0.7 Morango

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"Morango: devido ao seu tom encarnado e ao seu sabor intenso, simboliza sedução, erotismo, energia sexual e tentação." 

- iris -

                "Por favor não me obriguem a ir!" implorei com a melhor expressão de infelicidade que consegui arranjar. "Nem tentes mais, Iris, sabes que isto é importante para mim e eu já prometi à Karen que toda a família iria estar presente." "O Adam não vai estar presente." "O Adam está na universidade e a Karen sabe, visto que a filha dela também está na universidade e acontece que é namorada do Adam. Já chega desta conversa, vai mudar de roupa." Ri - não, gargalhei - mentalmente ao imaginar a quantidade de vezes que a pobre rapariga foi traída. Gargalhei ainda mais ao lembrar-me do meu envolvimento nessas inúmeras traições. Olhei o meu tio numa última súplica de misericórdia, mas o seu encolher de ombros traduziu perfeitamente a minha "'não-escapatória' evidente. "Posso ao menos ir vestida normalmente?" A Stacy olhou-me agressivamente, como se a minha observação fosse um insulto. "Obviamente que não. Vais vestir um vestido." Rapidamente levei a mão à cara, deslizando-a. Subi as escadas numa agonia enorme e vesti um vestido preto que a própria Stacy me havia oferecido. Eu podia perfeitamente contestar e recusar ir àquele jantar snob, mas nunca se sabe se não iria perder algum episódio hilariante entre snobs, tipo uma discussão sobre vestidos.

Dirigi-me à traseira da casa, onde estava o carro do meu tio. Ele encontrava-se já dentro do mesmo, impacientemente esperando a Stacy, que estava a acabar de pôr a última tonelada de maquilhagem e o último colar de diamantes. Assim que ela saiu de casa, os meus olhos esbugalharam: um vestido azul petróleo, extremamente curto e inacreditavemente justo e uns sapatos da mesma cor com um salto de cerca de 16 centímetros; o cabelo louro oxigenado esticado e a pele perfeitamente maquilhada. Nem o meu tio resista a abrir a boca.

A casa era enorme. Era branca e moderna; um belíssimo jardim adequadamente decorado de flores e plantinhas em volta do caminho de pedra que guiava até à majestosa porta de entrada. Um Mercedes de último modelo estava parado em frente da porta preta da garagem. O interior não se ficava nada atrás. Um extenso salão com chão de mosaico cor de tijolo escuro, com paredes cor de champanhe, dois sofás vermelhos e um enorme televisor. Duas ou três estantes estavam espalhadas pelo salão e havia uma bonita aparelhagem que transmitia música horrível. Vozes irritantes ecoavam por todo o espaço, incluindo a da Stacy e eu simplesmente me encostava a todos os cantos que encontrava, quando o meu tio era chamado pela Stacy e era forçado a deixar-me sozinha naquele mar de hipocrisia. Sim, eu era chamada pela Stacy, para ser apresentada a amigas dela, mas ela evitava ao máximo, talvez pela minha capacidade (ou falta dela) de receção àquela amostra reles de 'pessoas'.

O relógio marcava pouco passado das 20 horas. Todos fomos chamados para a enorme mesa da sala de jantar. Reparei que a Karen estava ao segredinhos com o marido com um ar muito comprometedor, gesticulando e apontando a mão para o andar de cima. O marido dela seguiu caminho até ao andar de cima (não que me importasse o que essa gente fazia, era uma cambada de gente estranha). A Karen juntou-se a todos na mesa, com um enorme sorriso e falando com os convidados que se sentavam ao seu lado. A Stacy era, obviamente um deles, visto que era uma das melhores amigas da Karen. O meu tio, por sua vez, foi forçado pela Stacy a ficar com os maridos das amigas. E eu sozinha. Bem, haviam duas ou três raparigas e um rapaz mais ou menos da minha idade, mas o facto de elas usarem tiaras e ele calças 'boca-de-sino', é o aviso perfeito para manter uma distância de segurança. Passados uns dez minutos após a sua partida, o marido da Karen regressou. Com companhia. Um rapaz, de fato, com uma cara de agonia definitivamente pior que a minha, pele pálida e cabelo roxo. Ele devia ser mais velho que eu, mas não muito. 

"Ah, Michael. Este é o meu filho, Michael. Obrigada por nos honrares com a tua presença!" Interveio a Karen. "Uhm, claro." Ele respondeu, de forma seca e sarcástica. O único lugar vago era o lugar à minha frente. Tanto escolhi para ficar com um lugar sem presenças indesejadas à minha frente, porra. Não que tivesse já algo contra o rapaz, mas a minha adorada solidão era algo que não trocava por nada.

"Bem, vamos dar início ao jantar!" 

O quão preciso de um cigarro neste momento. A comida era estranha; sinceramente, era indecifrável se era carne ou peixe. Vi o Michael olhar as travessas sem qualquer interesse e, de seguida, a olhar para mim e a fazer um olhar comprometedor e um sorriso ousado. Respondi-lhe na mesma moeda. Atirei-lhe o sorriso mais petulante que consegui, passando com a língua subtilmente pelos dentes e pelos lábios. Ele sorriu e conduziu uma garfada até à sua boca, mastigando de forma sedutora, não largando o sorriso petulante. Continuei a comer a comida desconhecida que estava no meu prato, sem desviar o olhar do Michael e vice-versa. Todos falavam animadamente, porém nós estávamos fora de qualquer conversa que pudesse cruzar o nosso caminho. Ou tentar. A certo ponto, calculada a curta distância da largura da mesa, subi a minha perna até encontrar a dele. Pela expressão na sua cara, percebi que havia acertado na sua perna. Ele olhou-me de forma provocadora e eu continuei, subindo a perna até atingir a zona que procurava. Ele tossiu levemente e passou a mão pelo cabelo, despenteando-o ainda mais do que já estava. Olhámo-nos mutuamente, enquanto o meu pé passeava pelo seu membro, e ele fechava os olhos, tentando controlar-se. Passados uns segundos, após alguma tortura, retirei o meu pé e atirei-lhe um sorriso aberto, porém petulante. Ele olhou-me de forma seduzida e levantou-se, sem pedir licenças.

"Michael?" questionou Karen, pronta a exaltar-se. "Vou só fumar um cigarro, já volto." Assim que escutei as palavras fumar um cigarro, desliguei do resto da conversa - ou melhor, da possível discussão que se estava a formar. Eu tinha que ir com ele. Levantei-me bruscamente, virando os olhares para mim. "Eu far-te-ei companhia, Michael." disse, da forma mais solene possível. "Meninos, estamos a meio do jantar." interveio novamente Karen, com uma fúria controlada, porém visível, nos olhos. "Vocês estão a meio, nós já acabamos. Não te preocupes, mãe, são só uns minutos." O Michael começou a caminhar até à porta de saída da sala de jantar e eu segui-o. Saímos pela porta principal e sentámo-nos nos três degraus exteriores. Puxei um cigarro e esperei que ele me emprestasse o seu isqueiro.

"Obrigado pelo momento que me proporcionaste ali dentro." ele disse, de olhos virados para o chão, rindo ligeiramente. "Tu é que começaste." afirmei. "Ah, mentiras! Eu não pus o pé na tua ... zona feminina..." Ri-me imenso face a sua expressão e a escolha de palavras. Ri-me tanto que me engasguei com fumo do cigarro, algo que nunca me havia acontecido. "Quem não sabe fumar, não fuma." ele disse, com uma expressão de gozo. "Vai-te foder." disse, ainda rindo. Continuamos a fumar em silêncio, soltando uma gargalhada esporadicamente. O jantar acabou por ser bem melhor do que eu esperava. 

"A engasgada já acabou o seu cigarro?" "Vai-te foder."

Entrámos e regressámos à sala de jantar, com sorrisos. Todos nos seguiam com o olhar, mas isso de esperar. Felizmente, já tinham todos acabado o prato principal e esperavam agora pela sobremesa, tal como nós. A troca de olhares continuava, porém sempre envolta no silêncio, visto que as conversas que surgiriam entre nós não seriam dignas de ser ouvidas por terceiros sem uma chamada de atenção ou olhares de julgadores. A sobremesa era, em contraste com o resto, uma delícia. Era bolo de bolacha; nunca fui grande fã, mas aquele estava divinal. O Michael parecia achar o mesmo, visto que repetiu. Não o julgo, estava uma delícia.

A hora de ir embora havia chegado. A Stacy estava a fazer as devidas despedidas, distribuindo trezentos encostos de cara; o meu tio, trezentos aperto de mão; eu, trezentos 'vamos embora'. Peguei no casaco de cabedal que havia deixado no suporte de casacos e estava prestes a sair da casa quando senti uma mão a apertar-me o braço.

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n/a: desculpem este capítulo ser assim um bocado "ranhoso" e não haver Luke, mas queria mesmo introduzir o Michael na vida da Iris e esta pareceu-me a melhor maneira. No próximo capítulo o Luke regressa yay. Votem, se gostarem, e comentem, coisas boas ou más, aceito tudo :-)

ah e obrigada!!! já passei as 1000 leituras e os 100 votos friiiiicckckkck, thank u thank u thank u

Crash // l.hOnde histórias criam vida. Descubra agora