Capítulo 6

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Eu estava sentada no sofá enquanto ouvia mamãe falar o quão ruim eu era como filha e como machuquei meu pai com as minhas palavras frias e afiadas. Enquanto ela jogava na minha cara que muitas pessoas mereciam ouvir o que sai da minha boca.
  As lágrimas escorriam pelo meu rosto, quando percebi que ela nunca reparou o que acontecia comigo.
Na mesma noite em que ela disse essas coisas, ela disse também que uma das pessoas mais amada por mim, não me queria por perto.

Quando acordei tinha lágrimas em meu rosto novamente. Saio da cama e vou até o banheiro com os olhos derramando lágrimas. Olho meu reflexo no espelho e vejo o quanto estou acabada. Tem círculos pretos embaixo dos meus globos oculares e eles estão com inchaços regulares. Abro a porta do armário e puxo a gaveta para frente e tiro a lâmina de dentro da mesma.
Minha mais nova melhor amiga. Entanto passo o metal afiado em minha pele, vendo o sangue escorrer por meu braço, lembrando de que a dor da lâmina, nem se compara com a dor que sinto por dentro.
Do jeito que estou só coloco o braço embaixo da água e vejo sangue se transformar em um líquido transparente.
Saio do banheiro e me deito na cama. Fecho os olhos e adormeço sem peso na consciência.

Vamos pequena. Está na hora de acordar.
— Não. Apaga a luz Daniel.
— Vamos Emma acorde.
Abro os olhos e tento não me encolher devido a claridade. Olho ao redor procurando por ele mas não o encontro. Ao invés de encontrar um par de esmeraldas, vejo um par de safiras me encarando.
— Bom dia baixinha.
— Liam? O que faz aqui? — Olho as horas e vejo que são oito e meia. — Aconteceu algo?
— Daiane pediu pra mim vim ficar com você. Steve sofreu um acidente de trabalho e ela levou ele ao hospital.
— Ele está bem? — Pergunto esfregando os olhos com as mãos.
— Ela ainda não ligou. Mas agora mudando de assunto, saia dessa cama. Já está passando da hora.
— Liam, são oito horas ainda. Eu quero dormir.
— Nem adianta. Levanta. Tenho que cuidar desses ferimentos.
— Não precisa. — Falo já colocando o travesseiro em cima do meu rosto para tampar a claridade.
— Emma não vou pedir pra levantar de novo. Daiane me deu carta branca pra mim fazer o que eu quiser com você hoje.
— Vá em frente.
Ele sai do quarto e me ajeito confortavelmente na cama.
Estava quase adormecendo novamente quando sinto um jato de água gelada sendo jogado em mim.
— LIAM SEU DESGRAÇADO!
— Eu falei que você ia levantar. Bandeira branca lembra?
Eu saio da cama de cabeça baixa e me aproximo dele. Empurro ele na cama e caminho em direção ao banheiro.
— Troca a merda desses lençóis agora.
Entro no banheiro e jogo as roupas molhadas no chão ao lado da porta. Ligo o chuveiro e fico esperando que a água quente relaxe a tensão e tire a vontade que eu estou tendo de matar o Liam.
Quando saio do banheiro enrola na toalha, Liam já não está no quarto, e os lençóis estão trocados.
Pego uma peça de roupa e me encaminho para o banheiro novamente quando a porta é aberta. Nem me importo com o fato de estar só de toalha, bato a porta do banheiro de novo e escuto a sua risada.
Troco de roupa e seco meu cabelo. Estendo as roupas molhadas no box e saio porta afora.
Liam está sentado no parapeito da janela e tem um prato com um pedaço de bolo e um suco de maracujá em cima da mesa. Sento na cama e pego o bolo. É de chocolate e está muito gostoso. Quando sinto o suco entrar no meu organismo, sinto a pontada da cólica junto. Odeio isso.
— Liam?
— Oi?
— Tem como pegar algum comprimido pra mim na gaveta da cômoda?
— Está sentindo dor?
— Estou começando a sentir cólica. E digamos que uma certa pessoa não ajudou jogando água gelada em mim.
— Desculpe. — Ele diz me estendendo a cartela e dando um sorriso sem graça.
— Só não faça mais isso. Por favor. — Digo rindo depois de tomar o remédio. — Só que depois disso não terei aula hoje também.
— Nem pense nisso mocinha.
— Você procurou isso. Agora agüenta. — Falo puxando a coberta até minha barriga e virando de lado para o encarar.
— Posso me sentar com você?
Olho pra ele na dúvida. A última vez que um cara se sentou na minha cama foi Daniel. Lembrar dele dói. Machuca. E sufoca.
— Pode. Mas antes coloque algum filme. Ele liga a tv e coloca num canal qualquer e se senta do meu lado.
Assistimos o filme em completo silêncio. Sem dizer nada um para o outro. Até ele começar acariciar minhas cicatrizes.
— Por que seu sobrenome é Wolf?
— Eu não sei. — Ele responde depois de alguns minutos. — Porque o seu é Rodrigues?
— Porque é o sobrenome da minha mãe.
Ele para um tempo pra pensar e vira o rosto pra mim.
— Eu acho bobeira. Mas a minha vó me contava às vezes que existiam lobos por aqui. E a avó dela conheceu um homem nativo. Ele dizia ser um homem fera. Que se transformava sempre que pedia o controle.
— Isso tá parecendo conto pra criança se comportar. — Digo me apoiando em seu ombro.
— Sempre pensei isso. Bem, continuando. Eles se envolveram e tiveram descendentes. Como o nativo não tinha sobrenome ela nomeou seus descendentes de Wolf.
— Que doideira.
— Pois é. É o que a minha avó me contava.
— Contava? — Pergunto enquanto faço círculos invisíveis em seu braço.
— Ela se mudou para algum lugar do continente europeu.
— Entendi.
— Emma. Qual foi o motivo que fez você fazer isso? — Ele diz passando a mão nos meus cortes.
— Não quero falar sobre isso.
— Você os tratou no banho?
— Eles se curam sozinhos. Nunca precisei fazer nada.
— Quem é Daniel? — Ele olha para meus olhos dessa vez.
Fico na dúvida se devo contar ou não. Conheço Liam a pouco tempo, e só de pensar na hipótese de contar pra alguém algo que estou tentando esquecer dói.
— É um garoto que amei. E como pode imaginar. Partiu o meu coração de uma das piores formas possíveis.
Ele me encara por um tempo e logo sua expressão muda.
— Ele não fez isso!
— Não Liam. Não foi isso. Eu juro pra você.
Ficamos em silêncios por longos minutos quando ele me encara novamente.
— Tem algo haver com isso?
Por um momento, o pensamento me apavora. Pensar na possibilidade de Frost tomar minha virtude e expor isso me destrói por dentro.
E começo a pensar, na possibilidade de contar ao Liam tudo o que aconteceu.

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