Aviso: esse texto é cansativo. esse é o objetivo.
eu ouvi milhares e milhares e milhares de vezes a frase "eu te entendo", mas não, não entendem. não dá para entender. é simplesmente impossível conseguir entender o quão bagunçado é. não dá. não adianta dizer que entende, se continua fazendo todo o tipo de coisa que acaba comigo; que me destrói. se entendesse mesmo, não fariam nada disso. compreenderiam as falhas, os choros, os remédios, os surtos, os poemas, a exaustão, o afastamento, os gritos, os ataques, o nervosismo, a melancolia... a insanidade. tudo. mas não, não tem como. então só parem de dizer que entendem, porque nem eu entendo. eu não sei o porquê de eu ser tão ridiculamente anormal e idiota.
eu não consigo entender o porquê de eu nunca conseguir ter um relacionamento, pois eu tenho pavor de me conhecerem e depois fugirem; ou então, de não ser boa o suficiente; ou de eu nunca acreditar que alguém possa gostar de mim; ou de eu achar que vou fazer tudo errado e estragar tudo o que poderia ser extremamente importante; ou que o mundo vai explodir se eu namorar alguém. eu não entendo.
eu não entendo o porquê de eu não conseguir beijar um garoto, porque eu fico apavorada na hora; ou porque eu tenha muita expectativa nisso ao mesmo tempo que eu sei que será uma catástrofe; ou então eu acho que farei tudo errado e ele vai rir da minha cara. é vergonhoso admitir, mas eu não entendo o porquê desses sentimentos.
eu não entendo o porque de eu nunca acreditar que as pessoas ao meu redor não gostarem mesmo de mim, pois eu acho que elas têm pena. tanta pena, que é mais fácil fingir que gostam desse caos exaustivo que eu sou; ou porque estão tão mal consigo mesmas, que uma forma de se sentirem melhor, é fazendo caridade com uma alma perdida e capenga, não deixando-as sozinha. eu não entendo isso.
eu não entendo o porquê de eu sentir tanta pena de mim mesma, pois eu não sou capaz de achar que algo vai dar certo para mim em hipótese alguma pelo simples fato de eu ser deplorável e extremamente exaustiva.
eu não entendo o porquê de eu não conseguir pegar o ônibus sem pensar em duzentas forma de fugir se ele bater, ou for assaltado, ou capotar, ou eu passar vergonha, ou alguém sentar ao meu lado e mexer comigo, ou eu passar do ponto, ou ele seguir um caminho diferente ou o sol engolir a terra. eu não entendo o porquê de pensar nas formas de escapar do ônibus, da sala de aula, do trabalho, do meu quarto, do metrô, da rua, das pessoas... de mim. porque sempre parece que tem uma ameaça em vista. sempre parece que algo está a postos para me fazer sentir mal, mas eu preciso estar a frente dela e isso me sufoca. esse talvez, porque eu nunca tenho certeza se há uma ameaça ou se tudo isso é só coisa da minha cabeça barulhenta.
eu não entendo o porquê de ter de tomar remédios, pois a médica acha que eu estou depressiva; ou então ela acha que tem algo de errado; ou talvez tenha algo de errado; ou talvez nem tenha algo de errado e tudo isso seja inventado pela minha mente; ou talvez esteja tudo absolutamente errado. eu não entendo.
eu não entendo o porquê de eu nunca dizer o que eu sinto quando eu sinto, pois eu sinto meu corpo inteiro entrar em combustão com a ideia de algo ameaçar dar certo pela primeira vez. se der errado, é só chorar e partir para a próxima, mas e se der certo? e se só parecer que vai dar certo? e se for um errado disfarçado de certo? e se for tudo um erro? provavelmente é tudo um erro.
eu não entendo o porquê de eu nunca conseguir ir para uma festa sem desistir antes, pois eu preciso estar bonita o suficiente e preciso garantir que nada vai dar errado no caminho, na festa ou na volta e que tudo vai ficar bem. mas eu preciso explicar isso para a minha mente e ela não entende, então busca defeitos no mínimo e probabilidades de desastres, o que me leva a chorar. chorar feito uma criança por nada. por achar que tudo vai dar errado. e aí um buraco se abre no meu peito e eu sinto que vou morrer, já que não consigo respirar e nem parar de tremer. tudo milimetricamente calculado para me fazer ligar para os meus amigos e dizer que não vou e não estou me sentindo bem. eles passam a não me chamar mais para ir, já que eu nunca vou e eu acho que eles não gostam da minha presença. talvez eles não gostem mesmo. nem eu gosto.
eu não entendo o porquê de eu olhar meu corpo no espelho e achar que todo e qualquer corpo de qualquer ser humano existente é absurdamente lindo e o meu é o pior possível. talvez ele realmente seja horrível, nojento e asqueroso; talvez seja só coisa da minha cabeça; ou talvez não seja. e se ele realmente for como eue enxergo? eu nunca mais quero que vejam meu rosto e o meu corpo. nada em mim. como alguém gostaria disso? eu não sei.
eu não consigo entender o porquê de qualquer coisa. qualquer pequena coisa me fazer pensar que as pessoas estão chateadas comigo, pois em mim, carrego toda a culpa do mundo. como se a culpa das guerras mundiais, do aquecimento global, da fome no mundo, da crueldade e tudo o que é de ruim fosse minha. e aí eu penso que se as pessoas passam dez minutos sem falar comigo ou se falam muito comigo, eu fiz alguma coisa errada. qual é a porra do meu problema? por que eu sempre acho que fiz algo de errado, quando geralmente nunca nem faço nada?
eu não entendo o porquê de, ao final do dia, eu me despedir dos meus amigos e revisar tudo o que fiz e disse para ter certeza de que nada foi dito e feito de uma forma ruim que os machucasse, pois eu tenho ciência de que sou tóxica; eu só quero ter certeza de que não fui o ser humano cruel que eu sou aqui dentro... não com eles. então eu passo horas revisando tudo, mesmo com a memória debilitada, e sempre acho que fiz algo. e peço desculpas. por nada. ou por tudo.eu realmente não entendo o porquê de tudo o que eu faço... ou melhor: que eu não faço, gira ao redor de infinitos talvez. eu queria, por um instante, viver de verdade. fazer tudo o que eu quero fazer sem pensar milhões de vezes antes. não entregar um trabalho quando estiver cansada por ter feito outros trinta; não me importar com o que dizem de mim; ser imprudente por um instante sequer; tomar as rédeas da minha vida e não me deixar ser trancada dentro de uma gaiola, cantando poesia, mas ninguém realmente fica para ouvir. a vida vai passando e eu só fico parada, dentro do quarto; presa dentro de mim. eu deixo amores escaparem, amizades partirem, oportunidades irem embora, tudo desaparecer bem na minha frente. e eu não faço nada. eu sento. eu choro. eu escrevo. mas eu os deixo ir embora ou só ouço os seus "eu entendo", mesmo que não entendam. é impossível entender e tudo bem. é a minha tortura, minha forma de inferno, pois, afinal, eu já estou morta, de qualquer jeito. não há como mudar isso, eu acho. não consigo falar sobre isso e gritar o quão errada a minha mente está. não consigo. minha vida é só esse inferno de nunca viver.
e se pareceu exaustivo ler isso, imagine viver isso. ou viver perto disso.
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Acho que isso foi só mais um desabafo daqueles extremamente aliviantes. Eu me sinto um pouco melhor por colocar isso para fora, para ser sincera. É assim que vivo.
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insanidade.
Poetrytodo esse tempo se passou e eu ainda não sei se é carência ou se é mesmo amor. 2017 | @lenallier Por Lena Allier.