Expresso

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A viagem para King’s Cross estava um saco. Tédio líquido escorria dos meus olhos enquanto bocejava, olhando pela janela do meu compartimento. Crabbe falava alguma baboseira sobre lesmas enquanto Blásio e Goyle se espremiam ao seu lado. Theo estava sentado ao meu lado, fumando seu terceiro cigarro.

Nada contra fumantes, mas chega um momento em que fumar torna-se irritante, eu até chego a dar umas tossidas indiretas. Mas, francamente, é desnecessário fumar em locais fechados; se você quer se matar, não mate as outras pessoas ao seu redor também. E foi exatamente isso que eu falei para Theo, que me olhou indignado, e saiu do nosso compartimento – graças a mim – para se juntar à sua “alma gêmea”, vulgo Susanna Bones.

Blásio aproveitou a oportunidade para se sentar ao meu lado. Crabbe e Goyle se ajeitaram em seus bancos, ainda conversando sobre lesmas, quando Pansy Parkinson entrou em nossa cabine. Ela estava com o cabelo preso, e com o uniforme da escola. Impressão minha ou a saia dela estava encurtada? Ela se sentou no colo de Blásio e me lançou um olhar ameaçador. Deduzi que era porque eu estava passando muito tempo ao lado de Hermione, ao invés de passar com ela. Foi apenas “coincidência” o fato de que ela começou a namorar o Blásio um dia depois que eu me encontrei com Hermione no dia dos Namorados em Hogsmeade.

A chegada dela ali me fez querer pular do trem. Mas, como não sou suicida suficiente, apenas saí do compartimento, deixando os pombinhos com a companhia de Crabbe e Goyle e suas conversas sobre lesmas. Embora eu tivesse prometido a Hermione que a deixaria passar a viagem de trem com os seus “amiginhos” Weasley e Potter, eu resolvi procurá-la.

Parei no meio do corredor, tentando adivinhar em qual compartimento Hermione poderia estar. Resolvi procurar desde o começo do meu vagão, que, por coincidência, era o quinto vagão. Passei por cada compartimento, olhando através dos espelhos, procurando pela cabeleira castanha de Hermione e seu sorriso sincero.

Atravessei dois vagões inteiros sem sucesso: Hermione não estava em nenhum lugar à vista. Mas, pelo tédio que eu estava sentindo, continuei procurando, procurando, procurando, procurando. Pelo reflexo das janelas das portas dos compartimentos, consegui ver meu estado físico: havia olheiras abaixo dos meus olhos e meu cabelo estava ligeiramente atrapalhado.

Arrumei-o para trás, e ouvi um conjunto de risadinhas. Estreitei meus olhos através da janela da porta e vi quartanistas. Ah, a idade da puberdade e dos hormônios. Essas garotas podem passar na frente de um homem velho, barbudo, gordo e fedido e ainda corar e soltar risadinhas, todas se eriçando à toa. Mesmo assim, elas são garotas, e eu sou Draco Malfoy.

Lancei meu meio sorriso a elas, que soltaram gritinhos e pularam em seus assentos. Apenas revirei os olhos e continuei minha caminhada inútil e provavelmente desnecessária. Tive a infelicidade de passar pela cabine em que Theo Nott agarrava Susanna Bones.

Era uma cena traumática, com direito a gemidos sombrios, que poderiam pertencer a fantasmas misteriosos. Mas, serei sincero: não era. Esses barulhos assustadores na verdade pertenciam a Theo e Susanna, e a parte visual também não estava encantadora. Apenas fingi que não vi, e segui em frente. Continuei minha busca, que mais parecia uma desculpa esfarrapada para me afastar dos meus amigos sonserinos. Passei por outros dois vagões, no entanto, sem encontrar a sabe tudo.

Olhei no meu relógio quando alcancei o último vagão, e nele constava que eram quatro horas. Resolvi voltar para comprar alguns doces da velhinha que passa com as guloseimas em cada compartimento. Separei alguns sicles para lhe entregar, já pensando em qual doce escolher. Só de me lembrar das açucaradas varinhas de alcaçuz, e do famoso sapo de chocolate, eu tinha arrepios.

Voltei correndo para o meu compartimento com Crabbe, Goyle, Blásio e Pansy, e esperei pela velhinha. Quando ela chegou, galeões e sicles e nuques voaram das bolsas de todos os presentes. Ao final das compras, nosso compartimento estava nadando em doces e chocolates. Por duas horas, o único barulho que se ouvia era o nosso mastigar sincronizado e o som de embalagens sendo rasgadas, abertas ou jogadas ao longe.

Quase tinha me esquecido de Hermione, só que não. Resolvi procurá-la novamente, dessa vez eu tentei encontrar a garota pelos vagões do outro lado. Nenhum sinal de Hermione. Passei pelo compartimento que estava ocupado por Longbottom e Luna Lovegood, que encaravam a janela embaçada do trem, rindo à toa. Ao virar meu rosto, avistei outro casal dando um amasso em outra cabine. Eu conseguia ver apenas o rosto angelical de Cordelia Baker, mexendo os lábios – provavelmente gemendo que nem os fantasmas do casal anterior – e os cachos dourados do rapaz que mordia seu pescoço.

Era Zacarias Smith. Nunca imaginei que os dois estivessem juntos. Quero dizer, Delia tinha um lema: "nunca sozinha e sempre solteira", que, obviamente não se aplicava a mim, mas, enfim. De qualquer forma, aquilo era a visão dos infernos, resolvi seguir em frente e continuar minha procura por Hermione.

E, olha que magia de Merlin! De repente, o trem começou a frear, e a monitora daquele vagão pediu que eu voltasse para o meu compartimento “para uma descida segura”. Entrei em qualquer compartimento - ao lado do compartimento de Longbottom -, e fechei a porta atrás de mim.

De repente, percebi os olhares que me encaravam. Um grupo de quintanistas conhecidos por serem, como os trouxas dizem, emo. Três garotos com delineador preto nos olhos e cabelos raspados de maneiras bizarras me encararam com cara de brócolis. Uma garota, com uma coleira heavy metal no pescoço, mostrou a língua cheia de piercings para mim e fez uma cara de quem não me queria ali. Sentindo que em um futuro próximo eu poderia ser vítima de canibalismo, saí daquela cabine satânica o mais rápido possível, e sem olhar para trás, entrei no compartimento oposto.

Suspirei aliviado, quando, subitamente, ouvi um pigarrear irritado. Virei-me para a origem daquele som inusitado e vi o cabeça de cenoura me fitando com os braços cruzados.

– Com licença! – ele falou, olhando para a porta, e depois para mim.

– Deixe de ser infantil, Ron! – Hermione interveio, olhando para mim com ar de reprovação. – O que você está fazendo aqui, Draco? – ela perguntou em seguida. Eu apoiei meu quadril no batente da porta, sorrindo presunçoso.

– Por quê? Entrei na hora errada? Era algum caso de família? – eu perguntei, rindo mentalmente. Percebi o olhar sanguinário de Potter me fuzilando, mas escolhi ignorá-lo.

– Já vamos descer, por favor, Draco. Por que não fez o que combinamos? – a voz de Hermione soava realmente chateada, comecei a pensar no porquê da garota estar tão magoada com o meu simples e gentil ato de querer encontrá-la.

– Oh, vou ali me sentar no cantinho da disciplina... – eu cantarolei, com falsete. Potter se levantou de um salto e cerrou os punhos para mim, que recuei para a porta, sem conseguir conter o riso. Ele começou a me ameaçar e a salivar em mim, o que dificultou a minha compreensão das palavras que ele gritava. Nesse ponto, Hermione se levantara também, e estava tentando empurrar o garoto da cicatriz para longe de mim.

Ela estava perto o suficiente para eu sentir seu aroma de chocolate, e ver as pequenas sardas do seu rosto moreno. Quando ela se virou para me lançar um olhar frustrado, eu pisquei os olhos e desviei o olhar.

– CALA A PORCARIA DA BOCA, MALFOY! E, HARRY, PELO AMOR DE DEUS, SENTE-SE E FECHE A MATRACA! – Hermione berrou, exatamente na hora em que o trem parou abruptamente, e os sinos tocaram. De repente, a garota me abraçou. Não sei por que, mas meu coração saltou do peito. Talvez tenha sido por causa do trem, ou porque o que ela fez foi muito imprevisível, mas eu gostei.

Ela se virou para Ron, ainda me abraçando, e sussurrou:

– Eu não me importo. Eu quero ir, e você não vai me impedir, Ron. – Harry desviou o olhar, desconcertado, levantando-se para sair, e eu dei o sorriso mais largo que consegui. Ela iria para Wiltshire comigo.

A Maldição Dos MalfoyOnde histórias criam vida. Descubra agora