Adaga de Sangue

4.

A SEMANA PASSOU em um piscar de olhos enquanto eu vivia no automático. Fazia os feitiços nas aulas de forma mecânica com os mesmos pensamentos que eu sabia que os fariam funcionar, mas que não geravam minha melhor performance. Já os treinamentos eram silenciosos com palavras de ordem vindas apenas do meu instrutor, que depois daquele dia, não pareceu querer trocar alguma palavra ou ter uma conversa mais amigável comigo, e eu não o julgava por isso.

Theo obtinha no seu olhar a mesma expressão mortífera que Gaya costumava me olhar, mas por motivos diferentes de sua namorada, que já parecia ter superado a briga no corredor e os treinos depois de reparar que eu não tomaria seu lugar na categoria de "caçadora fodona".

Ani parou de perguntar todos os dias sobre como estava sendo meu treinamento quando reparou que não tiraria mais palavras de mim a não ser "bom" ou "inovador", e acho que para ela isso bastava para que chegasse a conclusão de que eu havia desistido de querer ir na missão por ter reparado que eu não era boa com lutas.

A verdade é que eu estava amando lutar, e em apenas uma semana eu tive uma melhora grande o suficiente para receber um elogio sincero e sair de apenas socos para uma luta com ofensivas e defensivas. Eu estava aprendendo mais sobre mim do que poderia ter aprendido com apenas feitiços e lutar estava me deixando mais forte e disciplinada, pelo menos o suficiente, já que eu não arrumava briga ou respondia um professor fazia uma semana, e isso vindo de mim, era o suficiente para que todos estranhassem.

Após o jantar na sexta, minha cama parecia o lugar mais atrativo do mundo, e meus músculos doloridos pela prática constante com Kieran me fez soltar um gemido de satisfação quando a maciez me envolveu. Ao meu lado, Ani soltou uma risada ao ver meu estado e se sentou em sua cama com um livro antigo da Jane Austen. Meus olhos que mal conseguiam se manter abertos de cansaço a olharam e após um bocejo, falei as palavras que ela ficou a semana inteira esperando ouvir.

- Kieran disse que eu tenho movimentos de caçadora, e que se ele não soubesse que sou uma bruxa, diria que sou uma, com pouco treinamento, mas uma.

Seus olhos se voltaram para mim rapidamente e com um sorriso aberto fechou o livro e o guardou ao seu lado.

- Ele não costuma dar muito elogios né? - Uma risada da minha parte respondeu sua pergunta e juntas ficamos rindo e imitando a postura rígida do Caçador Ryder.

Quando eu mal estava conseguindo responder suas perguntas sobre o treinamento e meu andamento com feitiços, me permiti fechar os olhos e cair no meu tão merecido descanso. Porém, a névoa vermelha que tomava conta de meu subconsciente toda vez que iria ter o pesadelo com o vampiro misterioso apareceu e me guiou para mais uma noite atormentada.

Era o mesmo corredor das outras vezes, as mesmas paredes de pedra escura e o mesmo clima frio de inverno. Porém algo estava diferente dessa vez, minha roupa era toda preta, uma calça jeans justa em companhia com uma jaqueta de couro da mesma cor e coturnos pretos, eu era uma versão feminina de Kieran. Em minha mão direita, para minha surpresa, uma pequena adaga de cabo vinho e lâmina tão prateada que poderia refletir meu reflexo a metros de distância.

A risada maligna soou retumbante enquanto meu corpo desatava a correr pelas ruas estreitas e com as portas ainda trancadas, me vi novamente no beco sem saída em que geralmente morria, porém agora, mais atenta, pude reparar uma escada de incêndio tão velha e com ferrugem suficiente para que desse a impressão de que iria se esfarelar em minhas mãos. Rezando para que isso não acontecesse, e com a ajuda de uma lata de lixo perfeitamente posicionada, apoiei minhas mãos no ferro e dei impulso para subir. Eu me sentia e estava mais forte do que lembrava, e culpando a adrenalina do momento, fiz força o suficiente para conseguir apoiar um de meus pés na escada e subir para o primeiro andar.