Olívia sentiu dificuldade para abrir os olhos. Quanto tempo havia passado dormindo? Sentia que ficara uma eternidade em repouso. Sua visão estava embaçada. Aos poucos, a nitidez foi voltando à sua pupila. Ela pôde enxergar sua mãe conversando com o médico que lhe atendia há anos.
− Agora ela precisa de muito repouso. E, por favor, não deixe nenhum objeto pontiagudo por perto.
Olívia não conseguia ver muito bem, mas tinha certeza de que sua mãe estava chorando.
− Está bem, doutor. Irei tirar de perto dela qualquer coisa que represente perigo.
− Mas a senhora sabe muito bem qual é a minha orientação, dona Marta.
− Sei... – respondeu ela. – Mas jamais permitiria que minha filha fosse internada num hospital como aquele, doutor. Ela é a única coisa que me restou.
O médico se deu por vencido, despedindo-se e saindo do quarto da paciente. A mãe de Olívia permanecia lá, perdida diante de tanta angústia.
− Mamãe?
− Graças a Deus, minha filha, você acordou!
Marta caminhou em direção da cama e abraçou sua filha. Só nesse momento é que Olívia pôde perceber que sua mão estava toda enfaixada. Era possível ver uma grande mancha de sangue no tecido branco do curativo.
− O que aconteceu, Olívia? Por que você fez isso a si mesma? – A expressão de sofrimento dela era nítida.
− Mamãe... a senhora não iria acreditar se eu lhe contasse...
− Então, tente!
− Foi Rômulo, mamãe!
− Rômulo? – respondeu ela, incrédula. – Seu marido está na guerra, minha filha! E ele jamais faria isso a você!
− Ele morreu, mamãe... mas está aqui, acredite em mim!
Marta colocou as mãos em seu próprio rosto, sem saber que atitude tomar diante do que sua filha lhe dissera.
− Essas coisas não existem, Olívia, eu já disse!
− Eu sei que é difícil acreditar, mamãe, mas eu o vi! Ele precisava de minha energia vital para continuar entre nós e...
− Já chega! – gritou Norma.
Com o barulho, a bebê acordou chorando.
− Veja só! Está feliz agora? – esbravejou Olívia.
− Feliz com o que?
− Você acordou a minha filha, mamãe!
Marta parou, ficando simplesmente estática por alguns segundos. Depois, saiu do quarto de sua filha, sem dizer uma só palavra e chorando silenciosamente.
Olívia teve de respirar fundo, não apenas para se acalmar, mas também para reunir forças para sair de sua cama e tranquilizar sua bebê.
− Não chore, meu amor − disse, acariciolando a pequena.
Ao olhar para trás, Olívia viu Rômulo.
− Ela não acredita em mim, meu amor. Minha mãe deve achar que estou louca.
− Não se preocupe com isso, Olívia. O importante é que eu estou aqui para você e você está aqui para mim!
Os dois se abraçaram. A bebê parecia ter se acalmado.
− Ainda bem que você voltou, meu bem!
Rômulo sorriu. E, em seu sorriso, era possível ver uma sombra se formando.
− Parece que a sombra está voltando a lhe dominar, Rômulo.
− Sim, minha querida. Mas, dessa vez, acho melhor eu ir embora. Você já está muita fraca, não sei se aguentaria outra...
− De jeito nenhum, Rômulo. Não me perdoaria se não levasse isso até as últimas consequências – afirmou ela. – O único problema é que minha mãe levou a tesoura que usamos...
Rômulo sorriu e olhou em volta do quarto.
– Se esse é o seu desejo, meu amor, podemos dar um jeito – disse ele apontando calmamente l seu dedo para um prego solto da cama.
Olívia sorriu. Seu marido ficaria com ela por mais um tempo e isso era tudo o que ela mais desejava.
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Na cozinha, Marta tentava se consolar. Definitivamente, sua filha parecia não estar suportando tanto sofrimento. De tantos pensamentos que dominavam sua mente, ela demorou um tempo até perceber um barulho que vinha do lado de fora de sua casa.
Curiosa, Marta saiu para ver o que acontecia. Dezenas de pessoas passavam pela rua de sua casa em um ritmo apressado. Todos em passos largos e ansiosos. Ela enxugou suas lágrimas e decidiu acompanhar a multidão.
As pessoas se dirigiam para a praça central do Reino de Lume, local bastante próximo de onde Marta morava.
– O que está acontecendo aqui? – questionou ela para uma das pessoas que passavam.
– Estão dizendo que alguns soldados regressaram! – disse a mulher, com um sorriso de esperança.
Marta sentiu, naquele momento, seu coração pulsando mais forte. Caminhou rapidamente para a praça. Lá, além de uma quantidade impressionante de pessoas, pôde avistar também alguns soldados. A mãe de Olívia foi se embrenhando na multidão, costurando todo aquele enxame de pessoas, até se aproximar bastante de onde os soldados regressos se encontravam. Seus olhos percorriam o espaço atrás de uma pessoa.
– Marta? – disse uma voz – Dona Marta? É a senhora?
Ela olhou em direção de quem lhe chamara. A dono da voz era, sim, um dos soldados. O dono da voz estava com uma de suas pernas decepada. O dono da voz era seu genro.
– Rômulo! Você voltou, meu querido! – sorriu ela, aliviada.
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O Regresso da Alma
Gizem / GerilimMenção honrosa no 6º Concurso de Suspense promovido pelo perfil @SuspenseLP É noite do Dia dos Mortos no Reino de Lume. Olívia decide rezar pela alma de seu marido. Ela, porém, não sabe exatamente se Rômulo está morto ou não. Três anos após ter part...