Capítulo oito

1.9K 145 111
                                    

Olhei para Verônica que estava diante da penteadeira, arrumando seus curtos cabelos castanhos, enquanto tagarelava sobre as desventuras que aconteceram ao longo daquele mês. Por mais que estivesse reclamando, havia um belo sorriso moldando seu rosto, como se todos os problemas não passassem de lembranças ruins que, de alguma forma, serviam para lhe fortalecer ainda mais.

Deitei na sua cama de barriga para baixo, meu olhar fixo nas costas da minha irmã. Por alguma razão, sempre gostei de vê-la se produzindo, o que ela fazia não era tão simples quanto parecia, eu mesmo já havia tentado algumas vezes, mas o resultado sempre vale a pena mesmo demorando.

- Não vai colocar um casaco? Tá frio... - falei baixinho, sendo um comentário e não uma ordem, meu corpo inteiro estava entrando em hibernação por causa daquela temperatura, não sei como ela não estava em um estado parecido com o meu. Puxei o lençol para que cobrasse meu torso desnudo, os arrepios que a temperatura me causava deixando ao meu corpo com uma sensação prazerosa de que logo eu iria adormecer.

- Não preciso, já fui ao restaurante que irei daqui a pouco e tem aquecedor lá. O Matt vem me buscar de carro, - rebateu calmamente, olhando-me de relance e abaixando os óculos antes de arrumá-lo no nariz novamente.

Suspirou e pegou um dos batons vermelhos, voltando a se olhar no grande espelho preso à parede.

- Há algo errado, Nica?

- Não, nada... mas tem certeza de que não quer ir comigo?

- Oh não, eu tenho trabalho amanhã. Sextas sempre são os dias mais corridos e muitos funcionários estão doentes, época de gripe, sabe? - Falei com simpátia e sorri de lado.

Aquilo não era mentira, mas não se tratava de uma verdade absoluta. Além de ter trabalho no dia seguinte, eu me sentia desconfortável quando saía com eles, só serviam para ficarem aos beijos e me ignorando, além de que seus papos sobre a Universidade deles não me alegrava em nada, na verdade, era de extremo desconforto.

O tédio que me dava então.. Incontável.

- Mas.. Hum.. A Pidge estará lá, se isso te fizer mudar de ideia. - Falou como quem não quer nada, mas a sugestão estava saindo estranha por seus lábios, seu nervosismo era quase palpável. Verônica não estava agindo como ela mesma, de um momento para o outro parecia ter se tornado alguém completamente diferente, não na aparência e sim em algo menos superfície, uma camada que não me estava a mostra.. - Soube que vocês ainda são amigos, se afastarem naquela época, voltaram a se falar.

- Isso te surpreende?

- De maneira alguma! Na verdade, gosto dela, é uma boa garota, seria uma ótima namorada. - sua voz agora estava semelhante a um sussurro e me esforcei para ouvi-la direito, confuso durante todo o tempo. - Mas e você?

- Mas eu o quê?

Arqueei uma sobrancelha automaticamente, tendo uma pequena noção de onde ela queria chegar e me sentindo estranhamente constrangido pelo seu olhar provocativo, querendo insinuar algo que nem mesmo existia.

- Ah, Lance, não se faça de sonso. Você entendeu a minha pergunta. - Grunhiu, mas logo em seguida pareceu relaxar, os ombros estavam perceptivelmente tensos. - O que rola entre você e a Pidge? Já vi vocês juntos algumas vezes pela Faculdade e na época de colegial estavam sempre colados, mãos dadas, na cintura, aqueles olhares... Um tanto curioso.

Arregalei os olhos com sua insinuação, tentando absorver aquelas palavras, era um pensamento surpreendente e perturbador.

Aquele era um comportamento comum entre melhores amigos de infância e mesmo extrapolando um pouco, eles nunca passavam dos limites. Havia uma intimidade extravagante entre nós ainda, ainda mais porque um jamais faria a preferência do outro, tanto no físico quanto... Em outros pontos. De onde ela tirou uma coisa daquelas? Perguntei-me mentalmente, ela deveria estar vendo romances bobos de adolescentes. Velhas deveriam se comportar com mais controle.

𝘉𝘦𝘤𝘢𝘶𝘴𝘦 𝘐 𝘩𝘢𝘥 𝘶 - 𝘒𝘭𝘢𝘯𝘤𝘦Onde histórias criam vida. Descubra agora