Witch Image

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While you sleep in earthly delight
Still your soul will suffer this plight
Like your father in hell

What you've sold you can not unsell

Witch Image, Ghost

Minha barriga dói. Enquanto a massageio com a mão amaldiçoando esse dia, minha avó o comemora. Repete com um sorriso orgulhoso que virei "mocinha". Celebra esse rito feminino assim como a Rainha que resolveu voltar do nada e por fim falar comigo ontem.

A mulher que outrora ficava no canto do meu quarto calada e imóvel, decidiu reaparecer e me fazer uma proposta antes de sumir novamente. Com seus lábios colados no meu, acariciava meu rosto enquanto ainda sobre meu corpo. 

E com anfractuosas palavras me ofereceu algo que sabe que quero.

Ela cheirava a libitina e aleivosia. Vi essas palavras num livro de escola e nunca entendi muito bem seus significados até sentir o cheiro dela ontem, enquanto estivemos corpo a corpo. Me é estranho reconhecer essas coisas apenas pelo seu cheiro cadavérico. Ainda é o mesmo de quando a via durante minha infância. Ela por completo estava a mesma. Mesmo as partes em carne viva de seu corpo demonstraram que comparadas as minhas memórias infantis, ela não envelhecera um dia em sua vida. 

Vida? Não, ela não estava viva.

Mas queria voltar a viver.

E por isso, me fez uma oferta da qual não vou recusar.

Talvez deveria. Me lembro bem que ele me dera uma ordem antes de me fazer desmaiar naquela noite. Me pergunto quantas regras que me dera eu vou ter que quebrar para trazê-lo até mim?

Estou disposta a descobrir. 

A dor em minha barriga piora quando concluo isso. A dor se chama cólica. É lânguida e estranha, me atormenta num volume baixo mas tortuoso e insistente. Tomei quatro comprimidos para apaziguá-la. Parecem funcionar, mas lentos demais para o meu gosto. 

Eu ainda tenho meu encontro de hoje com Dalessandro. Não vou faltar a ele nem se estiver sangrando por todos os buracos do meu corpo. 

Hum. 

Rio ao pensar no quanto a cena seria engraçada. 

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Eu não sou muito de reparar na lua ou no céu. Estes sempre são os mesmos, até em suas repetidas "fases". Mas aqui no Lago da Lua, posso observar com estranheza como os dois parecem um casal mancomunado que planejam te inspirar a fazer alguma merda. Estão belos demais. O tipo de beleza que te leva ao tal do romance que vejo nas novelas que assisto com vó Jacinta. 

E isso me dá um involuntário asco. 

"Você gosta dessa música?" Dalessandro pergunta do banco do motorista. 

Apenas faço que não com a cabeça; a única música que posso ouvir são as altas batidas do seu coração que só aumentam desde quando ele me buscou na estrada de barro que liga o rancho ao centro de Barrinha Bambu. Marcamos de nos encontrar lá pois eu não queria que minha avó me visse saindo com ele. 

Quando chegamos, estacionou de frente para o lago.  

Ele batuca os dedos contra o volante do carro, me olhando. Olha a escuridão a nossa volta e abre os vidros, comentando sobre o calor. Mosquitos entram com o ar, mas ainda assim ele não ergue as janelas. Eu o olho de volta. Ele parece desconfortável, tem um sorriso sem graça por debaixo daquele bigode ralo que acho absurdamente ridículo e já demonstram em sua aparência chula que estou mediante um garoto tentando aparentar ser um homem. 

HARESIS DEAOnde histórias criam vida. Descubra agora