Capítulo IV - Operários

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Após uma semana na cidade, Victoria poderia afirmar com clareza que seriam as semanas mais miseráveis de sua vida. Tal semana que havia começado tão bem que acreditava que seria o início de uma boa era, porém nos dias seguintes foi surpreendida por ondas de tédio perturbadoras, houveram poucas visitas, menos do que esperavam. Contaram com a presença de Mr. George Deighton mais uma vez e outras visitas de sócios para tratarem de negócios pessoalmente com Mr. Abbot. Nada que a divertisse. As tardes eram especificamente melancólicas. Não tinha ninguém para conversar. Seu pai quando pôde conversar com ela propôs uma visita até Sloane Deighton, mas a filha justificou que a menina era muito criança para as duas se entenderem, mais de 10 anos de diferença, oras!
Portanto, teria que visitar a casa dos Deighton mais cedo ou mais tarde com seu pai para algum jantar, sempre ouvia Mr. Abbot exclamar que George sempre insistia na visita, o que a aborrecia.
No momento tricotava um xale para sua tia, que em algum dia com certeza os visitaria em Manchester, ao menos esperava que sim. A atividade iniciou a lhe causar extremo desinteresse e decidiu ir para fora de casa visitar a cidade por si só. Ainda era tarde e o sol ainda iluminava as ruas, porém de uma maneira sutil o suficiente para não causar nenhum dano a pele. Os operários da fábrica de Hudson já estavam saindo de seus postos, tais operários pareciam mais felizes do que o usual. A brisa de inverno já atacava o rosto de Victoria e deixava suas bochechas avermelhadas. Os trabalhadores passaram em montes, adolescentes jogando bolas de neve um nos outros e dando risadas em alto volume, pais com suas filhas e esposas já velhas com estado doente. Uma mulher lhe chamou atenção, levava dois meninos de mãos dadas que acreditava serem irmãos gêmeos idênticos, com a cabeça baixa e cabelo desengonçado com roupas de algodão. Era uma situação curiosa, apenas não entendia o porquê. Distraída com a moça acabou tropeçando no pé de alguém que passava apressadamente, e logo caiu no chão como fruta madura, juntamente de seus pertences. Pelo canto dos olhos pôde ver uma sombra se aproximar enquanto juntava o mais rápido possível as coisas que estavam alí.

- Quer ajuda? - Disse uma voz masculina ríspida em sua direção. Olhou para cima e viu a figura de um homem com cabelos pretos com fios esbranquiçados, uma boina, um corpo alto e relativamente forte para magro.

- Sim, por favor, senhor. - O Homem se abaixou e recolheu o resto dos objetos a entregando rapidamente. Após realizar a ação se preparou para sair de cena e voltar a sua vida miserável comum. As pessoas em sua volta observavam e alguns gritavam "Pigeon está ajudando a burguesa!!"

- Oh, não vá antes que eu lhe agradeça de alguma forma, como posso ajudar? Aceita xelins ou alguma cesta com frutas? - A moça passava a mão no tecido de seda do vestido pesado que utilizava.

- Não madame, não aceito. Passar bem, não preciso de sua ajuda. - Fez um gesto com a boina ao mesmo tempo que utilizava as duas mãos para mantê-la firme em sua cabeça e levou um cigarro que tinha no bolso até a boca, desta vez realmente saindo de cena.

Aquele ocorrido ficou martelando a mente de Victoria pelo restante do dia, enquanto caminhava até sua casa lembrou que nunca tinha antes falado diretamente com algum operário, percebeu que todos não tinham muitos modos, mas pelo menos aquilo entendia o porquê, naquele momento entendeu. Chegou em casa pela tardinha, enquanto Fizzy preparava o desjejum noturno com Susan, a criada novata que Fizzy escolhera para facilitar seu trabalho e a auxiliar. Percebia que Fizzy também não estava nada satisfeita com qualquer elemento daquele local, logo, quando elas se encontravam não mediam esforços para falarem de todos os defeitos que encontravam naquela cidade. Naquela noite a família Deighton iria para a casa deles no jantar, então, seu pai recomendou que trocasse de vestido pois o seu estava com cheiro de fuligem.

A tardinha se transformou em noite enquanto Victoria descia as escadas para organizar a mesa para o jantar com Susan e Fizzy, a casa era enorme, tinham móveis dos mais caros e artefatos raros e antigos por toda parte, utilizava um vestido de linho pérola com detalhes em seda e em renda. O coque tradicional com os pequenos cachos propositais que caíam sob a parte frontal do rosto, se dirigiu até a lareira e com fósforos acendeu a lenha e viu o fogo subir e refletir na íris de seu olhar. Seu pai nesses últimos dias não saía do escritório da fábrica em momentos que a casa estava vazia, apenas voltava pela tardinha quando os operários eram liberados. Chegou mais cedo naquele dia com receio de que as visitas chegassem e não o visse, foi recebido por um abraço caloroso de sua filha, e lhe deu um beijo na testa.

Victoria | Completo Onde histórias criam vida. Descubra agora