O grito de um wyvern quase se mistura com o barulho das buzinas. Me inclino no sofá para conseguir olhar pela janela em tempo de ver o lagarto gigante girar no ar. Estreito os olhos, acompanhando seu movimento e analisando seu corpo: sem patas dianteiras e com asas que têm no mínimo o dobro do tamanho do restante do seu corpo. Um wyvern de classe real.
O que um deles está fazendo aqui?
E é óbvio que ele já está reunindo curiosos. Não preciso me levantar para ver as pessoas nas janelas do prédio de frente para o meu, todos olhando para cima. É raro ver qualquer tipo de draconídeo – os primos não tão evoluídos dos dragões – sobre os bairros altos. No máximo, o que vemos é uma mancha distante no céu quando um deles sobrevoa a região, mas eles nunca pairam sobre os prédios como esse está fazendo. E é justamente por isso que eu vim morar aqui: para ficar o mais longe possível dos lagartos.
Volto a me virar para o notebook no meu colo. Já faz quase duas horas que estou tentando achar como consertar meu celular eu mesma. Minhas reservas de dinheiro já estão acabando, então vou economizar onde puder. E, quem sabe, ainda aprendo alguma coisa que pode me render uns trocados depois, entre o pessoal do bairro. Mas depois desse tempo todo passeando de site em site, todas as explicações que achei têm o mesmo problema: parece que foram escritas em outra língua. São tantos termos técnicos que estou com o Google aberto em outra aba para decifrar essa coisa toda.
Ia ser tão mais fácil se tivessem um botão de "resetar tudo"... Mas não, eu tenho que fazer um monte de coisas e usar uns códigos que nunca vi antes. Claro que ia precisar de códigos. Justamente o que não é meu forte – e eu já não sou a melhor pessoa com eletrônicos.
Alguém grita e quase derrubo meu celular. Não. Vários "alguéns". Olho para a janela de novo. Será que o wyvern atacou alguém? Mas não, os wyverns de classe real são bem treinados demais para isso. Ele só atacaria se seu cavaleiro lhe direcionasse para um alvo específico.
Droga. O que quer que seja, não vai ser boa coisa.
Coloco o notebook na outra ponta do sofá já meio rasgado e vou até a janela, saltando uma caixa de sanduíche vazia no chão. Ainda tem pessoas gritando, mas não estou vendo nada demais. Só o wyvern, que continua dando voltas bem acima do prédio. Isso não seria motivo para gritos.
Olho para as janelas do prédio na frente do meu. Alguém podia olhar na minha direção... Um garoto se vira para mim. Levanto as mãos e depois aponto para cima.
— Caiu! — Ele grita em resposta.
Caiu? Levanto a cabeça. Alguém caiu do wyvern? Mas não, ele continua sobrevoando os prédios calmamente. Ninguém caiu. Mas não duvido que alguém tenha pulado.
O que alguém com magia, treinamento e conexões o suficiente para estar em um wyvern de classe real pode querer nos bairros altos? Aqui é quase outra cidade, a área onde os plebeus vivem, que tem esse nome por causa dos prédios altos que são o único tipo de construção por aqui. Ruas estreitas, pontes precárias e prédios superlotados. Tudo o que a nobreza odeia e que deixa os draconídeos incomodados. Perfeito para mim. Mas a questão é que os draconem não vêm aqui. Eles mandam seus servos, quando precisam de algo, ou dão ordens para que algum fornecedor dos bairros altos vá até eles.
Balanço a cabeça e volto para o sofá. Não é da minha conta. Nunca foi, nem quando eu ainda servia no castelo de Raivenera. E agora eu não faço mais parte daquele mundo.
Coço o ponto incômodo nas minhas costas enquanto conecto o celular no notebook. Isso sempre me incomoda quando me lembro dos draconem, da cidade central e... Passado. Tudo passado.
Copio os códigos estranhos que estão em um site para o bloco de notas, enquanto espero o programa reconhecer o aparelho. Se isso aqui não funcionar eu juro que vou jogar o celular na parede. Gastar meu estresse é um uso melhor que virar peso de papel.
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Marcas do Destino (Draconem 1) - Degustação
Fantasy-= Primeira versão, não revisada. A versão final tem umas tantas alterações. =- JÁ NA AMAZON: https://www.amazon.com.br/dp/B07QPCJSW9/ O mundo de Ana desabou quando sua mãe morreu de uma doença misteriosa e ela, por muito pouco, escapou de uma sente...