Avermelhado.

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Meu rosto estava avermelhado e minha pele maltratada pelos meus próprios dedos, eu encarava concentrado o espelho do meu novo quarto, enquanto tentava - em vão - espremer alguns cravos para aparecer no mínimo apresentável no meu primeiro dia de aula.

Levei uma das minhas mãos ao nó atrapalhado da gravata de meu uniforme escolar: no meu país não tínhamos o costume de usar uniformes, a não ser em escolas militares ou extremamente tradicionais, onde eu, graças ao meu pai, nunca precisei estudar. Essa era minha primeira experiência usando um uniforme completo.

Será que alguém vai reparar que eu não sei dar nó em gravata?

Virei de costas para o espelho e ajeitei a blusa por dentro da calça, virei novamente e fiquei na ponta dos pés tentando ver meus sapatos novos. Bem, tudo parecia aparentemente em ordem comigo, entretanto eu sabia que não era verdade, estou apenas me tranquilizando, pois não pretendo deixar Su Mi, minha madrasta, mais preocupada.

"Vai dar tudo certo, Taehyung." Repeti isso diversas vezes, ainda assim meu estômago se contorcia e queimava de tanto nervosismo, estava difícil até respirar com regularidade.

Estiquei minha blusa antes de vestir o suéter que compunha o uniforme, finalizando com o blazer. Peguei minha mochila que estava caída em cima do colchão forrado no chão e sai do meu quarto cheio de caixas, que até então, só o espelho tinha sido desembrulhado e apoiado em cima de uma cadeira, que se tudo desse certo, ficaria na parede da escrivaninha.

Andei suavemente sem nem mesmo ouvir o som dos meus próprios sapatos pelo corredor estreito que me levaria até a nossa sala, também cheia de caixas. Su Mi olhava pela janela do nosso pequeno apartamento, encarando a paisagem e acariciando o volume enorme em sua barriga. Ela me notou e sorriu para mim, fazendo os olhos puxados formarem pequenas dobrinhas, que em minha opinião eram bem fofas. Sim, Su Mi era fofa e meiga, era pequena também. Meu pai tinha sorte de ter alguém bom ao seu lado, e mesmo com as poucas palavras que eu e ela trocávamos, ela sempre era bastante gentil e receptiva.

- Oh, você está bonito. - O Inglês dela era muito bom, tanto que antes eu costumava esquecer o fato dela ser de outro país. Mas agora que eu estava morando no país dela, isso era meio que impossível.

- Você acha? Ainda não me acostumei com esse uniforme... - Comentei andando até ela - Qual é o problema com roupas comuns no colégio?

Su Mi se aproximou e ficou de frente para mim, ela passou então a arrumar o colarinho da minha camisa e sorria ainda ternamente, como uma mãe.
Geralmente, minhas roupas se resumiam a jeans despojados, blusões e casacos bem largos, eu não era adepto de roupas alinhadas ou apertadas demais feito esse uniforme, meu pai sempre dizia que eu me vestia como um velho, mas eu gostava das minhas roupas assim.

- Você acha que o nó está bom? Eu não precisava me preocupar com isso no Canadá. - Sorri sem graça.

O rosto de Su Mi ficou triste da água para o vinho, e eu me perguntei se havia feito alguma coisa de errado sem perceber.

- Eu gostaria muito de pedir desculpas ao Taehyung. - Estranhei o jeito que ela disse meu nome na terceira pessoa mais do que o fato dela estar me pedindo desculpas do nada. - Eu realmente não queria fazê-lo passar por uma mudança tão brusca, tão de repente. Eu me sentiria sozinha, num país que não conheço, por isso eu quero que me perdoe, e gostaria de dizer obrigada, por aceitar essa proposta estranha de tão bom grado.

Certo, eu estava sozinho, estava me sentindo envergonhado e estava com medo do que ia acontecer vivendo num país que eu não conheço. Ou seja, nada que a Su Mi falou era mentira, mas eu não a culpava por isso, pois tudo aquilo foi apenas o primeiro sacrifício que eu fiz em nome do meu pai em anos, e ele não merecia desperdiçar a chance de ser feliz depois de tantas coisas ruins que passamos em nossa vida, por causa de um capricho meu.

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