuava ali. Almoçaram tranquilamente e ele a colocou na cama novamente, para se aceitarem e dormir um pouco. E ela continuava sorrindo. Decidiu que ia só desligar o abajur ao invés de brigar com ela. E sentiu a francesa se aconchegar em seu peito com delicadeza.

-Alguém como você sempre vai valer um sorriso, Christian.

•~☕~•

Mentiria se dissesse que havia dormido bem. Foi atormentado por vários pesadelos de violência. Cujo o alvo era sempre ela. Sua linda boneca francesa.

Mas era diferente ser acordado com cuidado de um pesadelo, do que quando acordava sozinho e de supetão.

- Chris? Mon Cher, se réveiller.-A voz chamou baixinho, enquanto ela lhe acariciava o rosto com a ponta dos dedos.-Vamos, seu grande manhoso. Hora de acordar.

Ao invés de abrir os olhos, tomou todos os cuidados do mundo ao se aconchegar contra ela.

-Não é não... Eu não preciso trabalhar hoje...

-Mas precisa jantar... Vamos, eu vou te levar no restaurante francês. Mas precisa levantar...

-Certo, vou levantar....-Se espreguiçou, beijando o rosto dela com delicadeza.-Mas você quer mesmo ir?

-Quero! Eu adoro a culinária do meu país.

Os dois se vestiram e desceram, cumprimentando os outros no Hall de entrada. Chris foi pilotando até o local, e ajudou a loirinha a descer do veículo. Escolheram uma mesa mais reservada, e ela foi quem fez os pedidos.

Acabou pegando a mão que estava sobre a mesa, e começou a brincar com os dedos longos.

-Mãos de bruxa.

-Mãos de pianista.-Corrigiu, antes de olhar no rosto da francesa. E o sorriso estava lá outra vez.-Gosta tanto assim de ser cabeça dura? Ou o prazer é só em me contrariar?

-Eu sou cabeça dura? Ainda não entendeu que eu estou sorrindo porque tem alguém que eu amo cuidando de mim, e isso acontece raramente, e eu quem sou cabeça dura?

Ele sorriu meio abismado. Antes de trazer a não perto do rosto e beijar a palma.

-Juro que nunca vou entender como ele consegue te tratar desse jeito.

-Não entende porque não é seu perfil. O do cara abusador que culpa todos ao redor pela vida de merda que tem. Você está mais pra príncipe encantado saído de uma comédia romântica bem feita dos anos noventa.

-É assim que você me vê?

-Eu e uma porcentagem significativa das suas fãs. Você é sorridente e animado. Fora essa aura de doçura. Isso faz de você um príncipe encantado.

Riu sem graça, escondendo o rosto na mão que segurava.

-Boba...

-Completamente. Convenhamos, você é apaixonante, Chris. Não pode me culpar. Nem a nenhuma das suas fãs.

Aquilo o fez sorrir, antes de ficar vermelho.

Os pratos chegaram e as caretas de Chris ao provar o que havia na mesa fazia a loirinha gargalhar. Algumas pessoas olhavam para os dois, afinal era uma cena muito interessante, já que a maioria dos outros casais estava de mau-humor, ou enfiados no celular.

Era mais peculiar ainda ao se notar os machucados no rosto e nos antebraços da mocinha.

-Nossa...-Torceu o nariz.-O que diabos é isso?

-Isso é Caviar.-A loira riu outra vez.-São ovas de peixe.

-Que nojo...-Ela pegou um pãozinho e colocou aquela coisa em cima, simplesmente enfiando na boca.-Você come como se isso fosse um Snack!

- Não era você quem queria um jantar francês? Agora vai ter que comer. E eu deveria registrar a sua careta para posteridade.

-Você não seria tão má comigo.

Mas ele mesmo pegou o celular, e viu a francesa esconder o lado esquerdo do rosto com o cabelo, antes de deitar em seu peito e ele tirar a foto. É claro que ele saiu com uma engraçada, com o casco de um escargot na boca e ela rindo. E foi essa foto que ele postou.

"As (des)vantagens de ter uma amiga gastronoma: ela te faz provar cada coisa... Mas ao menos ela ri."

E mostrou a postagem pra loira, que apenas riu mais.

-Ai, Christian. Você não existe.

•~☕~•

Era hora de voltar pra Vegas. E isso não o deixava nada feliz. Já que ela iria voltar com a moto, sozinha. E ele tinha de ir pra Vancouver.

- Não pode mesmo ir comigo até Vancouver? De lá eu prometo que voltamos direto pra Vegas. Mas não vai sozinha nessa estrada...

- Chris, o que eu vou fazer em Vancouver?

-Me levar pra comer mais coisas estranhas?

Uma rodada de risos. Os outros apenas observavam os dois, de dentro do ônibus.

-Não, eu vou pra casa. Tenho coisas pra resolver.

-Certo, você venceu...-Abraçou a loira, beijando o rosto fino.-Mas não esquece de ir me dando noticias.

-Pode deixar. Dessa vez não vou esquecer.-Mas o californiano não soltou a amiga.-Christian, eu preciso ir embora...

-Não precisa não... Fica comigo...

Ela riu, e se enterrou mais no peito do mais alto.

-E depois você diz que não vale um sorriso. Vá se catar, Christian Coma.

Um Olá em VegasOnde histórias criam vida. Descubra agora