C. 6 - NEGÓCIOS

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Suspirei, olhando para meu pai do outro lado da mesa quadrada no melhor restaurante da cidade. Uma luz amarela e baixa deixava todo o ambiente mais confortável à visão, flores enfeitavam todo o salão, às vezes cá, às vezes lá, havia sempre um suporte para vasos de flores vermelhas e brancas, que combinavam bem com o tom vermelho deixado pelas luzes, como se o restaurante estivesse sendo iluminado por velas. Nós éramos os únicos no restaurante e esse era um dos poderes do meu pai. Ele explicou que ligou para o restaurante na hora em que decidiu vir para cá, quando não atendi suas ligações, duas horas antes, e pediu para esvaziar o restaurante só para a ocasião, e separar uma mesa a disposição perto da janela, onde todos pudéssemos ver as estrelas e o mar.

A comida era ótima, o salmão ao molho de laranja estava uma delícia, tal como a tilápia ao molho de alcaparras. Peixes grelhados, especialidade da casa.

— O que você quer, pai? — perguntei, após um delicioso jantar acompanhado de um delicioso suco de laranja.

— Depois de um delicioso jantar como esse, quer discutir negócios? — ele disse, com um sorriso sarcástico e um tom igualmente sarcástico.

Em um movimento gracioso, coloquei ambos os cotovelos na mesa, vendo-o fazer uma careta, entrelacei os dedos e apoiei o queixo, sorrindo tão sarcástico quanto ele.

— Tal pai, tal filho. —escutei Gefereson falar, assombrado.

Ignorei seu comentário, encarando meu pai. Ele parecia comigo em alguns aspectos: seu sarcasmo e a rebeldia, a resistência em seguir ordens diretas, mas, de tudo, o que eu mais amava, era a forma que ele nunca me tratou como o mais novo, ou um bebê. Nunca fui frágil aos seus olhos e, ao contrário de minha mãe, que queria me proteger a qualquer custo, ele me colocou para lutar bem cedo sob o pretexto de que eu precisava aprender a me defender desde cedo. Ele não queria que eu ou minha irmã seguíssemos seus passos como empresário, não. Papai sempre disse para seguirmos nosso coração. Depois que mamãe morreu, entretanto, ele mudou.

Ele tentou, a gente podia ver ele tentar, mas ele ficou devastado demais com a perda de mamãe. Depois que ela se foi, nunca mais ninguém foi o mesmo. Foi como se uma luz tivesse sido apagada permanentemente dentro daquela casa, e a mansão, de castelo dos contos de fadas da minha irmã, se tornou uma mansão mal assombrada.

O chão ainda brilhava, os lustres estavam limpos, os corrimãos metálicos refletiam nossos movimentos, mas tudo isso assumiu uma forma sombria, autoritária, massiva, repressora.

Meu pai ficou mais duro, tornou-se uma fortaleza, cheio de muros, embora mantivesse sua faceta carinhosa conosco, não foi uma ou duas vezes que vi uma empregada sair chorando de casa, ou uma secretária gritando de raiva. Então, eu vi o castelo desabar quando Liah teve seu primeiro heat. Vi-o ficar possesso, seu carinho se tornou excesso de zelo e proteção e eu conseguia ver minha irmã sendo reprimida, sem poder sair de casa sozinha, sempre tendo uma sombra ao seu lado.

— Vamos direto ao assunto, Sr. Alfred Gabriel. — disse, umedecendo os lábios — Eu não vou voltar pra casa.

— Ah, não? — ele falou, cruzando os braços fortes sobre o peito, olhando-me com uma sobrancelha erguida. — Que garantias você tem disso, garoto?

— Nenhuma, mas não vai conseguir me levar a força. — recostei-me na cadeira, imitando-o. Claramente o desafiando. — Eu não quero ficar preso naquela mansão repressora idiota com cinco guardas me cercando. Pelo amor, pai, não foi pra isso que o senhor nos colocou na aula de judô pra começo de conversa.

— Você não sabe de nada garoto. Que garantias eu tenho de que vai estar seguro aqui?

— Eu po... — Derek levantou a mão e eu o olhei com uma sobrancelha levantada. Quer me desafiar mesmo? Agora? Vi-o engolir o seco e abaixou a mão, seus olhos voltados para baixo, em seu prato. — Desculpa.

— Eu sei me defender muito bem, pai. — falei, após algum tempo, olhando para Alfred.

— Não foi o que eu soube. — ele olhou para Melissa, que abaixou a cabeça, culpada. — Frederick, você tem que pensar que agora você tem uma nova realidade que...

— ... Que eu não vou deixar interferir em nada que eu faço ou fiz na minha vida. — cortei-o, sentindo a raiva formigar em minha barriga. — Pelo amor, pai! Eu não quero ser mantido em uma gaiolinha por causa de um status de ômega! Ser ômega não é uma doença, pra começo de conversa!

— Mas, Frederick...

— Você não entende que foi isso que afastou a Liah? Caramba, pai! — ele me olhou, ferido, sua boca se fechando quando o cortei uma segunda vez. — A mamãe não iria querer isso também! Ela tinha tudo, você, eu, Liah e até uma coisa que você não permitiu a sua filha de ter, pai, liberdade. — um gosto metálico começou a surgir em minha boca — A mamãe sempre foi livre pra fazer o que quisesse, e eu tenho certeza que queria isso pros filhos dela também! — lágrimas surgiram aos meus olhos — Você se trancou naquela mansão e trancou a gente junto! Arrastou a gente pra uma prisão domiciliar que ninguém gostava, pai. Ninguém! A Liah só queria um pouco de liberdade. — eu desviei o olhar do dele, o gosto metálico só aumentava em minha garganta.

Um silêncio tenso se fez na mesa. Geferson parecia interessado demais em uma das alcaparras do molho da tilápia, rodando-a de um lado a outro no prato com o garfo pesado de metal. Melissa me olhava, preocupada, uma lágrima suave escorria de seu olho direito, fazendo um caminho em sua bochecha rosada, ao seu lado, Diego também me encarava e, em seu olhar, eu quase pude ver pena, ou assombro. Talvez ainda não acreditava que Alfred Lucas Gabriel fosse meu pai. Derek estava ao meu lado, as mãos fechadas em punhos fortes na mesa, seus olhos estavam em um tom violeta, vidrados na figura máscula e solene do meu pai.

Alfred me encarava, seu olhar ferido, como uma fera acuada, as mãos fechadas em punhos sobre a mesa, seus olhos com uma iluminação vermelha em volta da íris castanha. Eu desviei o olhar, meus dedos formigavam, ao mesmo tempo que um leve comichão começava a surgir em minha barriga, um puxão no estômago, e eu fiz uma careta, fechando os olhos. O que diabos...?  Isso era por causa dos hormônios de ômega? Será?

Olhei para Mel, vendo-a olhando-me com a cabeça tombada para o lado, curiosa. Não ela não estava sentindo nada, então ergui uma sobrancelha. O que era aquilo? Nervosismo por estar enfrentando meu pai, talvez?

— O que você quer pra voltar pra casa comigo? — perguntou Alfred, o alfa de negócios.

Sua voz estava rouca e convidativa, fazendo com que um meio sorriso surgisse em meus lábios, pois conhecia seus truques, conhecia sua influência. Por algum motivo, aquilo não me afetou da forma que ele gostaria, vi sua mão tremer com a força que ele colocava em seu punho fechado.

— Ir pra casa está em último lugar na minha lista de coisas a fazer, pai.

Vi-o erguer uma sobrancelha, olhando-me como se eu fosse um filhote de cachorro inocente e ingênuo.

— Meu filho, não vai funcionar desse jeito. — falou, apoiando os cotovelos na mesa e o queixo nos dedos entrelaçados, como eu fizera momentos antes. — Você vai comigo, por bem, ou por mal. Eu só quero saber o que você quer pra ir por bem.

— Senhor Gabriel, acredite, seu filho estará bem seguro aqui. — disse Derek, sua voz soava rouca e sexy, e eu olhei, franzindo o cenho.

Esse cara estava tentando me irritar, mas ele me encarou. Seus olhos estavam violetas, brilhavam, como quando suas orelhas apareceram em minha casa, de tarde. Eu mordi o lábio. O lobo do Derek não queria que eu fosse embora, ou talvez o próprio homem não queria que eu fosse e estivesse perdendo o controle para ele, o lobo. Peguei sua mão, tentando acalmá-lo e a mensagem em seus olhos foi bem clara, apesar de eu ainda não compreendê-la tão bem quanto gostaria. Eu não quero que você vá. Não vou deixar que vá.

— Como vai me garantir isso, senhor... Frenshwick? — meu pai encarou-o, franzindo o cenho.

— Eu, pessoalmente, vou cuidar da segurança do me... do Fred. – Derek pareceu gaguejar, mas sua voz continuou firme e rouca. — Posso atribuir alguns... Alguns oficiais para protegê-lo, também, se for o caso.

Eu o fuzilei com o olhar, desejando que ele explodisse instantaneamente. Era exatamente o que eu estava tentando evitar: um monte de seguranças me seguindo o dia todo e em todos os lugares que eu fosse. Ele apertou minha mão com força, possessivamente, de forma a demonstrar que não me deixaria ir embora nem se eu quisesse. Derek não olhou para mim, mas seu maxilar estava apertado, seus bíceps estavam tensos e ele olhava pro meu pai como se ele fosse uma ameaça.

— Ora, ora, o que temos aqui? — falou meu pai, e não gostei do tom empregado em sua voz. — Você parece bem próximo do meu filho, lobinho, imagino que tenha participado dessa semana conturbada.

Seu tom era ácido, seus olhos afiados e seu sorriso sarcástico. Arregalei os olhos, sentindo meus dedos ficarem levemente adormecidos, o puxão em meu estômago piorou meu coração acelerou. Por fora, Derek não pareceu se abalar, entretanto, seus dedos apertaram os meus por cima da minha mesa, seus olhos faiscaram, mas sua voz foi fria quando falou:

— Não, senhor Gabriel, Frederick passou essa semana na casa dele, sozinho. — ele olhou para mim e respirou fundo antes de voltar seu olhar para meu querido pai. — Mas eu gosto do seu filho, e quero o que for melhor para ele. Não acho que forçar seu filho a fazer algo que não queira seja o melhor para ele.

— Quem é você para dizer o que é melhor para o meu filho?

— Sou um... — ele engoliu o seco, como se o que fosse dizer em seguida doesse.

— Ah, pelo amor! — disse, olhando de um para outro — Parem de falar de mim como se eu não estivesse bem aqui! — falei e soltei a mão de Derek, apoiando as mãos na mesa, levantando-me com os braços esticados. — Eu não sou mais uma criança, pai. Já provei mais do que o suficiente para o senhor, para Melissa, para o tio Geferson, para todo mundo e quem quiser ver, que eu sou capaz e autossuficiente. Posso me defender, eu não preciso de segurança — olhei para Derek para fazer meu ponto valer — e muito menos uma fortaleza! — olhei para o meu pai, o puxão no meu estômago estava dolorido e eu pouco sentia meus dedos. Umedeci os lábios e respirei fundo, fechando os olhos. — Talvez eu aceite... Talvez eu aceite  um segurança. — olhei para Derek — Eu disse talvez! E eu vou escolher.

— Por mim, tudo bem. — falou o alfa ao meu lado, dando de ombros.

— Frederick, isso é completamente inaceitável. Não vou deixar meu filho, um ômega, em uma cidade como essa, completamente desprotegido!

Um riso breve e sarcástico saiu dos meus lábios, eu os mordi por um breve momento e meneei a cabeça. Fechei os olhos e passei as mãos no cabelo, balançando a cabeça, para, só então, abrir os olhos, dirigindo-os ao meu pai, que me olhou quase assustado. Não entendi o porquê na hora, somente continuei o que ia fazer.

— Eu não vou com você! — minha voz soou diferente, como se estivesse trinta vezes mais alta, como se tivesse um coro de vozes desafinadas acompanhando-me.

Arregalei os olhos vendo os pratos em cima da mesa voarem, chocando-se entre si, espatifando-se em vários pedacinhos de louça, espalhando restos de molho, arroz, molho, peixe. Ouvi Melissa gritar e vi Diego a proteger de estilhaços, Geferson foi parar embaixo da mesa e, tanto Derek quanto meu pai, levantaram-se, juntos, afastando-se da mesa e derrubando a cadeira pesada de madeira. Senti os braços fortes do alfa lúpus me abraçar, forçando-me a recuar e acabei me desequilibrando, sendo amparado somente por seu corpo forte e pesado como aço.

Minha respiração estava acelerada, como meu coração, eu encarei o peito coberto de Derek. Subitamente como aparecera, o puxão em meu estômago sumiu e lágrimas escorreram pelos meus olhos, com um soluço engasgado que rasgou minha garganta, minhas pernas tremiam, fracas, e as bordas da minha visão estavam esbranquiçadas. O peito largo do alfa descia e subia lentamente, com força, como se tentasse se acalmar, ele passava a mão grande nas minhas costas, carinhosamente, tentando me acalmar.

— Mas que diabos...? — ouvi a voz de Diego atrás de mim, então me forcei a virar meu corpo, encarando a situação catastrófica que estava na mesa.

Os pratos estavam quebrados em todos os cantos da mesa, molho, alcaparras, ervilhas estavam na mesa, espalhados, no chão e em todos os cantos. Cacos de vidro e louça estavam espalhados para todos os lados, eu vi arranhões nos braços de meu pai e de Diego, um risco vermelho de sangue estava traçado na maçã do rosto de Melissa, que chorava de medo. Tio Geferson saía de baixo da mesa, olhando-me com medo e interesse. Meu pai me olhava preocupado, com o cenho franzido, tombando a cabeça, quase curioso, mas sabia que um olhar como aquele poderia ser dúbio e frio.

Minhas pernas cederam à cena de destruição, meus olhos pesaram e eu me senti desabar, sendo amparado pelos braços fortes de Derek. Queria saber se ele estava machucado, se... Eu havia feito aquilo tudo? Como?

— Ei, gatinho, olhe para mim. — eu não conseguia levantar a cabeça, sentia-me tonto e fraco. — Ele não está bem. — escutei-o falar, sua voz estava abafada, longínqua. — Temos que leva-lo para casa.

— Alguém sabe o que aconteceu aqui? — a voz de Diego soou ainda mais abafada.

Meus olhos estavam fechando, pesados, minha visão estava embaçada e esbranquiçada. Eu estava completamente apoiado no corpo de Derek, ele me abraçava forte e eu apertava seus braços.

— Não deixem que me levem daqui. — murmurei, tão baixo que achei difícil que ele me entendesse, mas vi sua cabeça acenar uma vez e seus braços me apertaram com mais força, possessivamente.

— O que ele disse? — escutei alguém dizer, tão ao longe que mal reconheci a voz do meu pai.

Senti minhas pernas fraquejarem mais uma vez e dessa vez não tive forças para voltar a ficar de pé. Meus olhos se fecharam e minha mente se calou.

°°°•••°°°

Eu pisquei com a claridade do cenário.

Minha cabeça doía tanto quanto meu corpo. Parecia que tinha passado por uma maldita maratona de treinamento sem cessar, dia e noite, como quando me preparava para as competições. Isso fazia tanto tempo... Gemi, colocando uma mão na cabeça, —sentindo um tecido suave e felpudo cobrindo-me. Eu tinha cobertores felpudos e suaves como esse.

O cheiro de comida também enchia o ar, eram bacons sendo fritos?

Minha barriga reclamou, a fome fazendo caminho em meu cérebro congestionado.

— Quem está querendo me torturar? — murmurei, sentindo meu estômago se revirar em expectativa.

Escutei uma risada baixa e eu abri os olhos, sentando-me na minha cama de colchão de molas, super confortável. Vi Derek de pé, na minha cozinha, atrás do balcão que separava o cômodo do quarto. Ele estava de costas para mim e sem camisa, seu trapézio mostrava os músculos rasgados, tensionados, enquanto ele fritava bacons.

— O que está fazendo na minha casa, lobinho? — perguntei, ainda gemendo, apertando os olhos por causa da claridade que atravessava as janelas. — Maldito seja o sol da manhã.

— Não tenho culpa se você não tem cortinas, gatinho. — ele riu, tirando a frigideira do fogão e colocando as preciosas e douradas tiras de bacon em um prato.

— Cara, eu nunca precisei de cortinas. — sentei em um banco de três pés, de madeira que havia do outro lado do balcão. Ele me encarou, descrente. — Você não respondeu minha pergunta, garoto. O que está fazendo na minha preciosa casa?

— Por que você não precisa de cortinas? — ele se sentou ao meu lado, seu corpo exalando seu cheiro característico e almiscarado de madeira.

— Você não respondeu a minha pergunta, como vou responder à sua?

Vi-o respirar fundo e pegar um bacon, ainda quente, do prato, evitando seu olhar sobre mim. Ergui as sobrancelhas, virei-me para ele e segurei seu rosto, virando-o para mim. Tombei a cabeça para o lado, olhando-o curioso. Ele respirou fundo, seus ombros caindo poucos segundos depois que ele os levantou para respirar.

— O que aconteceu depois que eu desmaiei?

— Seu pai quase teve um colapso nervoso, mas não deixei que levasse para a Capital.

— Fez bem. — mordi um bacon, dando de ombros.

Então um pensamento estranho veio em minha cabeça, uma lembrança da noite passada: o olhar assustado no rosto do meu pai em algum momento enquanto me encarava. Foi como se tivesse visto algo impossível, algo que não deveria ter acontecido.

— O que aconteceu ontem à noite?

— Você desmaiou.

— Antes disso, Derek. O que aconteceu ontem à noite... — eu franzi o cenho, olhando para o bacon em minha mão. — A minha voz... Ela ficou estranha, cortante... Meu pai... meu pai ficou com medo de mim.

Derek suspirou, mordendo mais um pedaço do bacon.

— Seu tio Geferson chamou de faísca. — falou, sem olhar para mim — É a capacidade de alguns Betas de controlarem a energia das coisas. O movimento.

— Basicamente, capacidade telecinética. — falei, olhando as orelhas do alfa. Ele assentiu brevemente — Mas você disse que alguns betas têm essa capacidade. Eu sou ômega, Derek.

— Eu nunca vi nada parecido. — vi-o finalmente virar o rosto para mim – Seus olhos brilhavam, Fred. Eles praticamente ficaram brancos. Deu até medo.

— Derek, meu lobinho preferido, — falei, apertando suas bochechas com força — eu. Sou. Um. Ômega!

Maix vochê 'tava com ox olhox brãncox. — sua voz saiu fofa com o biquinho que eu fazia em seus lábios com as mãos. Dei-lhe um selinho, o que fez um sorriso estonteante estampar seu rosto. Eu o soltei. — Seu tio disse que é muito, muito, muito raro, mas pode acontecer.

Suspirei, terminando de comer minha tira de bacon, levantando-me para pegar uma garrafa de leite na geladeira. Coloquei o líquido branco em um copo americano e me virei para o alfa sentado atrás do balcão, mordendo o lábio enquanto o observava terminar de comer as fatias de bacon remanescentes. Tomei um gole do meu leite, meus olhos sondando a pele suave que cobria os músculos de seus ombros, suas escápulas e os músculos dos braços. Mais um gole e observei como seus cabelos estavam bagunçados aquela manhã, nunca tinha percebido como eles ficavam sempre da mesma forma com aquele corte moderno, mesmo que agora algumas mexas mais longas estivessem enroladas em sua testa.

— Que foi? — ele riu, olhando-me — Queria mais um pedaço de bacon?

Sorri de lado e meneei a cabeça, continuando a, descaradamente, observa-lo. Tomei mais um gole do meu leite, vendo como seus olhos azuis escuros encontraram os meus. Meus olhos passaram por suas bochechas proeminentes, pelas covinhas que se afundavam nas laterais de seus lábios, até chegar na pele avermelhada e macia deles. Ele não sorria mais. Vi quando seus dentes apareceram, os caninos apareceram como presas, mordendo o lábio inferior, vertendo um pouco de sangue, molhando seu lábio sem perceber. Franzi o cenho, voltando a olhar em seus olhos que não mais estavam azuis.

— Que foi? — ele sussurrou, rouco.

— Nada. — falei, dando de ombros, escondendo o sorriso com o copo quase terminado de leite.

— Você está me olhando muito. — Derek falou, desconfiado. Seus olhos continuavam violeta. — O que está olhando?

— Nada, oras. — falei, terminando de tomar meu leite gelado e colocando o copo na pia. — O que mais aconteceu ontem à noite?

— Seu pai surtou, disse que iria levá-lo pra Capital cedo ou tarde. — falou, levantando-se com o prato de bacon na mão. — Eu falei que ia leva-lo para casa e que ele não poderia me impedir. — senti o calor dos braços dele em volta do meu corpo enquanto colocava o prato dentro da pia, lavando-o enquanto eu estendia o copo sujo para sob a água — Falei que iria protegê-lo com a minha vida se fosse necessário.

— Você falou isso? — perguntei, sorrindo para mim mesmo enquanto deixava o copo pra secar.

— Sim. — ele sussurrou em meu ouvido, fazendo minha pele se arrepiar com seu tom rouco. Ele deixou o prato de lado, para secar. — E eu estava falando a verdade. Vou te proteger com a minha vida... Minha outra consciência nunca deixaria de outra forma.

— Ah, é verdade, o lobinho acha que eu sou o brinquedinho dele. — minha voz soou sarcástica quando me virei, colocando as minhas mãos em seu peito nu, espalmando as mãos sobre sua pele macia.

Ele segurou minha cintura com ambas as mãos, seus dedos longos apertando-me sobre a blusa preta que eu usava. Mordi o lábio, sorrindo para sua carranca, seus olhos violeta me encaravam severamente, como se eu tivesse falado algo que não devia.

— Ele não age como se você fosse um brinquedo, muito pelo contrário, ele se preocupa com sua saúde, se você está feliz ou machucado. — sua voz estava mais perto de um rosnado do que de uma fala humana. — Então eu dormi aqui... Espero que não se importe...

— Você dormiu de conchinha comigo? — perguntei, sorrindo, desenhando círculos imaginários em sua pele. Eu senti meu rosto esquentar e eu desviei o olhar, olhando para os meus dedos sobre sua pele dourada.

Ouvi-o rir breve e ele me puxou para perto, colocando as mãos em minhas costas, delicadamente, enterrei meu rosto em sua pele dourada, cheirando seu odor almiscarado e amadeirado. Aquele cheiro me acalmava, tanto que conseguia facilmente me ver viciado, como se só sentir o cheiro dele fizesse-me encher de dopamina e... Respirei fundo seu cheiro, fechando os olhos e aproveitando o momento em que estávamos os dois ali, sozinhos, porque, na minha cabeça, bem no fundo da minha consciência, eu sabia que meu pai acharia uma forma de me levar de volta para a Capital, e quando isso acontecesse... Derek não iria comigo.

— Sob protestos claros e gritados de Alfred Lucas Gabriel. — ele falou, sorrindo e afastando-me e levantando meu rosto para olha-los nos olhos. Eles estavam de volta aos seu tom azul escuro. — Ele falou altas coisas sobre me torturar se eu te machucasse ou coisa assim. — vi-o respirar fundo e suas feições ficaram sérias. — Nunca faria nada do tipo com você... — então engoliu o seco, pegando o pulso que, na tarde anterior havia marcado com suas unhas. — Não por querer.

— Eu sei. — falei, pegando sua mão e beijando seus dedos — Mas não é como se eu fosse... Indefeso. Eu sou forte! Eu sei lutar!

— Você parece um gatinho irritado. — ele falou, com simplicidade e eu lhe dei um forte tapa no peito, fazendo-o choramingar com o ato. — Doeu! — massageou a área em que eu havia batido. Uma marca vermelha já se formava. — Ah, é assim, então?

— Você me chamou de gatinho irritado. — cruzei os braços, colocando uma pequena distância entre nossos rostos.

Seus braços ainda rodeavam minha cintura e seus músculos me apertavam em um abraço forte. Um sorriso brincalhão apareceu em seus lábios e eu o olhei curioso, minha determinação sendo substituída por... Medo?

Frenshwick levantou-me em seu colo, colando meu estômago ao seu ombro, fazendo-me de saco de batata e me levou até a cama enquanto eu gritava e protestava. Seus passos ecoaram pelo piso de madeira encerada, e, então, meu corpo colidiu com o macio colchão de molas, sendo apertado em seguido pelo corpo maior e mais musculoso de Derek.

A essa altura, seus olhos se tornaram violeta, e seu sorriso se tornou um meio sorriso malicioso, predador e convencido, como se tivesse acabado de segurar sua presa, o que não era muito diferente da forma em que me senti, preso entre seus braços e corpo, com seu rosto tão perto do meu, sua respiração soltando lufadas quentes na minha boca.

Seus lábios cheios e rosados, entreabertos, mostravam os caninos afiados. Suas narinas se dilatavam toda vez que inspirava meu cheiro e um suave gemido fazia trilha sonora ao movimento. As íris azuis de seus olhos misturavam-se com a tonalidade vermelha que seus olhos assumiam quando perdia o controle, mesmo que levemente, de seus instintos, deixando-os violeta com um halo azulado em volta das pupilas dilatadas.

— Um lindo gatinho irritado. — murmurou Derek, aproximando-se de mim e roçando seus lábios nos meus. — Meu gatinho irritado.

Eu abri a boca para argumentar, colocando as mãos espalmadas em seu peito nu e empurrando-o para fazer um ponto, mas ele foi mais rápido, tomando meus lábios com fúria e desejo. Maldito. Seu corpo prensou o meu contra a cama e tudo o mais que conseguia pensar era no seu corpo entre minhas pernas, nos seus quadris tocando a minha virilha, minhas panturrilhas travando sua bunda e, além disso, no quanto de roupa estávamos vestindo.

Magic Idol (ABO)Onde histórias criam vida. Descubra agora