CAPÍTULO 7- CONTOS DOR E ESCAMAS

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Kyro, Vila das Quimeras, quatro anos antes

A nevasca começara a ser soprada de maneira incrivelmente forte pelos ventos vindos do norte e oeste. O vulto encapuzado corria de maneira desesperada pelo chão manchado de rubro, desviando de corpos caídos no chão, sofrendo e sangrando com múltiplas perfurações na região abdominal. Homens mulheres e crianças quimeras gritando em agonia, ansiando por uma salvação.

O trapo sobre suas costas apresentava inúmeros rasgos causados pelas escamas safira-cromado que possuía do lado esquerdo de seu corpo, incontáveis lágrimas caiam de forma descontrolada, escorrendo pelo rosto, umedecendo-o com sal e caindo no chão, como uma gota de lástima. Pai, mãe as palavras ressoavam em sua cabeça, numa onda que ia e vinha em seções consecutivas, sem intervalo algum entre uma e outra.

Cinzas começaram a se misturar junto aos flocos brancos que geavam e congelavam seus cílios, o incêndio havia aumentado, engolindo quase completamente a vila as costas da silhueta sem esperança.

O acentuado cheiro de pimenta branca e madeira queimadas predominava tudo, vindos de casas flamejantes e de safras recém-colhidas nem tão longe dali, o jovem de 17 anos queria por qualquer coisa eliminar a fragrância agridoce de suas narinas.

Gritos eram ouvidos com uma gigantesca frequência incessante, isso causava espasmos e calafrios na espinha cada vez que o ruído agudo acariciava de maneira brusca o campo auditivo da figura. A neve manchada de escarlate era pressionada a cada passo dado pelo mesmo, colando-a cada vez mais com o chão enquanto pegadas eram deixadas para trás em números pares.

A agonia preenchia completamente seu coração, trazendo a tona, além dos recentes e mais dolorosos ainda acontecimentos, maus e terríveis sentimentos, enterrados por várias camadas grossas de falsa felicidade que acumulara durante muitos e longos anos de sua vida.

Olhou para trás, refletindo as flamas em suas íris claras, temendo o terror, brutalidade e maldade dos assassinos que mataram as pessoas que mais amava. Pai, mãe as palavras voltaram a atormentá-lo, agora liberando por completo o selo que prendia suas lágrimas, deixando-as fluir de maneira mais incontrolável.

A tênue brisa levantava graciosamente os fios negros e molhados de suor de sua cabeça, em certa parte refrescando-o, mas mesmo assim não o livrando de uma tristeza intensa. Os olhos se levantaram, fixando-se na trilha coberta por branco a sua frente, recordando-se de como aquela cor lhe trazia lembranças.

A sua volta uma vasta floresta de pinheiros crescia, com seu tronco escuro servindo de base a várias folhas com estruturas de espinhos diagonais. Por um momento o jovem pareceu apreciar o gracejo – ou não – de alguém o observando, no entanto, ao voltar os globos oculares para frente à única coisa que viu foi à folhagem coberta de neve, balançando de maneira estrondosa, produzindo um som seco. Porém a simples opção ou sensação de possuir olhos seguindo-o era algo ruim. Apressou o passo, criando esperanças de que algum membro do clã assassino que atacara sua vila tivesse avistado o caminho pelo qual caminhara, queria por qualquer coisa que tal sensação não passasse de uma impressão. Não que não pudesse se defender, era portador de incríveis e hábeis habilidades de luta, no entanto, seu emocional se encontrava em tal estado que ele não ousaria tocar um dedo em outra pessoa.

A linha de pegadas aumentava cada vez mais, enquanto as que dera inicialmente começaram a sumir, tornando-se novamente parte da planície fofa e branca de neve, porém, desta vez, com uma ligeira camada de cinzas, sobrepondo-se delicadamente por cima do mesmo, como poucas estrelas num céu noturno, quebrando por completo, juntamente com as chamas, o intenso branco da paisagem.

O capuz agora voava com os ventos abundantes, desfazendo-se com a dureza e rigidez do lado cortante do corpo da figura, indo embora como farrapos, deixando-o no frio, somente com a medíocre blusa de trapos que exibia seus braços magrelos e finos, enganosos para desavisados, aqueles membros eram capazes de nocautear lutadores profissionais que não possuíssem cuidado com tal.

RAPUNZEL A HISTÓRIA NUNCA CONTADAOnde histórias criam vida. Descubra agora