11

292 6 1
                                    


Tudo começou a ser muito diferente. Eu estava muito mais quieto que de costume. As palavras da Lena não me saíam da cabeça. Eu não sabia, mas parecia estar com vergonha de andar com caderno e livros. Era como se eu nem sequer soubesse caminhar. Mas ao mesmo tempo havia uma alegria secreta que eu não conseguia definir.

Minha mãe me olhava desconfiada, porém não falava nada. Percebi que em seu silêncio me aprovava, É isso era uma novidade. Notei que minha roupa estava mais bem lavada, e um dia me surpreendi com minha cama arrumada. Também não falei nada. Este era o costume, pois não éramos amigos.

Era diferente estar na escola sem ser notado. Ser um aluno comum. Mas era confortável. Também deixei de andar com meu canivete. Na dúvida, escondi-o no meu quarto. Agora minhas armas eram os livros usados e o uniforme do time presenteado pelo professor Jeferson. Era como se eu fosse uma piada.

Nas aulas, eu continuava com muita dificuldade de concentração. Tudo me distraía, mas nunca mais me deitei na carteira. Eu precisava mostrar que agora era outro. O problema era meu jeito de falar, cheio de gíria e meio cantando. Até isso estava me constrangendo, e eu não conseguia falar diferente. Ao mesmo tempo, tinha uma capacidade singular de identificar os malandros da escola. Só que o medo falava mais alto e eu não me aproximava deles. Via a turma Chapada, até que dava uma saudadezinha, mas não O bastante para chegar nós caras. E tinha o professor Jeferson que eu não podia decepcionar. Logo eu, que nunca me subordinado a ninguém!

As aulas de educação física eram especiais. O professor apresentou um plano.

- Vamos trabalhar em três frentes: o preparo físico, o treino com bolas e as jogadas ensaiadas. E vamos ter preleções. Significa: tudo que acontecer vai ser analisado. Ok? - O treino era chato, mas o professor dizia que era essencial. E ele cuidava um a um. Com a bola, o professor Jeferson explorava as qualidades particulares de todos, e quando não se jogava bem, queria saber o que estava acontecendo. Aí o assunto ia longe!

Descobri que ali todos tinham suas histórias tristes e suas vidas mal-arrumadas, portanto não era o único, e isso me fez sentir melhor. Descobri também que não era o único a ter recebido livros velhos, que essa era uma campanha feita com os alunos dos anos anteriores encabeçadas pelo professor. Não deixei de me sentir especial por causa disso, só passei a admirá-lo mais ainda.

*

Houve o aniversário da Carol. A festa foi na casa dela. Para entrar, precisava levar uma bebida. Peguei uma garrafa de vinho que, há um tempo, estava sobre a geladeira lá de casa. Uns caras passaram lá e fomos juntos à festa. Foi chegando todo mundo. Aos poucos, o som foi aumentando. Era todo tipo de música. À medida que a festa foi correndo, os ânimos foram aumentando. Lá pelas tantas, começamos a dançar funk. As meninas começaram a fazer coreografias. E que coreografias! Foi demais. Beijei a Ana, a Brenda e a Carol. Não lembro como cheguei em casa, só da dor de cabeça no outro dia. Na escola, foram grandes os comentários. Descobri que não vi a metade das coisas que aconteceram na festa.

A galera aprontou pesado. Um menino usou ecstasy e ninguém o aguentou. Pegaram-no à força e o levaram embora. Contaram que, no caminho para casa, ele quebrou algumas coisas. Estava completamente maluco. Ele queimou o filme e ninguém mais queria ficar com ele.

ToscoOnde histórias criam vida. Descubra agora