O ar da primavera estava úmido e aconchegante. De fato, aproveitável: o verão já se aproximava, em breve as nuvens plúmbeas seriam esvaídas em água e o clima estaria seco. Junto com o verão, a Competição de Seul se aproximava.
Kim Junmyeon, Kim Minseok e Zhang Yixing andavam lado a lado, vestidos em trajes de gala. Três ternos bem alinhados e gravatas perfeitamente amarradas. Os cabelos, exceto o de Jun, com um gel que os prendia para trás. Andavam quase em sincronia, pelo cemitério vazio e florido. Seok chegou na conclusão, há algum tempo, de que as flores serviam para quebrar o clima mórbido que pairava sob as tumbas bem distribuídas. Jun passava seus olhos pelas lápides, observando as mensagens póstumas e assustado a medida de que chegavam perto do falecido que buscavam visitar.
Yixing abraçou forte contra o seu corpo o buquê de rosas que carregava nos braços quando os três chegaram aos pés de onde Jongdae estava enterrado, com os dizeres "Bom nadador, bom namorado e incrível existência". Colocou-a sobre a cama isolada de cimento e pedra, o único buquê que ele havia recebido naquele dia da única família que ele tinha. Algumas flores já quase murchas estavam ao lado, e Minseok as tirou, atraindo olhares curiosos dos outros dois.
— Eu venho aqui todos os dias para limpar. Trago flores sempre que posso. – Disse, os olhos vidrados na sepultura. Seguiu em direção à casa do coveiro para buscar materiais de limpeza, sem dizer uma palavra para os outros, porque não achava que tinha necessidade.
Yixing e Jun se entreolharam, soltando um sorriso. O chinês colocou as mãos nos bolsos e focou seus olhos nas rosas, Jun olhava para a escritura, sua cabeça voltando às memórias de Jongdae. A pessoa incrível que ele era, que ele poderia ser.
Jongdae foi sortudo, realmente. Viveu mais que três vezes o que era estimado viver, retirou sua vida apenas pela sua própria vontade. O destino nunca pegaria Jongdae. Ele era este tipo de pessoa, que não aceitava perder para qualquer outro que não fosse ele mesmo, e por mais que sua vida corpórea tivesse desaparecido, nunca abandonaria a existência.
Ele viveria da melhor forma possível para aqueles que o amavam. Sorrirá para sempre, estará alegre para sempre, e nessa existência jamais vai estar triste, porque seus momentos de tristeza abandonara apenas em sua própria mente, nunca demonstrando para terceiros.
Na alma e para sempre nela, ele estaria vivo, mais do que nunca esteve. Sem doença, sem algo que o assombrasse. As três pessoas que tiveram o prazer de sua convivência o lembrariam da melhor forma possível.
Junmyeon olhou mais uma vez para Yixing, que também o encarou. Eles estavam pensando a mesma coisa. Ambos conseguiam sentir mais uma presença naquela solidão. Era como se alguém estivesse atrás deles, com a mão em seus ombros, os confortando, dizendo que estava tudo bem e que essa era a vida. Não se tratava de renascer, porque o renascimento não era possível. Se tratava de morrer: apenas morrer traria a libertação. Algo que era simultaneamente cruel e, mesmo assim, os dava a vida. O medo de morrer.
Yixing tirou uma das mãos do bolso e a estendeu para Junmyeon, que a entrelaçou junto a sua. Sentir o calor da pele um do outro fez aquela presença sumir e então, magicamente, não sentiam nada além de um ao outro.
— Você acha que foi minha culpa? – Junmyeon pensou alto, sem mudar a expressão, sem dizer nada além. Ele precisava saber se pelo menos uma pessoa, qualquer que fosse, acreditava nele.
— Não. – Yixing respondeu apenas, o que fez Jun apertar mais ainda a sua mão.
— Então de quem foi a culpa?
— É tão difícil acreditar que ele quis isso, e ninguém além?
Zhang estava certo. Junmyeon sabia que estava, e por isso abaixou a cabeça, fitando seus calçados. Uma lágrima solitária escorreu pelo seu olho. Em seguida, mais vieram e, quando ele percebeu, tinha soltado Yixing e usado as mãos para esconder seus rosto soluçante e vermelho, enquanto ele chorava.
O Zhang o puxou pela cintura e o abraçou, enterrando Jun em seu peito. O mais velho pôde sentir o odor alheio por um tempo, ele ainda tinha cheiro de piscina, o que o confortava tanto quanto amedrontava. Não conseguiu retribuir o aperto, nem tirar as mãos do rosto. Yixing o abraçava firmemente, deixando um selo de lábios no topo da cabeça alheia.
— Desculpe... Jongdae, me desculpe, por favor... – Murmurou continuamente, e dessa vez Yixing não disse nada. Jun precisava daquele momento, precisava se perdoar, ou sentir que estava sendo perdoado.
Os dedos magros do mais alto escorregavam pelas costas de Myeon em uma carícia. Ouviu a grama farfalhar e percebeu que Minseok estava se aproximando. O mesmo se sentou em frente ao túmulo, arregaçou as mangas do paletó e pegou uma bucha molhada, começando a limpar. As letras gravadas na pedra pareciam ainda mais nítidas, agora livres da poeira.
Quando Minseok terminou o serviço, Yixing soltou Jun, mas ainda com as mãos dadas, e ficaram mais um tempo ali.
— Como vocês viraram amigos tão próximos? – Myeon perguntou, quebrando o silêncio.
— Não sei. É como se um vínculo nos ligasse. – Yixing respondeu, com um sorriso no rosto.
— Ele enche a minha paciência, mas eu meio que entendi o que você gostou nele. É sincero e é confortável estar ao lado de Yixing. – Retrucou o mais velho, também segurando a mão de Yixing.
Com um de cada lado e o Zhang no centro, ele apertou ambos, as duas pessoas que ele sabia que precisavam de sua ajuda naquele momento. Tinha ciência de que, naquela situação, era o que menos sentia o peso do arrependimento. Os Kim precisavam dele mais do que nunca, porque era ele quem os erguia.
— Você acha que ele está irritado conosco? – Jun murmurou, se referindo a Jongdae. Fungou, limpando seu rosto molhado com a manga.
— Quem sabe? Sinto que a gente não conhecia ele. – Minseok soltou a mão de Yixing, seguindo para o carro. — Fiquem o tempo que precisarem. Eu vou trabalhar.
Ele foi embora em silêncio, com as mãos nos bolsos. Yixing observou a silhueta sumir cada vez mais no horizonte e, conforme ia, desaparecia como se nunca nem estivesse entre eles.
— Eu menti para você. – Jun sussurrou, prendendo a atenção alheia. — Eu menti pra você. Eu aprendi a não mentir, aprendi quanto é doloroso quando não são honestos, e a única vez que eu fiz isso para você, te machuquei.
— Sobre o que você mentiu?
— Eu amo você. Como a piscina, como o mar, como qualquer comparação que eu jamais consiga imaginar, porque não consigo ser romântico e atencioso como você. Você me fez tão bem e a única coisa que eu fiz foi te machucar. – Yixing engoliu o seco, mas não interrompeu. Jun continuou. — Eu tenho vergonha de ter feito isso. Tenho ódio de sentir vergonha por tudo, também. Não consigo sequer ser honesto, dizer que estou com medo...
— Medo do quê?
— De mim mesmo. Da forma como eu machuco os outros. Estar do lado de Jongdae o matou. E se eu matar mais gente, apenas por me aproximar? E se eu matar você, Yixing? – Sua face não mudava. Ele também não tinha mais lágrimas para chorar. — Sempre me prendo em casa mas, quando decidi sair, conheci Minseok. Achei que eu não faria mal pra ele, mas fiz mal pra pessoa que ele mais amava. Eu não sei se mereço estar perto de outras pessoas agora.
— É verdade que você me machucou. – Foi sincero, sentia que precisava ser. — Mas eu te conheço mais do que imagina, Junmyeon. Eu consigo sentir você, não só fisicamente, também te sinto espiritualmente. E é por isso que eu conheço tudo que você sente e, ainda sim, quero ficar do seu lado.
— Então...
— Posso ser sua luz, mesmo que você venha com sua escuridão.
Jun soltou a mão dele mas, ao invés de se afastar, se aconchegou nos braços alheios novamente, sentindo os lábios de Yixing beijando sua testa gentilmente.
— Obrigado. Obrigado por tudo, Yixing.
— Obrigado por me dar uma chance. – Fez uma carícia em sua bochecha com os dedos finos, afagando os cabelos.
Os dois olharam uma última vez para Jongdae.
— Obrigado por ter nos iluminado. – Jun disse, e Yixing sorriu junto.
Então, se deram aos mãos e seguiram para fora do cemitério, pelo que parecia ser uma despedida.
VOCÊ ESTÁ LENDO
seu modo de andar [ sulay ]
FanfictionKim Junmyeon era um nadador profissional apaixonado pela água. Nela, encontrava seu refúgio e os problemas eram levados pelo azul da piscina. Até que, depois de uma lesão séria em uma competição e uma infecção oportunista, ele teve que ter uma das p...