02 - Sonhos Estranhos - Parte 01

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Alice ouvia o vento assobiando do lado de fora. Abriu seus olhos com o ressoar de um trovão. Demorou para identificar o lugar. Estava deitada sobre uma cama de madeira. O colchão estava encapado por um lençol rosa com bordas brancas. No canto, ao lado do criado-mudo, um guarda-roupa, feito da mesma madeira que a cama, estava com as portas abertas e deixava cair roupas de cama e outras peças de vestuário feminino em um tapete verde-musgo. Um armário próximo à porta exibia livros e pastas através das portas de vidro.

A escrivaninha ao lado tinha restos de uma vela já queimada e alguns papéis espalhados. Alice olhou para as paredes e viu que eram todas brancas. O assoalho era de madeira. Levantou-se e só então percebeu o que estava usando. Um vestido vermelho abaixo dos joelhos, uma fita branca estava presa à sua cintura formando um belo laço.

Seus cabelos estavam soltos e dançavam conforme ela se movimentava. Usava um sapato baixo e preto. Teve a impressão de já ter visto esse lugar antes, porém, não se lembrava de onde. Foi até uma das janelas do quarto e olhou para fora. Mulheres andavam com sombrinhas e algumas com latas na cabeça contendo alguma coisa. "Empregadas!", pensou.

Homens trajando ternos, calças longas e chapéus-coco andavam pelas ruas ladrilhadas. Ela abriu a janela. A brisa suave preencheu o quarto. Era um soprar de vento aconchegante e cálido, ao ponto de fazer Alice sentir-se leve. A garota viu seu corpo levitar pelo quarto, os móveis ao seu lado demonstraram certa agitação, mas ela não deu atenção.

Apenas deixou que aquela sensação tomasse conta dela. Após estar em pleno ar, saiu pela janela e ganhou os céus da cidade que estava logo abaixo. Alice viu que todas as casas eram grandes e parecidas, pintadas de branco e com o mesmo gênero colonial. "Onde foi que vi esse tipo de construção?" pensou. De repente um flash iluminou a mente de Alice, ao reparar nas pessoas e como estavam vestidas.

As roupas antigas que ela vira eram da Inglaterra, mas não sabia em qual cidade estava. Lembrou-se pois assistira a um documentário no History Channel, que exibira algumas culturas inglesas. Apesar de as casas não apresentarem o estilo da época. Ficou pensando sobre isso, mas aceitou o sonho como uma vontade de conhecer tal lugar.

O sol aquecia seu rosto e o vento que soprava em sua direção sacudia suas vestes. Do alto via as mais diversas formas de agricultura e o desenho das plantações lhe remetia a uma pintura de um quadro. Carruagens puxadas por cavalos chamavam a sua atenção. Seguiu seu passeio aéreo até um pequeno vilarejo ao norte. Avistou uma rua com uma fileira de casas muito humildes, todas feitas de madeira e com cobertura de palha grossa.

Ela teve uma sensação de déjà vu. Pousou na estrada de terra. As casas estavam todas fechadas, algumas não tinham porta ou janela. Outras casas estavam simplesmente destruídas. Ela foi caminhando até o fim da vila, onde se deteve por um momento.

Uma casa lhe pareceu familiar por algum motivo. Sua fachada era cercada por tábuas que agora estavam amareladas e verdes devido ao musgo que subia por elas. Havia um pequeno jardim do lado direito onde havia uma única rosa vermelha, o resto era apenas grama e capim. Uma folhagem daninha agitava-se com um animalzinho no meio dela. Alice passou pelo espaço onde deveria estar o portão. Olhando bem onde pisava viu que os dois degraus que conduziam para a casa foram arrancados. Pulou-os.

Sentiu que o assoalho era seguro, chegou até a porta, bateu duas vezes, sem resposta, abriu a porta, que não fez nenhum esforço para manter-se trancada. Observando o casebre, percebeu que já estivera ali antes. Os mesmos móveis em madeira, a mesa na cozinha coberta por pó, porém não avistara o bilhete que antes estava ali.

De repente se assustou com uma imagem que se formou à sua frente. Uma jovem de longos cabelos acinzentados estava em pé. Alice não conseguiu ver seu rosto. Vestia um longo vestido preto de seda. Estava descalça, mas seus pés não tocavam o chão, pois ela flutuava. Diante dela um homem se contorcia no chão. Era alto e tinha cabelos grisalhos, seus olhos eram verdes como esmeraldas. Escorria sangue de seu nariz e sua boca. Ele arfava.

O homem abriu a boca para dizer alguma coisa, mas a jovem fez um movimento com a mão e ele foi arremessado contra a parede ao fundo. Ela então pôs os pés no chão e foi caminhando lentamente até ele. Pôs as mãos na cintura e se curvou. Seu vestido ondulava. Alice não sentiu brisa alguma, porém seu vestido também começou a ondular. Tentou caminhar em direção à moça para tentar ver seu rosto, mas não conseguiu por alguma razão.

— Você vai me dizer onde elas estão ou eu vou ter que acabar com esse joguinho? — sua voz era fria como metal. — Só porque não posso entrar na sua mente, não quer dizer que não posso destruir esse teu corpo desprezível. — O tom arrogante com que disse isso causou arrepios em Alice.

— Você nunca vai encontrá-la. — Ele afirmou com a voz abafada, gemeu em virtude de tantos ferimentos.

— Não importa onde vocês a tenham levado. Darei a volta ao mundo se for preciso... Sou a Imperatriz e ninguém sai impune das minhas mãos. Nem mesmo os bruxos mais poderosos! — gritou fazendo as paredes e os móveis tremerem.

Alice tentou gritar para que ela parasse, mas sua voz não saiu. Viu a moça estender o braço direito e uma esfera de energia vermelha se formou sobre a palma de sua mão.

— É seu último aviso Renato. Não terá magia nesse lugar que me impeça de fazer o inevitável.

— Não Cassidy. Não direi onde elas estão e se quer me matar, vá em frente — disse Renato se pondo em pé com dificuldade. — Mas devo lhe informar... A magia nesse lugar é tão boa como a sua.

Ele estendeu o braço esquerdo, o direito estava caído ao lado de seu corpo. Alice deduziu estar quebrado. Fez um aceno e o casebre começou a se revirar. Uma luz azulada fez Cassidy cambalear para trás, mas ela recuperou-se facilmente. Ela lançou a esfera contra Renato, atingindo seu peito, fazendo-o tombar com os olhos abertos. O casebre parou de tremer. A Imperatriz abaixou-se para olhar o corpo imóvel do homem. Seus olhos demonstravam um vazio. Alice não pôde conter as lágrimas ao ver aquela cena.

— Grande tolo, isso não precisava ter acontecido. Talvez eu o deixasse viver como um de meus animais de estimação — disse Cassidy, com um estalar ela foi consumida por chamas azuladas e desapareceu no ar.

Alice se aproximou do homem. Abaixou-se junto a ele e uma forte emoção tomou conta de si. Como alguém podia ser tão cruel? O ar começou a ficar mais quente. Ela olhou para a mesa onde uma marca ficara visível. Ela levantou-se e viu que um círculo fora desenhado na mesa e sobre ele ficou um bilhete. O sinal desaparecera.

Alice viu que se tratava do mesmo bilhete que alertava sobre a Imperatriz e que estava com ela nesse momento. Ela ouviu um ranger de portas e viu alguém entrando pela porta. Não distinguiu quem poderia ser, pois estavam de capa e um capuz cobria seus rostos. Eles entraram e sussurraram algo entre si. Passaram por ela sem darem conta de sua presença.

Os dois seres se puseram defronte ao homem e estenderam as mãos. Uma luz branca iluminou o local e o corpo então desapareceu. Olharam em direção onde o bilhete estava. Sussurraram entre si novamente. Então o ar se dobrou e eles desapareceram. Sem entender nada Alice resolveu deixar aquele lugar. Abriu a porta e viu que o chão tinha desaparecido.


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Alice e o Templo ElementalOnde histórias criam vida. Descubra agora