Capítulo Seis

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O caminhão da transportadora chegou quinze minutos atrasado, tempo o suficiente para o sentimento de ansiedade tomar conta de mim. Afinal, era o primeiro passo altruísta que cometia sem que envolvesse os meus pais. Logicamente que eles ficaram surpresos com minha decisão tão repentina e de certa forma, os compreendia, pois me sentia da mesma maneira. Mas apesar disso, não deixaram de ficar felizes por minha escolha, por saberem que aquilo era algo que aconteceria mais cedo ou mais tarde. Acredito que a única pessoa que se manteve radiante desde o nosso acordo, foi Ana. Isso porque desde o dia em que conversamos, ela organizou seu apartamento para a minha chegada, tanto para eu não mudar de ideia até a data da mudança quanto por estar animada de morarmos juntos. Segundo ela, seríamos duas amigas curtindo pra valer – embora eu achasse isso um tanto preocupante, levando em consideração que o curtindo dela é bem diferente do meu.

Depois que os rapazes da transportadora colocaram todas as caixas e móveis dentro da carreta, fiquei admirando a cena com uma pontada de orgulho, ainda sem acreditar no que estava acontecendo.

— Sentirei saudades – minha mãe parou ao meu lado e embora esboçasse um sorriso, sabia o quanto estava chateada por, de certa forma, me perder.

— A senhora fala como se eu fosse desaparecer, dona Goretti – brinquei, dando-lhe um abraço caloroso. — Prometo visitar vocês sempre que puder!

— Espero mesmo – se afastou de mim e só nesta hora notei que estava quase chorando. — Porque se não, te tratei para casa pela orelha.

— E eu vou ajudar – meu pai comentou. E percebendo que mamãe estava prestes a desabar, pegou a mão dela carinhosamente e começou a acaricia-la. — Agora vá, antes que a gente não deixe você ir.

— Está bem... Está bem... – sorri, embora quisesse seguir os passos da minha mãe de chorar feito uma criança. Antes de partir, me despedi dando um beijo neles.

Assim que entrei no caminhão e coloquei o cinto de segurança, fiquei acenando para aqueles dois seres que transbordavam amor com frases, como:

"— Ligue assim que chegar."

"— Escove os dentes antes de dormir."

"— Nos ligue se precisar de alguma coisa."

Coisas de pais, mas que aqueceram meu coração de uma maneira inexplicável, pois sabia que não importava onde estivesse eles sempre estariam ao meu lado.

Depois do caminhão arrancar, respirei fundo e ri sozinha, pois de fato o projeto nova Juliana estava seguindo seu curso. E por alguns instantes, agradeci ao universo por ter me feito abrir a cabeça, mesmo que para isso acontecer, Felipe tivesse que dar um basta no nosso relacionamento – mesmo que na hora eu só quisesse sumir.

Enquanto seguíamos até meu novo endereço, mandei uma mensagem de texto a Ana avisando que estávamos próximos para facilitar as coisas na hora do caminhão passar na portaria. O que ajudou muito, pois assim que chegamos no prédio, bastou estacionar próximo ao bloco onde fica o apartamento para que começássemos a mudança de fato. Para agilizar, Ana e eu ajudamos levando algumas caixas para cima, mas só porque não nos aguentávamos de animação, era como se tivéssemos voltado a adolescência, só que sem as espinhas. Depois de me certificar de que todos os meus bens e móveis estavam dentro do quarto novo, pagamos os rapazes da transportadora e nos jogamos no sofá, completamente exaustas. Um esgotamento diferente de qualquer outro que já senti, pois esse envolvia além do cansaço físico, o sentimento de felicidade, de ânimo e de dever cumprido.

— Eu preciso de férias.

— E eu preciso comer alguma coisa.

— E se nós fôssemos comer fora? – Ana comentou, mudando totalmente de semblante. Como se só de pensar em sair, sua fadiga desaparecesse. — Daí aproveitamos para comemorar a sua chegada e... – a encarei, imaginando qual seria seu segundo motivo. — E porque definitivamente preciso de uma ceva gelada. Bora?

Não sou obrigadaOnde histórias criam vida. Descubra agora