1. Sonho

261 44 104
                                    

"O sonho martelava a minha cabeça, queria fazê-lo parar. Entretanto, questiono a minha audácia de querer parar um sonho sob o qual não possuo controle."

Guinski andava pelas ruas à noite, tinha acabado de chover. Fumava um cigarro enquanto voltava para a sua casa alugada na Rua 27. Havia pouca iluminação naquela parte da cidade, a parte antiga. As casas eram amontoadas, pequenas e possuíam um estilo do século 19, algumas luzes estavam acesas e quando Guinski espiava pelas janelas todo o charme de viagem no tempo desaparecia. Ele via televisões, videogames e muita tecnologia.

Guinski gostava de sua nova casa, era pequena e discreta, ficava no fim da esquina e isolada dos grandes centros da cidade. Ele não podia reclamar de sua nova vida no Brasil, fez tudo o que podia para fugir de seus problemas nos Estados Unidos, apenas queria um pouco de paz.

Ele ficou de frente para a porta de sua casa, jogou o cigarro no chão, pegou a chave e entrou. Tinha um cheiro reconfortante, no entanto por mais que tentasse Guinski nunca achava um lugar para chamar de lar. Tirou seu casaco e o jogou no sofá, subiu as escadas e foi direto para o seu quarto acender a luz.

Preparou-se para dormir colocando seu pijama azul listrado. Guinski apagou a luz e deixou o luar penetrar seus aposentos, enquanto se deitava pensou ter visto uma silhueta do lado de fora de sua janela. Era um homem encostado em um poste de luz encarando a janela. Guinski ficou apreensivo e quando decidiu olhar mais de perto não havia mais ninguém lá, não conseguiu distinguir as feições do estranho mas sabia que ele tinha cabelos ondulados curtos.

Precavendo-se Guinski foi checar as trancas da porta de entrada e verificar se todas as janelas da casa estavam fechadas. Ele ficou acordado um pouco mais aquela noite, não conseguiu se decidir sobre o que fazer com o estranho, não sabia se era mais uma de suas paranoias de perseguição mas depois de Jacksonville Guinski jamais seria o mesmo.

Quando finalmente caiu no sono veio aquele sonho novamente...

Ele corria por uma floresta perdido com sons ensurdecedores por todos os lados, não foi capaz de discernir nada naquela confusão só sabia que tinha que correr mas por que estava correndo? Disso nem ele sabia, tinha algo a ver com um... como era mesmo? Seu corpo enquanto dormia se remexia intensamente na cama, o lençol e as cobertas estavam no chão e ele se debatia com o seu travesseiro. No sonho via um homem, um que deveria supostamente proteger, afinal toda vez em que Guinski sentia a presença dele vinha um sentimento de urgência e devoção, ele corria pela floresta junto com Guinski mas estava muito atrás. Dizia para fugir para as Pedras, dava direções para que ele não saísse do caminho.

Guinski acordou às quatro horas da manhã suando frio e agarrando seu travesseiro como se fosse um bichinho de pelúcia. Foi ao banheiro para vomitar, seu estômago estremecia.

Era o mesmo sonho desde que tinha 16 anos. O único que se repetia. É claro que ele tinha outros mas estes eram apenas variações do primeiro, via o homem que deveria proteger se transformar repentinamente em uma mulher, que também deveria proteger. Uma flor vermelha brilhando na escuridão. Guinski poderia ser considerado um maluco se contasse tudo o que já sonhou à alguém.

Ele se levantou e a primeira coisa que fez foi arrumar sua cama com panos novos, depois seguiu para o banheiro onde escovou os dentes e tomou um banho demorado. Se trocou e após sair do banheiro pegou seu celular e viu que seu ex-marido Robert tinha deixado várias mensagens do tipo: "Onde você está?" "Você sumiu, o que foi que aconteceu?". Falar com Robert era a última coisa de que Guinski precisava. Sua vida já estava bem ruim sem Robert para encher o saco.

Decidiu ficar na sala de estar e ligar a televisão para que houvesse algum barulho na casa. Enquanto fingia que a via o noticiário quebrou seu telefone e anotou mentalmente que deveria comprar outro após sair do trabalho.

Livro Negro: Antes da TempestadeOnde histórias criam vida. Descubra agora