Capítulo I - A morte de Edith Abbot

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Mrs. Abbot estava muito doente, corriam rumores por toda Londres que já estava morta porém a família estava encobrindo sua morte por status. Entretanto, os rumores se tornaram verídicos e a traiçoeira  morte bateu na porta dos Abbot.
— Oh! Edith? Edith! Não pode ser, você não pode ter me deixado, o que será de minha miserável vida sem você ao meu lado? Oh! Mrs. Coldwell, venha rápido! Rápido!

Mrs. Coldwell já podia imaginar o que seria, e quando chegou nos aposentos, se deparou com a imagem de sua irmã pálida, deitada em sua cama, porém, tinha uma expressão facial de paz, colocou a mão em seu pulso e não pôde sentir nada. Havia chegado a hora de Edith.

— Oh, Mr. Abbot, temo dizer que ela já se foi, mas ao menos descansou. Minha querida irmã... Graças ao Senhor seu sofrimento passou. Ah, a dor será nossa que ficaremos na terra e sentiremos sua falta. — Se debruçou sob o corpo da recém falecida irmã, e cobriu seu rosto com um véu que estava ao lado da cama, colocando por cima um crucifixo. — Me preocupa como Victoria irá reagir, pobre menina, uma vida tão longa pela frente e não terá a oportunidade de ver sua mãe a olhar entrando na igreja, nem de acompanhar os seus filhos e vê-la bordar meias! Trágico acontecimento meu cunhado, apesar de ser já esperado não imaginava que Edith iria nos deixar assim, tão de repente! — Completou Mrs. Coldwell com um olhar aéreo e molhado. Mas Mr. Abbot não a ouvia, estava concentrado em suas próprias lamentações, ó Senhor, só Ele poderia entender sua dor alí, que crueldade com seu pobre coração, que castigo. Estava sozinho e sentia-se abençoado por Deus não ter levado Edith Abbot quando sua filha ainda estava crescendo, sua única filha, o que faria agora?


***

Após um mês do falecimento de Mrs. Abbot, Mrs. Coldwell já havia voltado para sua casa em Derbyshire com sua família e deixado Hackney Street.
Mr. Abbot estava abalado demais para tomar qualquer decisão, e Victoria, sua primogênita e única filha, sofria com intensidade, todavia, era obrigada a se manter firme para cuidar do que sua mãe havia deixado, o que não era muito, mas seu pai não tinha condições de fazer tal papel. Pobre papai! passava o dia em seu escritório e saía apenas para o desjejum da manhã e da noite, comia em pouca quantidade e evitava conversas em maior parte do tempo. Apesar de ter que se manter forte, em seus momentos privados, Victoria não conseguia segurar as lágrimas, mesmo quando precisava falar sobre algum assunto sério estava completamente deprimida, sua mãe passou toda sua adolescência extremamente doente, logo, tinha convicção que estava preparada para sua ida em qualquer momento, mas não estava realmente pronta para dor tamanha. O velório de Edith Abbot foi simples e com poucos convidados, presentes apenas Mr. e Mrs. Coldwell com as crianças, sua criada de confiança, Fizzy, que chorava copiosamente sob o caixão, e Mr. e Ms. Abbot.
Hackney Street estava mais melancólica que o usual, as manhãs frias eram mais frias e a névoa prateada preenchia todo o lugar, da tarde para o anoitecer a residência londrina tomava um semblante sombrio das ventanias de setembro. Apesar de o ocorrido com sua esposa ter o desestabilizado, Mr. Abbot não podia parar seus negócios em sua fábrica em Manchester. Victoria o acompanhava maior parte do tempo enquanto trabalhava, e podia notar os óculos arredondados de seu pai sustentados em seu nariz pontudo ficarem embaçados por lágrimas que caíam constantemente até mesmo sob as correspondências que ele lia ou respondia, o luto havia sugado toda a esperança e vivacidade que o homem de meia idade ainda tinha. Era grato por uma filha jovem que preferia ficar com ele a comparecer em festas e organizar chás, sabia que Victoria era uma moça de muitos amigos, mas estava magoada demais para ir para qualquer canto ou conversar com qualquer pessoa, apenas quando era necessário. Seu pai estava dependendo dela naquele período conturbado de sua vida, ah! como sentia falta dos conselhos sábios de sua mãe, e esses pensamentos fermentavam em sua mente até a noite, quando poderia dar vazão ao choro.
Victoria já havia tido muitos pretendentes durante a vida, era uma das senhoritas mais disputadas de Londres, seu pai dizia que era apenas pela fortuna, mas não deixava de reafirmar a beleza dos cabelos castanho-escuro ondulados de sua menina que ficavam presos em um coque maior parte do tempo com apenas algumas mechas que fugiam e não se destacavam na musselina de cor preta dos vestidos, utilizada no momento pelo luto, sempre acompanhados de xales de renda da mesma cor que se sobrepunham nos seus ombros, A velha Fizzy dizia que ela estava parecendo uma verdadeira viúva, e esses comentários eram as únicas coisas que arrancavam sorrisos da jovem. Sua pele tinha um tom bege mas não rosado, sim um tom amarelado com tendências para a cor parda, herança de sua mãe que era de família de origem hispânica.
Quando estava no escritório acompanhando seu pai, frequentemente notava que ele a encarava com seus brilhantes olhos azuis que refletiam as lágrimas, dizia que ela o lembrava de sua mãe quando jovem, e sorria levemente. Aquela época estava sendo fúnebre e deprimente, os dois sentiam que aquele pesar ia persistir para sempre nos ares de Hackney Street. Falavam pouco por não terem o que falar, o pai e a filha apenas haviam concluído que precisavam um do outro, e cuidar um do outro, eram os únicos capazes de se consolar mutuamente, e para a jovem Victoria sentia satisfação apenas ao ver o pai na mesa do desjejum toda manhã, mesmo que o pobre senhor parecesse perdido.
— Querida, Ms. Ruby Langton enviou uma carta para você, acredito que seja dizendo que sente muito pela sua perda e que tenha as mais sinceras condolências dela para você. — Mr. Abbot fez o comentário assim que Victoria chegou na sala de desjejum. A menina pediu a benção do pai e sentou à mesa, o homem voltou a ler o jornal londrino e tomar o seu chá após entregar a carta para a senhorita, que a abriu com empolgação, doce Ruby! O que será que havia no conteúdo da carta? Há tanto tempo que não a correspondia.

" Cara Ms. Abbot,
Envio-lhe esta carta para mandar minhas condolências para a senhorita, imagino que esteja passando por um momento turbulento em sua vida, eu e minha família estamos de luto pela adorável Mrs. Abbot, que descanse em paz junto dos anjos.
Com carinho, Ms.Ruby Langton"

Victoria leu a carta em voz alta para o pai e ele tinha uma expressão de aborrecimento, a jovem fechou o cartão e colocou de volta no envelope que antes a envolvia.

— Eu lhe disse Victoria, sempre as mesmas cartas dos seus amigos, as palavras são sempre as mesmas e todas emanam a mesma energia, oh Senhor, não recuso as bençãos dessas pessoas em nossas vidas mas digo que me aborreço com esses acontecimentos. — Falava com os olhos concentrados em cada notícia do jornal que cobria seu rosto, levava a xícara de chá até a boca sempre que achava necessário.

— O senhor tem razão papai, mas o que mais fariam? O pior seria se ignorassem a nosso luto, temos amigos gentis. — Porém, Victoria entendia o que seu pai havia dito, nenhuma dessas palavras rebuscadas tinham algum efeito além de uma ligeira gratidão, era uma tentativa falha de prestar consolo de todos ao seu redor, aquelas correspondências faziam com que o Mr. Abbot se sentisse fraco, como se toda a cidade estivesse sentindo pena de sua situação. Talvez o problema estivesse na cidade, não nele.

— Filha, estive pensando em meus momentos solitários e não suporto guardar minhas reflexões para mim mesmo, você sabe muito bem que não. — Deu um suspiro profundo e seus olhos azulados entraram em conflito com o olhar cor de mel de sua filha que estava confuso. — Tomei a decisão definitiva (Então sem contestações, por favor) que nós iremos para Manchester. A única coisa que me prendia aqui era a saúde de sua mãe que poderia ser prejudicada pela fumaça das fábricas, mas o ar de Londres já foi mortal pra ela, será muito mais fácil para mim manter os negócios lá, eu vou poder ter controle da fábrica pessoalmente e finalmente tirar o peso das costas dos meus sócios. — Victoria se segurou para manter os modos e não cuspir o chá que estava bebendo, mas ficou completamente em choque. Deveria, de fato, argumentar sobre essa decisão precipitada de seu pai, ela tinha amigos e uma vida social construída em Londres não faria sentido deixá-la. Apenas o espectro sentimental de sua mãe que os atormentava desde o momento de sua ida.

— Papai, não pode simplesmente abandonar Londres! Temos amigos aqui, uma vida social e Fizzy, eu iria me sentir muito mal se tivesse que deixar a velha Fizzy e todos os meus amigos, onde em Manchester eu terei companhias agradáveis quando aquela cidade empoeirada só tem operários? — Retrucou Victoria, e olhou para o pai ansiando uma resposta,

— Eu disse, sem contestações, Vicky. E sobre Fizzy, se for do desejo dela eu tenho dinheiro suficiente para mantê-la em Manchester, mas claro se ela aceitar. Partiremos em duas semanas, e com certeza ira conhecer damas e cavalheiros interessantes em Manchester, docinho.

Victoria | Completo Onde histórias criam vida. Descubra agora