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   Eu nunca fui um exímio jogador de futebol. Mas o professor Jeferson descobriu minha vocação inata para a liderança. Ele dizia que eu tinha uma visão estratégica, e isso ganhava jogo. Claro, para cada um ele tinha um elogio, e eu me sentia orgulhoso da visão estratégica que possuía.

O professor Jeferson conseguiu com o diretor a liberação da quadra nos horários em que não tínhamos aula e nos finais de semana. Claro que tudo dentro da maior organização. Quem iria participar precisava dar o nome, e a presença de penetras era expressamente proibida, com a ameaça de perdermos os direitos adquiridos. Também  tínhamos a incumbência de zelarmos pelo patrimônio da escola. Sentíamo-nos especiais por causa dessa confiança. Nós não éramos alunos comuns.

Nosso time passou a ser um novo grupo de amigos. Quando terminava o treino, mesmo quando fora do horário das aulas de educação física, ficávamos conversando. Mas aí fomos descobrindo as especialidades de cada um. Tínhamos um bom potencial para a malandragem.

Nas aulas, eu não era dos mais comportados e nem dos mais assíduos. Na verdade, o que eu conseguia fazer na escola estava feito. Não conseguia estudar em casa. Eu sabia que estava devendo, e mesmo assim não conseguia fazer mais.

Nunca mais afrontei nenhum professor, pelo contrário. Certo dia, duas meninas estavam impossíveis. De fato, atrapalhando a aula. A professora já havia lhes chamado a atenção mais de uma vez sem resultados. Em nome da amizade com o professor Jeferson, que nem sequer sabia do respeito que eu lhe devotava, pedi licença para a professora e dei um esbregue nas meninas. Tentei não falar gíria.

- Gente, nós estamos aqui pra aprender e a professora está num esforço danado. Essa bagunça é uma falta de consideração com a professora e com a turma. O direito de um termina onde começa o dos outros. - Fui aplaudido pelos demais colegas. Ganhei a inimizade das duas, e a professora me agradeceu na saída. Ganhei minha semana! Senti como se estivesse uns três centímetros mais alto. Até da gozação da turma gostei.

- Tá com moral, heim!? - Só que agora eu não poderia mais fazer bagunça!

Num sábado à tarde, depois de um jogo a que o professor Jeferson veio assistir, sem ele fomos a um barzinho tomar cerveja. O Teco estava com cinquentão que ganhara não sei de quem e resolveu patrocinar. Fazia um tempão que eu não bebia nem fumava. Bem, nem tanto tempo. A última vez tinha sido na casa da Carol. Depois de uns copos nós alteramos e logo descolamos um baseado para acompanhar. Sujeira geral! No final, tínhamos bebido mais que o dinheiro conseguia pagar. Encrenca na certa. O dono do bar chamou uns caras que jogavam sinuca para ajudá-lo e a correria foi geral. Levamos uns safanões, e o pior é que a minha camiseta do time ficou para trás! Logo a camiseta do uniforme! Que pisada na bola!

No domingo voltei ao bar, que não estava aberto, então na segunda bem cedo eu estava lá. O dono me olhou com uma cara de bravo e disse que iria me denunciar à polícia e também à escola.

- Eu dou um jeito de pagar o prejuízo. Trabalho pra você. Diz quanto foi que vou encontrar uma forma de pagar. E, por favor, devolva-me a camiseta do time, senão vou ser muito prejudicado.

Com isso o dono do bar soube qual era meu ponto fraco. Quando a escola abriu, lá estava ele conversando com a direção. Pronto, estava tudo ferrado. Estava bom demais para ser verdade. E o professor Jeferson? O que faria conosco? E a quadra estaria confiscada! Era o combinado.

Fiquei tão desolado que pulei o muro e voltei para casa. Entrei no quarto e dormi. Perto do meio-dia alguém insistia em bater palmas na frente de casa. Tentei não ouvir, e como minha mãe deveria ter saído, tive de atender. Quase tive um treco: era o professor Jeferson! Estava em uma linda moto azul, dessas grandes, altas. Não conseguia olhá-lo, então ele me disse:

ToscoOnde histórias criam vida. Descubra agora