C A P I T U L O 1 2

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No momento em que percebi a necessidade que tinha de dar início aos meus planos, desfiz do abraço de Luke e Jack imediatamente e levantei-me do chão, encontrando forças na mágoa e na raiva que sentia. Policiais interrogavam e faziam de conta que se importavam com o que havia acontecido ali, mas eu sabia que logo ninguém se lembraria de um pobre velho sem história alguma para contar, pelo menos a eles. Era em Earl que encontrei refúgio por todos estes anos. Sua amizade de longa data com toda a minha família fizera de mim sua grande aliada, logo, amiga e companheira de copo. O senhor possuía a mente mais evoluída que tive a oportunidade de conhecer e presenciar de perto, e vê-lo revestido por uma mísera lona me deu tantos motivos para causar um desastre que precisei sair de perto de toda a movimentação.

- Onde pensa que está indo? - Luke logo veio atrás de mim, e precisei esconder a vontade de sair correndo dali o mais rápido possível, apenas me virando para o rapaz sem dizer uma palavra. - Seja lá pra onde está indo, vou atrás. Não te deixarei sozinha em um momento como este, Callie. - Havia compreensão em seu olhar. A compreensão de alguém que possivelmente já sentira a mesma dor que eu sentia naquele momento, e quando estendeu sua mão para mim, não pensei duas vezes antes de aceitar seu aconchego e seus cuidados, deixando-o me guiar para qualquer lugar que houvesse em mente.

- Me tire daqui. - Peço-o em um tom de voz baixo, implorando para que de alguma forma fizesse os últimos momentos escaparem de minha mente. - Por favor. - E assim ele o fez, guiando-me até sua casa que localizava-se mais perto do que eu imaginava. A caminhada fora curta e agitada, pois o barulho que fazia em minha cabeça era equivalente a uma Guerra Mundial que destruía lentamente cada país dentro de mim.

Tive tempo para pensar na gratidão que sentia por Luke naquele momento de minha vida, afinal, mal conhecia o rapaz e não sabia fatores relevantes de sua vida, nem ele da minha. Ele havia me oferecido suporte em uma dor que não conhecia, em uma causa que não possuía mínima obrigação de apoiar. E deitada em sua cama, com a cabeça em seu travesseiro e aspirando o seu cheiro, com seus braços ao meu redor, pude chorar todas as lágrimas que me restavam.

- Luke? - Chamei-o após horas ali, aproveitando o conforto do silêncio e a delicadeza de suas mãos em meu cabelo.

- Sim? - Luke responde após alguns segundos, sem cessar o carinho e o aconchego que me oferecia. Sem pensar duas vezes, solto as únicas palavras que poderiam classificar com exatidão o que eu estava prestes a fazer.

- Preciso matá-lo. Sabe disso, não sabe? - Apoio minha cabeça em uma de minhas mãos e tomo coragem para olhar Luke, que para minha surpresa, parecia perfeitamente tranquilo e conformado com o que acabara de ouvir. Em seu olhar havia compreensão, e eu sabia que no fundo ele me dava razão para a decisão que havia tomado.

- Sei disso desde o momento que entrou aqui, Callie. - Ele acaricia meu queixo sem quebrar o olhar, desviando apenas para observar minha boca, que naquele momento, parecia convidativa demais para ele. - O que pretende fazer? - Seu foco volta para meus olhos de maneira intensa, e quase me esqueço de minha fala quando me pego viajando no azul intenso de seu olhar.

- Serei meticulosa. - Sento em sua cama, abraçando seu travesseiro em seguida e olhando para um ponto fixo de seu quarto. - Não posso simplesmente matá-lo sem antes ter um plano, é estupidez.

- Se me permitir saber a participação deste homem em sua vida, - ele fala segurando minha mão, atraindo minha atenção para si -, posso ajudá-la, posso ir com você. - A ideia de Luke embarcando em uma jornada cheia de sangue em vingança ao meu lado fizera-me rir inesperadamente, arrancando do rapaz um olhar repleto de confusão e indignação. - O que é tão engraçado?

- A graça é que, vou sozinha. - Levanto de sua cama, ajeitando meu cabelo e andando apressadamente até o banheiro. Senti que aquela seria uma longa conversa quando ouvi Luke me seguir. Logo, apoio-me na pia e o olho através do espelho. - É uma briga minha. Não pode arriscar sua vida com isso. É loucura. - Espero sua compreensão ao explicar-me, mas não é o que recebo. Luke cruza os braços e para no batente da porta, balançando sua cabeça em desaprovação.

- Não sei se notou, mas não tenho nada a perder. - Ele finalmente aproxima-se de mim, depositando suas duas mãos em meus quadris. A conversa passara a ser perigosa demais quando Luke começou a liberar suas palavras tão perto de meu ouvido, e aquele arrepio que senti me incomodava de uma maneira agradável. - Não sei no que está metida ou no que está prestes a se meter. Nem mesmo lhe conheço bem, mas sei que é uma desajustada e está perdida. Tão perdida quanto eu. - Ele usa uma força necessária para virar-me de frente, sem tirar suas mãos de minha cintura e quebrar a proximidade entre nós. Estávamos cada vez mais próximos naquele momento, e pude sentir que nossos corpos estavam prestes a colidir. - Earl era meu amigo também, Callie. - Não tinha aquele conhecimento até aquele instante, e pude notar pela primeira vez no dia a mágoa que Luke também sentia em relação aos acontecimentos recentes. - Quero fazer justiça a ele, e se for preciso, te ajudarei a fazer justiça por você. - Sua mão cai em meu queixo, segurando-o rente a seu rosto e nossos lábios estavam próximos demais.

- Então saiba que está prestes a se meter na maior confusão de sua vida, pois causarei um grande caos e não há nada que vá me fazer recuar. - Deposito um delicado beijo no canto de sua boca e quebro a proximidade entre nós, sabendo que qualquer envolvimento sentimental seria crucial para a grande ruína de meus planos.

Duas mentes quebradas serviam com mais eficácia do que somente uma, e a vantagem estava pendendo para meu lado naquele momento. Contaria a Luke tudo o que precisava saber para seguir a jornada ao meu lado, e não o impediria se cogitasse ir embora. Ainda pensava em minha mãe, em como sua saúde mental fora desestabilizada por Billy, em como nossa relação fora jogada no fogo por sua causa. Pensava em Earl, em como havia morrido para proteger minha dignidade e meu passado, em como fora apunhalado e desonrado em seu próprio território. Por fim, pensava em mim. Na criança que abandonei no passado e não lhe dera a necessária atenção e justiça, que ainda chorava por ajuda e se trancara em uma sala escura, onde a felicidade e o sossego não entrariam mais. Agora precisaria pensar em Luke, mas um pensamento a mais ou um pensamento a menos não fariam a mínima diferença, e sua ajuda e suporte seriam de grande necessidade para mim.

Blood Hands (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora